Como tornar as nossas férias mais verdes

Dicas para fazer viagens amigas do ambiente, desde a escolha do destino e alojamento até à escolha dos meios de locomoção.

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Miradouro de Porto D'Olho, em Abadim (Cabeceiras de Basto) Anna Costa

A pandemia, apesar de sombria em muitos aspectos, teve, na sua fase inicial, um aspecto positivo. A interrupção das viagens permitiu que o planeta descansasse após um ano agitado (2019), em que cerca de 1500 milhões de pessoas voaram em redor do globo. Antes do encerramento das fronteiras, muitas cidades estavam a acusar o peso do turismo excessivo. Vários destinos apetecíveis, como Barcelona e Veneza, estavam a considerar acções para combater o ataque ambiental e cultural.

Até que tudo fechou. Por outro lado, a natureza floresceu.

“A pandemia foi um alerta”, refere Gregory Miller, director executivo do Centro para o Turismo Responsável, uma organização sem fins lucrativos com sede em Washington, nos Estados Unidos. “Não estamos a dizer às pessoas para não viajarem, mas para serem viajantes responsáveis. Adoptem uma abordagem holística para viagens sustentáveis, ​​que tenha em consideração os elementos naturais, culturais e espirituais de um lugar.”

Há várias ferramentas que podem ajudar as pessoas a planear férias sustentáveis. Algumas dessas ferramentas foram, inclusivamente, lançadas durante a pandemia. Por exemplo, em Outubro do ano passado, o serviço Google Voos adicionou às suas pesquisas estimativas de emissões de dióxido de carbono (CO2), bem como recomendações para rotas menos poluídas. Em Novembro, o site Booking.com lançou o programa Viagens Sustentáveis, filtro de pesquisas ​​que destaca hospedagens amigas do ambiente. No mesmo mês, a operadora de turismo Wilderness Scotland e as suas filiais em Inglaterra e na Irlanda introduziram um programa de rotulagem de CO2 que exibe um número aproximado de emissões de gases com efeito de estufa (GEE) ao lado de cada passeio de aventura (o equivalente às calorias publicadas num menu).

À medida que o mundo reabre cautelosamente, eis algumas dicas para planear uma viagem verde que receberia a aprovação do planeta.

Na hora de escolher o destino

Ao escolher um local de férias, comece com o Índice de Desempenho Ambiental, que foi desenvolvido por duas universidades norte-americanas — a Universidade Yale e a Universidade Columbia. Esse índice classifica 180 países consoante a sua sustentabilidade ecológica. Este ano, a Dinamarca ocupou o primeiro lugar, à frente de Reino Unido, Finlândia, Malta e Suécia. [Portugal ficou no 48.º posto.] Os investigadores associados à criação do índice assinalam que vários países estão no bom caminho para alcançar a neutralidade carbónica até 2050. No entanto, nações como a China (160.º lugar no ranking) e a Índia (180.ª e última posição) estão a movimentar-se na direcção oposta.

Anna Spenceley, autora e especialista em turismo sustentável, recomenda lugares que tenham sido certificados por organizações credenciadas pelo Conselho Global de Turismo Sustentável, organismo acreditador que reconhece programas de turismo sustentável. Anna ​Spenceley diz também que os viajantes devem procurar destinos que apoiem acordos ambientais globais, como por exemplo a Declaração de Glasgow para a Acção Climática no Turismo, que possui quase 540 signatários.

Larry Yu, professor de gestão hoteleira na Faculdade de Economia da Universidade George Washington, nos Estados Unidos, menciona vários países interessantes do ponto de vista ambiental. Fala dos Países Baixos (onde as pessoas locais “andam muito de bicicleta”), do Butão (onde “mais de metade da terra é coberta por floresta”), do Palau (onde os visitantes devem assinar um compromisso ecológico), do Uruguai (cuja electricidade vem sobretudo de fontes renováveis), do Camboja e da Costa Rica.

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Agricultores trabalham na cidade costa-riquenha de Cartago Jeffrey Arguedas

É importante saber quando esquecer um destino turístico devido a sensibilidades culturais, vulnerabilidade em termos de recursos ou turismo excessivo. Jared Sternberg, fundador da operadora de turismo Gondwana Ecotours, descartou um itinerário para ver os ursos polares na cidade de Kaktovik por causa da pressão que a sua viagem involuntariamente exerceria sobre a pequena comunidade do Alasca. Sternberg diz também que os moradores dessa região têm sentimentos fortes em relação ao turismo.

Jared Sternberg também evita as ilhas Galápagos, no Equador, e a península de Iucatão, no México. Esta península, onde foi batido um recorde em 2019 (foram recebidos, nesse ano, 3,2 milhões de visitantes; nunca o número de turistas fora tão elevado), está a precisar que lhe dêem um descanso, considera o fundador da Gondwana Ecotours.

Finalmente, lembre-se de que as férias são um estado de espírito, não um concurso para ver quem é que consegue percorrer mais quilómetros. A pandemia ensinou-nos que não precisamos de viajar muito para fugir mentalmente. “Procure opções que estejam um pouco mais perto de casa”, diz Bradley Cox, director de comunicação da Green Globe, empresa que avalia o desempenho, em termos de sustentabilidade, de empresas de viagens e turismo. “As empresas locais podem precisar do seu patrocínio. E escolher o mercado doméstico também ajuda a reduzir a pegada ambiental.”

Na hora de escolher o alojamento

Não precisa de se distanciar da civilização para fazer férias “verdes”. Há centenas de opções de alojamento que são sustentáveis e elegantes, ou no mínimo confortáveis e ligadas a pontos de interesse. As empresas/plataformas Green Pearls, Kind Traveler, Wayaj e Eco Hotels & Resorts, especializadas em estadias ecológicas em todo o mundo, têm, nos seus respectivos sites, portefólios com um leque extenso de hotéis e locais de repouso.

Sempre que possível, escolha aposentos menores e geridos de forma independente. Estes, por norma, geram menos resíduos (e criam laços mais profundos com a comunidade). Um exemplo: o Lapa Rios Lodge, na Costa Rica. Trata-se de um complexo de 17 bangalôs e vilas de luxo, numa floresta tropical protegida na península de Osa, no Sudoeste da Costa Rica.

“Para mim, seria uma honra trazer pessoas até cá”, diz Jared Sternberg sobre a pousada ecológica que descobriu numa viagem à Costa Rica. “Todos os prédios são construídos por moradores locais. [Os prédios] são alimentados por energia solar e hidroeléctrica e têm à sua disposição um biodigestor para produzir gás. Os porcos comem todas as sobras — e o mínimo de lixo que é gerado acaba sempre por ser reciclado ou compostado. É um luxo para a pessoa certa.”

A maioria das grandes empresas hoteleiras desenvolveu em anos recentes programas sustentáveis, como o Travel with Purpose, da rede de hotéis Hilton, o Green Engage, da IHG Hotels & Resorts, e o Serve360, da Marriott International. Os grandes hotéis estão ainda a eliminar gradualmente o plástico de uso único.

“Os hotéis, proprietários, funcionários e hóspedes dos Estados Unidos estão a trabalhar para reduzir as emissões de CO2, diminuir o uso de energia, poupar água e minimizar o desperdício através de experiências inovadoras e sustentáveis”, diz Chip Rogers, presidente da Associação Americana de Hotéis e Hospedagem. “Embora os hotéis dos Estados Unidos tenham feito avanços significativos para serem mais sustentáveis, também reconhecemos que ainda há mais a fazer”, acrescenta.

O facto de um hotel dizer que é ecológico não quer dizer que efectivamente o seja. O greenwashing é um subproduto infeliz do movimento sustentável. Para maior segurança, procure propriedades que tenham recebido um selo de aprovação de uma organização ambiental respeitável, como o Conselho Global de Turismo Sustentável, o grupo internacional de consultoria EarthCheck, a Green Globe ou o Conselho de Construção Verde dos Estados Unidos (USGBC, na sigla inglesa), que gere o programa de certificação Liderança em Energia e Design Ambiental.

“A verificação independente de terceiros é a única maneira de garantir que uma empresa está a aderir aos critérios internacionalmente aceites para o turismo sustentável”, diz Bradley Cox, da Green Globe, que conta com mais de 500 membros em mais de 80 países. O USGBC certificou mais de 800 hotéis em todo o mundo, como por exemplo, o Bucuti & Tara Beach Resort, o primeiro hotel neutro em carbono das Caraíbas.

Na hora de escolher o(s) meio(s) de transporte

As companhias aéreas estão a tentar ser mais “verdes”. Em Outubro do ano passado, membros da Associação Internacional de Viagens Aéreas​, que inclui quase 300 companhias aéreas em cerca de 120 países, anunciaram a intenção de tentar atingir a neutralidade carbónica até 2050. A JetBlue, a primeira companhia aérea dos Estados Unidos a compensar voluntariamente as emissões de CO2 em todos os voos domésticos, quer tornar-se neutra até 2040.

“As companhias aéreas estão a trabalhar arduamente para mudar”, diz Larry Yu. “Mas elas precisam de encontrar uma maneira de aumentar a produção de biocombustível.”

Os passageiros podem fazer a sua parte ao tomar decisões conscientes antes e durante os voos. Por exemplo, os aviões consomem combustível durante a descolagem e a aterragem, pelo que tente reservar um voo sem escalas. Apoie as companhias aéreas que estão a abandonar o plástico de uso único, como a Air France e a Alaska Airlines, que servem água em caixas de cartão, feitas sobretudo a partir de materiais renováveis. Reduza, também, o tempo que passa a voar, permanecendo num local por um período de tempo mais longo. “Voar menos não tem de querer dizer ter férias mais curtas”, afirma Paul Easto, fundador da Wilderness Scotland.

Considere, se tiver tempo para isso, o comboio, que, apesar de ser mais lento do que o avião, é também mais amigo do ambiente. A rede transeuropeia de transportes está a trabalhar para reduzir os tempos de viagem entre as cidades da União Europeia, sendo que pretende electrificar todo o sistema ferroviário até 2030. As viagens nocturnas de comboio estão ainda a atravessar uma reforma chique: o comboio Midnight, um “hotel nos caminhos-de-ferro” com cabines privadas e um restaurante, deverá começar a circular em 2024, em Paris.

Os navios de cruzeiro são frequentemente descritos como sendo desastres ambientais. A Federação Amigos da Terra, rede internacional de organizações ambientais em 75 países, não poupa nas palavras. Diz que os cruzeiros “despejam lixo tóxico nas nossas águas, enchem o planeta de CO2 e matam a vida marinha”.

As linhas de cruzeiro estão a tentar voltar-se para a descarbonização. A Associação Internacional de Cruzeiros diz querer expandir o número de navios movidos a gás natural liquefeito, um combustível alternativo mais limpo.

Ao escolher um cruzeiro, leia os compromissos da empresa relativamente à sustentabilidade. A empresa Virgin Voyages eliminou o tradicional buffet para reduzir o desperdício alimentar. Também baniu o plástico de uso único desnecessário, como pacotes de condimentos (como açúcar) e copos para viagem. E apostou em projectos de eficiência energética, tendo instalado janelas escurecidas e iluminação LED, por exemplo.​

Para diminuir efeitos nocivos, procure embarcações menores, afiliadas a defensores do ambiente, como a organização não-governamental World Wildlife Fund ou a National Geographic. Além disso, evite roteiros que passam por portos cheios de cruzeiros, como o porto de Veneza, localidade que recentemente aprovou uma lei que proíbe a entrada de grandes embarcações no seu centro histórico. Para controlar as multidões, a cidade italiana começará, a partir de Janeiro do próximo ano, a exigir que os visitantes façam uma reserva e paguem uma taxa de entrada.

Para viagens rodoviárias, alugue um carro com boa quilometragem ou, então, opte por um veículo eléctrico ou híbrido. O Turo, um site peer-to-peer de partilha de carros, dispõe de vários veículos eléctricos. As agências de aluguer de carros europeias também têm grandes stocks de modelos plug-in. Os carros são mais eficientes nas auto-estradas do que no trânsito local, pelo que, quando estiver estabelecido no seu destino urbano, considere estacionar o veículo ou devolvê-lo.

É claro que o transporte movido a energia humana — caminhar, andar de bicicleta, remar — é a forma mais ecológica de viajar. Aproveite os programas de partilha de bicicletas ou empréstimo de bicicletas em hotéis. Para cobrir distâncias maiores, escolha uma bicicleta eléctrica ou scooter.

Na hora de escolher actividades

Para excursões, o tipo de passeio escolhido é tão crítico como o meio de transporte.

A maioria das cidades tem passeios a pé guiados por moradores locais. A International Greeter Association junta residentes a turistas tanto em destinos turísticos populares (Berlim, Montreal) como em locais menos óbvios (Iringa, na Tanzânia, ou Nis, na Sérvia). Após um breve hiato, o Airbnb Experiences também está de volta. Os visitantes podem inscrever-se para excursões pessoais, como uma aula para fazer massa (dada por uma família de Roma) ou um roteiro por obras de graffiti em Medellín, na Colômbia (que inclui uma passagem pela casa da avó do guia, para comer gelado de manga).

Para ideias adicionais de passeios verdes e empresas de turismo, consulte-se junto do gabinete de turismo da cidade, estado ou país a visitar, que geralmente possui materiais dedicados ao ecoturismo. O movimento locavore tornou-se global, com mais restaurantes a basearem os seus cardápios nas colheitas de fazendas próximas. Em 2020, o Guia Michelin lançou o Michelin Green Star. Cerca de 375 restaurantes nos Estados Unidos e na Europa ganharam o eco-elogio. O universo das estrelas da culinária sustentável está em expansão.

Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post