A nuvem de fumo proveniente dos incêndios florestais no Canadá chegou a Portugal continental nesta terça-feira, “mas deve dissipar-se até à manhã de quinta-feira”, afirma o meteorologista Diamantino Henriques, do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA). Os gases poluentes emitidos pelo fogo a 5000 quilómetros são transportados e dispersos pelos ventos, cruzando o Oceano Atlântico e afectando a visibilidade do brilho do sol. O céu fica menos limpo devido ao fumo.
Diamantino Henriques alerta que a região Sul, em Portugal continental, pode ser a mais afectada por esta nuvem de fumo. Trata-se de um fenómeno pouco comum, mas que se pode repetir futuramente enquanto os incêndios persistirem no Canadá, que regista já um número recorde de área ardida.
O arquipélago dos Açores foi a primeira região portuguesa a ser atingida pela nuvem após ter ocorrido uma circulação ciclónica, associada a uma depressão centrada a noroeste dos Açores, promovendo o transporte a larga escala dos gases ao longo do Atlântico Norte, segundo o IPMA.
Nas últimas semanas, gases poluentes, como o dióxido de carbono, o monóxido de carbono e os óxidos de azoto, têm sido libertados na atmosfera, no Canadá, e transportados pelo vento para outras regiões. No entanto, por não excederem os limites estabelecidos legalmente (2,5 micrómetros), a chegada da nuvem não representa uma ameaça para a saúde. Contudo, a população mais sensível às doenças respiratórias pode adoptar medidas para evitar a inalação desses compostos, como manter as portas e janelas fechadas, e utilizar uma máscara N95 quando não puder evitar a exposição a essas partículas.
O programa Copérnico, responsável pela monitorização da qualidade do ar, tinha já avisado para a chegada prevista do fumo à Europa através de uma publicação no Twitter.
“Nas últimas semanas, o Canadá tem sido assolado por incêndios que estão a afectar a qualidade do ar em várias cidades. A previsão do Copérnico para os próximos dias mostra nuvens a mover-se do Quebeque para a Europa através do Atlântico Norte”, alertam num tweet.
Esta é a pior época de incêndios no Canadá. Além do recorde de área ardida (arderam mais de 76 mil quilómetros quadrados), os incêndios florestais no Canadá libertaram na atmosfera cerca de 160 milhões de toneladas de carbono, o registo mais elevado desde que começou a monitorização por satélite, em 2003. Estes dados foram revelados pelo programa Copérnico.
O dióxido de carbono emitido até agora pelos incêndios do Canadá é equivalente às emissões anuais resultantes da queima de combustíveis fósseis na Indonésia, compara a Reuters. O cenário é ainda mais grave do ponto de vista climático porque as florestas agem como sumidouros de dióxido de carbono, absorvendo-o. Ao arderem, voltam a libertá-lo para a atmosfera.
As regiões mais afectadas pelo fogo incluem a Colúmbia Britânica, Alberta, Saskatchewan, Ontário e Quebeque. A chegada do fumo a grandes cidades mais próximas, como Toronto e Nova Iorque, também está a gerar preocupação quanto ao aumento de problemas de saúde (incluindo doenças respiratórias). Os incêndios continuam “sem fim à vista”, comentou o cientista do Copérnico Mark Parrington.
Temperaturas podem chegar aos 42ºC
Relativamente ao clima nos próximos dias em Portugal continental, o meteorologista Alessandro Marraccini, do IPMA, destaca que a presença da nuvem pode ter influência nas previsões meteorológicas. “Em princípio, Portugal deveria atingir uma onda de calor esta quarta-feira. No entanto, pode não acontecer, devido à presença dos fumos na região. O céu não está limpo e a radiação solar terá dificuldade em atingir o solo nas horas principais do dia”, relata Marraccini.
Os concelhos localizados na região do Algarve estão em risco máximo de incêndio nesta terça-feira e o nível de risco manter-se-á assim nos próximos dias. Nas regiões Norte e Centro, a maioria do território tem risco de incêndio moderado a elevado. Alessandro Marraccini acrescenta que “os ventos fortes esperados” a partir da quinta-feira, 29 de Junho, agravam o risco de incêndio e da sua propagação em todo o país.
De acordo com o IPMA, espera-se que as temperaturas continuem altas por todo o território, com excepção do litoral Norte e Centro, para onde se prevê temperaturas máximas que rondam os 30 graus Celsius, ainda que seja “pouco provável que se atinjam devido à presença de fumos na atmosfera”, reforça Alessandro Marraccini. Na quarta-feira, segundo o site do IPMA, as temperaturas máximas podem chegar aos 42 graus Celsius em Évora e aos 40 graus Celsius em Beja, prevendo-se 38ºC para Setúbal, Santarém, Castelo Branco e Portalegre.
A costa Sul da ilha da Madeira está sob aviso vermelho até às 20h desta terça-feira devido à “persistência de valores muito elevados de temperatura máxima”. A partir de quinta-feira, está prevista uma queda nas temperaturas de cinco a oito graus em todo o país.
Além disso, o IPMA também alerta para a exposição à radiação ultravioleta (UV), classificando a ilha da Madeira como estando em risco extremo e os restantes distritos como estando em risco muito elevado. O IPMA recomenda medidas de protecção, como evitar a exposição ao sol nas regiões de risco extremo, e o uso de óculos de sol, chapéu, protector solar e roupas adequadas nas regiões de risco muito elevado.
Texto editado por Claudia Carvalho Silva
Artigo actualizado às 16h26 de 27 de Junho de 2023: foram adicionadas informações sobre a área ardida e emissões dos incêndios no Canadá.