Cidades nos EUA afundam-se e o nível do mar sobe. Veja as áreas mais afectadas
Diversas cidades estão a afundar-se rapidamente nos EUA, aumentando o risco de inundações. Nova Iorque, Houston e Nova Orleães são das mais afectadas. A captação de água subterrânea é uma das causas.
Imagine que a superfície da Terra é como uma pilha de panquecas. As panquecas, ou camadas de solo e rochas, podem parecer fofas e empilhadas uniformemente. No entanto, com o tempo, a pilha pode ficar comprimida, mais fina e mais curta.
Os cientistas observam este movimento descendente da Terra, chamado subsidência, em todo o planeta. Enquanto algumas regiões do nosso planeta sofrem uma elevação, muitas partes da sua superfície afundam-se rapidamente. Os investigadores preocupam-se especialmente com os locais de afundamento perto da costa, que correm um maior risco de inundações à medida que o nível do mar sobe num mundo em aquecimento. Os furacões e os fenómenos extremos de precipitação também podem causar mais danos às zonas de baixa altitude.
Mas não é simples compreender este movimento de deslizamento de terras, admitem os cientistas. Na mesma cidade, algumas regiões podem estar a afundar-se a um ritmo mais rápido do que outras. “Se olharmos para os dados, não vemos um fenómeno uniforme. Vemos, geralmente, regiões de pontos quentes onde se podem ver partes de cidades a afundar, dependendo do que está a acontecer”, disse o cientista da NASA David Bekaert, que analisa o afundamento de terras nos Estados Unidos e em todo o mundo.
Segundo Bekaert, alguns afundamentos de terra estão relacionados com processos naturais profundos durante longos períodos, como a resposta à actividade das placas tectónicas ou o recuo dos glaciares da última Idade do Gelo. Outros afundamentos estão ligados à actividade humana, incluindo a extracção de petróleo, água ou minerais do subsolo. Nas cidades, os edifícios podem também aumentar o peso e empurrar a terra para baixo.
Muitos dos locais que afundam mais rapidamente no mundo encontram-se em áreas povoadas do Sudeste asiático, na maioria devido à extracção de águas subterrâneas, mas os Estados Unidos também enfrentam um afundamento substancial da terra. É possível que, no seu dia-a-dia, não se note o assentamento de terras à sua volta, mas os cientistas descobriram que muitos locais estão a afundar-se mais rapidamente do que o aumento do nível global do mar, aumentando o risco de inundações nas cidades costeiras. O nível do mar sobe a uma taxa média global de cerca de 3,4 milímetros por ano.
As regiões com maior afundamento de terras nos Estados Unidos localizam-se principalmente ao longo da Costa Leste e do golfo, mas aqui seleccionámos alguns pontos mais graves em todo o país.
Costa do golfo: Houston
A costa ocidental do golfo do México regista algumas das taxas de subsidência mais rápidas dos Estados Unidos.
Analisando as taxas de subsidência de terras em grandes cidades costeiras, Bekaert e os seus colegas descobriram que Houston tem o pico mais rápido — cerca de 17 milímetros por ano de 2014 a 2020 — nos Estados Unidos. Outros estudos revelaram que desde 1917, determinadas zonas de Houston perderam mais de três metros de altitude.
Este afundamento do solo pode agravar os danos durante fenómenos meteorológicos extremos. Os investigadores descobriram que a maioria das zonas inundadas durante o furacão Harvey, em 2017, apresentava taxas de subsidência relativamente elevadas.
O afundamento de terras na área de Houston-Galveston é causado, sobretudo, por captações de água subterrânea. De acordo com o Serviço Geológico dos EUA, a remoção de água de sedimentos e argilas de grão fino no subsolo comprime o aquífero e diminui a superfície da terra. Algumas regiões registam taxas elevadas de subsidência da terra devido à retirada das reservas locais de petróleo e gás natural.
Costa do golfo: Nova Orleães
Partes de Nova Orleães também registam elevadas taxas de afundamento, devido aos processos tanto naturais como induzidos pelo homem. A investigação mostrou que as taxas são muito variáveis em toda a cidade, oscilando entre 150 e 500 milímetros nos últimos 20 anos.
Dados anteriores, de 2009 a 2012, mostraram as taxas de subsidência mais elevadas ao longo do rio Mississípi, perto de áreas industriais em Norco e Michoud — registando até 50 milímetros de afundamento por ano. A leste de Norco, o Vertedouro [uma estrutura hidráulica] de Bonnet Carré, destinado a reduzir o risco de inundações em Nova Orleães, registou um afundamento de até 4,06 centímetros por ano atrás da estrutura.
A agência espacial norte-americana (NASA) apontou o bombeamento de águas subterrâneas como o principal factor de afundamento. Além disso, a subsidência subterrânea mais profunda é também causada pelo deslocamento de falhas, conforme exposto pela cidade de Nova Orleães.
Embora Houston e Nova Orleães sejam locais notáveis de afundamento, outros locais no golfo do México também registam taxas elevadas. Numa grande área a norte da baía de Tampa, as taxas de subsidência marcam uma subida de até 6 milímetros por ano devido ao bombeamento de águas subterrâneas — cerca do dobro da subida global do nível do mar entre 2015 e 2020. A área da baía de Tampa é também relativamente plana, o que significa que a subida do nível do mar pode sobrecarregar grandes extensões da área de baixa altitude.
Costa Leste: Cidade de Nova Iorque
Com mais de 8 milhões de pessoas, a cidade de Nova Iorque é a mais populosa dos Estados Unidos e está também a afundar-se, em média, de 1 a 2 milímetros por ano. Os habitantes dessas cidades podem assistir a uma maior subida do nível do mar — taxas até quatro vezes mais rápidas — do que a observada em regiões mais estáveis.
“Se agora a água está a subir e a terra a descer, as casas serão inundadas”, disse Matt Wei, geofísico da Universidade de Rhode Island. “É esse o problema.”
Wei declarou que grande parte da subsidência da terra da cidade é uma resposta ao recuo glacial após a Idade do Gelo; os lençóis de gelo pesaram muito sobre a terra e fizeram com que a crosta sob locais como o Canadá e o Nordeste dos Estados Unidos se esticasse e cedesse.
As áreas periféricas dessas zonas em decadência, no entanto, como em torno de Nova Iorque e da baía de Chesapeake, apresentaram uma elevação. Quando as camadas de gelo começaram a recuar, há cerca de 12.000 anos, essas áreas voltaram a subir novamente, enquanto as áreas abauladas assentam de novo.
Para facilitar a compreensão desse fenómeno, Wei compara-o a um balão. Se empurrarmos o balão para baixo, as suas partes próximas da nossa mão descem e as mais afastadas sobem. Quando se retira a mão, o balão tenta voltar à sua forma original, fazendo com que algumas secções subam e outras desçam. Segundo Wei, o mesmo processo ocorre na Terra, mas “numa escala muito maior e a uma velocidade muito mais lenta”.
Wei afirma que, na maior parte, o afundamento do solo na cidade de Nova Iorque é consistente com o que os investigadores previram sobre este ressalto glacial. No entanto, algumas áreas da cidade apresentaram taxas de subsidência superiores ao esperado.
Num novo estudo, Wei e outros cientistas descobriram que o peso dos edifícios em redor da cidade de Nova Iorque está a empurrar efectivamente o solo para baixo em algumas áreas, contribuindo ainda mais para o seu afundamento. Embora a taxa média na cidade seja de 1 a 2 milímetros por ano, algumas zonas experimentam cerca de 4,5 milímetros por ano.
“A cidade de Nova Iorque está a afundar-se não pelo peso dos edifícios, mas principalmente devido ao ressalto glacial”, sublinha Wei. “Mas há sítios que sugerem que o peso dos edifícios pode ter contribuído para a taxa acelerada.”
Costa Leste: Norfolk
Norfolk tem a taxa mais elevada de subida do nível do mar na Costa Leste. O afundamento do solo desempenha um papel significativo. A área de Hampton Roads, na Virgínia, afunda-se duas vezes mais depressa do que a subida das águas. Num estudo de 2020, David Bekaert e os seus colegas descobriram que Norfolk e Virginia Beach afundam-se mais de 3,5 milímetros por ano, com algumas secções a afundarem-se mais devagar ou mais depressa.
Assim como a cidade de Nova Iorque, partes do Médio Atlântico são afectadas pelo ressalto glaciar. Norfolk também sofre subsidência devido a um meteorito que deixou um buraco há milhões de anos. A terra mais solta entrou na cratera e, desde então, compactou-se e deslocou-se para baixo, provocando o afundamento do solo à volta da cratera.
As captações de água subterrânea também estão a agravar as taxas localmente. Bekaert disse que, historicamente, as fábricas de papel em Norfolk realizavam muito bombeamento, mas as operações cessaram com as novas regulamentações. A cidade experimenta um novo projecto que irá repor a água no aquífero e inverter o bombeamento a longo prazo.
Norfolk pode destacar-se na costa Leste, mas muitas áreas ao longo da costa também combatem as elevadas taxas de subsidência e de subida do nível do mar. A baía de Chesapeake tem uma elevação do nível do mar de cerca de 4,6 milímetros por ano, agravada pela subsidência da terra.
Costa ocidental: Vale Central da Califórnia
O afundamento ao longo da costa ocidental é comparativamente pequeno em relação à costa oriental, mas isso não significa que o afundamento de terras não seja um problema.
No Noroeste do Pacífico, David Bekaert relatou que o principal factor de mudança a uma escala mais ampla é a actividade das placas tectónicas, em que uma placa está em subducção ou a passar por baixo de outra placa. O investigador acrescenta que pode haver elevação ou subsidência gradual, dependendo da sua localização.
À medida que se avança na costa, as placas começam a mover-se umas ao lado das outras, o que não proporciona muito movimento vertical. Em vez disso, são os processos induzidos pelo homem que assumem o controlo.
Em geral, os dados ao longo da costa ocidental mostram que as taxas são, na sua maioria, inferiores a 3 milímetros por ano, excepto perto de áreas como San Diego, que sofreu grandes quantidades de afundamento induzido pelo homem.
Mais para o interior, no vale central da Califórnia, o bombeamento excessivo de águas subterrâneas para a agricultura provocou um afundamento significativo da terra. Desde a década de 1920, secções do vale de San Joaquin afundaram até 8,5 metros.
O bombeamento de águas subterrâneas torna-se ainda mais problemático durante as secas, agravando os problemas de subsidência. Os dados de 2015 mostraram que alguns pontos diminuíram a taxas tão elevadas como 600 milímetros por ano.
“Pode haver pontos críticos nas cidades, onde são observadas taxas de subsidência distintas”, disse Bekaert. “Porém, numa grande parte dos casos, estão relacionados com o impacto humano local que está a ocorrer.”