A flor solitária, a trepadeira doce e a palmeira “fantasmagórica” descobertas em 2024
Este ano, os investigadores do jardim botânico Kew Gardens, em Londres, descobriam 172 novas plantas e fungos em colaboração com colegas internacionais. Eis as espécies mais curiosas.
A multiplicidade de seres vivos na Terra é tanta que, ainda que os cientistas trabalhem arduamente em expedições e a descrever novas espécies, persiste uma grande fatia de biodiversidade por descobrir. Este ano, os investigadores do jardim botânico Kew Gardens, em Londres, descobriam 172 novas plantas e fungos em colaboração com colegas internacionais. Desse total, há dez espécies que a instituição britânica destaca numa lista divulgada esta quinta-feira.
O primeiro lugar foi para uma “palmeira fantasmagórica”, uma espécie utilizada há muito na ilha de Bornéu (Malásia e Indonésia) para o fabrico de cestas, mas que, até 2024, ainda não tinha sido “baptizada” com um nome científico. O problema foi resolvido: a planta já foi descrita e chama-se Plectocomiopsis hantu. A lista inclui ainda família “enigmática” de plantas sem capacidade de fotossíntese e trepadeiras que cheiram ao maçapão.
“O mero privilégio de descrever uma espécie como nova para a ciência é uma emoção que poucos terão a oportunidade de experimentar. Infelizmente, este prazer está a ser cada vez mais ofuscado pelas muitas ameaças que as plantas enfrentam como consequência directa da actividade humana”, lamenta Martin Cheek, chefe de investigação do grupo africano dos Kew Gardens, citado numa nota de imprensa.
Parte das novas espécies descobertas para a ciência em 2024 já estão em risco. É o caso de uma planta trepadeira endémica do Vietname que, mal tendo sido descrita, já figura na classificação “criticamente ameaçada” da Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN na sigla em inglês). Conheça melhor abaixo algumas das novas espécies de 2024 segundo os cientistas dos Kew Gardens.
A flor “solitária” do Vietname
Esta nova descoberta botânica traz para a ciência um novo género e uma espécie individual endémica do Vietname, da família das plantas trepadeiras tropicais Malpighiaceae. Chama-se Chlorohiptage vietnamensis.
O género (que corresponde à primeira palavra do nome científico, sempre escrita com letra maiúscula e em itálico) foi baptizado como Chlorohiptage, devido às suas flores verdes como a clorofila. Na família Malpighiaceae, as florações costumam ser amarelas.
Não se sabe qual insecto poderia polinizar estas flores verdes. Os investigadores observaram que o habitat de calcário cársico da nova espécie está a ser actualmente explorado por pedreiras, que extraem matéria-prima para o fabrico de cimento para o mercado internacional.
“Os cientistas consideram, por isso, que a nova espécie Chlorohiptage vietnamensis é a única espécie conhecida do seu género e classificaram-na como criticamente ameaçada”, refere o comunicado, e daí a afirmação de que se trata de uma planta trepadeira “solitária”.
A trepadeira com aroma de maçapão
Keita deniseae é simultaneamente uma nova espécie e um novo género descoberto para a ciência. Esta trepadeira da floresta tropical africana apresenta um cheiro forte adocicado que se assemelha ao do maçapão (massa de amêndoas moídas). Quando os caules ou as raízes são ralados, o aroma é libertado.
“O espécime-tipo de K. deniseae foi colhido na floresta de Boyboyba, na Guiné, onde a planta se ergue até à copa das árvores com estranhas estruturas em forma de gancho e dá frutos grandes e comestíveis”, lê-se no comunicado dos Kew Gardens.
O nome atribuído à espécie constitui um tributo à botânica guineense Denise Molmou, que em 2018 descobriu a rara e agora provavelmente extinta orquídea-das-quedas (Saxicolella deniseae). O género Keita é uma homenagem ao professor Sékou Moussa Keita, considerado um pioneiro na conservação botânica na Guiné.
A palmeira “fantasmagórica”
Já conhecida pelas comunidades Iban, originárias da ilha de Bornéu, esta palmeira trepadeira é usada tanto para o fabrico de cestos como para a alimentação (os rebentos são comestíveis). As comunidades locais chamam-lhe “wi mukoup ou wee mukup”.
No domínio científico, recebeu o nome “Plectocomiopsis hantu”. “Hantu” é uma palavra indonésia e malaia que significa “fantasma”. Este termo foi escolhido não só porque a espécie ainda é um “mistério” para a ciência – mas também devido ao aspecto “fantasmagórico” do vegetal, que tem os caules cinzentos e a parte inferior das folhas “pintada” de branco.
Plantas que não fazem fotossíntese
Aprendemos na escola que as plantas com flor apresentam folhinhas verdes, repletas de clorofila, através das quais – mediante a presença de luz solar – produzem alimento (moléculas de açúcar) recorrendo à fotossíntese. Ensinam-nos ainda que a “nutrição” desses vegetais depende de uma colaboração com os fungos micorrízicos que, numa lógica de “toma lá, dá cá”, ajudam a planta a aumentar a absorção de minerais em troca de alguns açúcares.
O que raramente nos dizem é que há na botânica seres que “enganam” os fungos e obtêm o alimento de que necessitam – prescindindo, por isso, da clorofila e, consequentemente, da fotossíntese. Um bom exemplo deste método curioso de nutrição é a orquídea-fantasma, que só aparece acima do solo para dar frutos e flores. De resto, está no mundo subterrâneo, uma vez que não precisa da luz solar para produzir alimento.
Em 2024, os investigadores do Kew Gardens descobriram uma família inteiramente nova de plantas que recorre a este método manhoso de alimentação. Os cientistas baptizaram este novo grupo vegetal como Afrothismiaceae, em homenagem ao género Afrothismia, que agrupa diferentes espécies não-fotossintéticas das florestas da África tropical continental.
Até recentemente, pensava-se que pertenciam à família Thismiaceae, mas testes genéticos sugerem que tais espécies do género Afrothismia integram um “clã” à parte. À excepção da Afrothismia insignis, que está classificada como vulnerável, todas as 13 espécies avaliadas na Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da IUCN estão “em perigo” ou “criticamente ameaçadas”. A espécie Afrothismia pachyantha está provavelmente extinta.