Não são conhecidos “os exactos termos” em que está redigido o acordo entre Portugal e Espanha para o estabelecimento do regime de caudais no rio Tejo e que será esta quarta-feira assinado na Cimeira Luso-Espanhola, que decorre em Faro. A crítica é formulada pelo Movimento ProTejo, no comunicado de imprensa enviado ao PÚBLICO, onde destaca a “cedência do Governo português, retumbante e sem precedentes” ao acordar uma proposta que não acolhe “nenhuma das quatro posições apresentadas” pelos seis movimentos cívicos em defesa dos rios e da água, na sessão de auscultação do Ministério do Ambiente e Energia.
Fica assim demonstrado, prossegue o comunicado do movimento, que “um caudal diário não é um verdadeiro caudal ecológico, contínuo e instantâneo, mas apenas um caudal mínimo com o objectivo de servir principalmente a produção de energia”.
O Movimento ProTejo explica o que é “um verdadeiro regime de caudais ecológicos determinados por métodos científicos”: a solução que será acordada esta quarta-feira “não se coaduna com a proposta de caudais mínimos diários fazendo simplesmente a divisão dos actuais 7 hm3 de caudal mínimo semanal pelos 7 dias das semanas, ou seja, 1 hm3 por dia a serem largados à hora”, como defende a Iberdrola.
Este conceito “repete a fórmula absurda acordada em 2017” entre o Governo português e a concessionária hidroeléctrica EDP que fixou um caudal mínimo diário na barragem de Belver de cerca de 0,864 hm3, que se alcançam turbinando 30 m3/s de água em dois períodos de 4 horas e durante as restantes 16 horas do dia podem manter-se caudais nulos, recorda o movimento.
O regime de caudais ecológicos que o Movimento ProTejo pretende ver implementados definitivamente “são aqueles que verdadeiramente permitem a conservação dos ecossistemas e o bom estado ecológico das águas e que, sendo instantâneos e contínuos, evitam por essa via a enorme volatilidade de caudais que hoje se verifica”.
Assim, prosseguem, os caudais mínimos diários publicamente anunciados “não resolvem o problema de enorme volatilidade dos caudais do rio Tejo com origem em Espanha”. Por outro lado, “não permitem a conservação dos ecossistemas em todo curso do rio, nem garantem a penalização da Iberdrola pela ocorrência de caudais nulos no Tejo”, assinala ainda o comunicado.
O Movimento ProTejo responsabiliza a Ministra do Ambiente e Energia pelo “desperdício de uma oportunidade única de impor à Iberdrola o cumprimento de um regime de caudais ecológicos no rio Tejo” em contrapartida da autorização, a esta mesma empresa, da construção de dois projectos hidroeléctricos de bombagem reversível nas barragens de Alcântara e Valdecañas, em Espanha. Para a materialização do projecto de Alcântara, Espanha necessita da autorização das autoridades portuguesas no âmbito da Convenção de Albufeira, por se localizar a menos de 100 quilómetros do território português.
A implementação destes dois projectos hidroeléctricos de bombagem reversível permitirá à Iberdrola manter a água em ciclo fechado durante mais tempo para, desta forma, assegurar o armazenamento de água necessária à produção de energia.
O movimento lamenta ainda a “incapacidade” do Governo português de “impor à Iberdrola a obrigação de cumprimento de um regime de caudais ecológicos no rio Tejo”. A produtora espanhola de energia passa a dispor, “a partir de hoje, sem qualquer garantia conhecida, da capacidade de fechar completamente a torneira da água do rio Tejo com origem em Espanha”.
O ProTejo anuncia que irá encontrar-se com os representantes da Comissão Europeia, em Lisboa com o objectivo de transmitir a urgência da apreciação da denúncia que irá endereçar à Comissão Europeia devido “incumprimento da Directiva Quadro da Água pela não-implementação de um regime de caudais ecológicos por Espanha e Portugal”. Esta denúncia já foi subscrita por 31 organizações portuguesas, espanholas e europeias, ambientalistas, sociais, culturais e autarquias.