Tempestade Kirk varreu Norte do país: mais de 2500 ocorrências e acessos ao Porto condicionados
Maior parte das ocorrências está relacionada com quedas de árvores. Não há registo de feridos, mas foram contabilizados danos em viaturas e uma família desalojada. Várias escolas fecharam portas.
A Autoridade Nacional de Emergência e Protecção Civil (ANEPC) registou, entre as 18h de terça-feira e as 16h desta quarta-feira, mais de 2500 ocorrências relacionadas com o mau tempo, a grande maioria quedas de árvores. O IPMA informou que a tempestade Kirk deverá deslocar-se para nordeste e passar a noroeste da Península Ibérica, tendo estado "no ponto mais próximo do continente" às 7h desta quarta-feira.
José Miranda, oficial de operações da ANEPC, confirmou ao PÚBLICO que foram registadas 2536 ocorrências em menos de 24 horas, a grande maioria na região Norte e devido a quedas de árvores. “A região Norte foi a mais afectada pelo mau tempo com 1815 ocorrências”, adiantou. Não foram registados feridos relacionados com o mau tempo, mas há contabilização de danos patrimoniais, segundo a Protecção Civil.
Pelas 16h30, existiam cerca de 48 mil pessoas, sobretudo nos distritos de Viana do Castelo e Braga, sem electricidade devido ao mau tempo, adiantou a E-Redes. Segundo a empresa do grupo EDP, à mesma hora já tinham sido resolvidas 90% das ocorrências registadas, sendo que, às 9h, o número de clientes sem energia era de 400 mil. Neste momento, estão instalados no terreno 56 geradores para minimizar o impacto das avarias na rede eléctrica, a maioria provocadas por quedas de árvores.
Ao início da manhã, pouco depois das 8h, as marcas da passagem da tempestade Kirk eram visíveis em várias ruas da Baixa do Porto. Na Rua Sá da Bandeira, uma árvore derrubada pelo mau tempo obrigou ao corte da via ao trânsito. A remoção dos destroços estava a ser tratada por elementos dos serviços municipais. Pouco depois, já passavam carros. Perto das 11h, já só sobrava na caldeira a base da árvore.
O mesmo aconteceu noutras artérias principais da cidade. Na Rua de Cedofeita, já fora da zona pedonal, uma chapa de uma empena de um prédio tinha sido atirada pelo vento para a entrada do parque de estacionamento descoberto que lá existe, impedindo a passagem de carros. De acordo com comerciantes da rua, não houve danos materiais maiores. Quando as lojas abriram a chapa já lá estava no chão. Os lojistas presumem que terá caído durante a madrugada. Durante a manhã ainda continuava ali perto, mas já fora da zona onde passam os carros.
O mau tempo continuou durante toda a manhã. Apesar de a chuva não cair com grande intensidade, o vento continuava a incomodar quem tentava manter o guarda-chuva aberto. Na Praça Gomes Teixeira (zona dos Leões), percebia-se que a tarefa não estava fácil para muitos dos que ali passavam. Talvez por isso houvesse quem optasse por aguentar os pingos da chuva, caminhando com o guarda-chuva fechado na mão.
Na zona da Lapa, junto à paragem de autocarro que serve o hospital, a madeira de outra árvore acumulava-se em cima do passeio numa pilha, enquanto alguns troncos ainda estavam em parte da estrada. Elementos dos serviços municipais ainda continuavam a trabalhar para desobstruir a via.
Da parte da manhã, segundo o gabinete de comunicação da autarquia, a Rua do Freixo, que esteve fechada, era a zona mais crítica. Ali foram feitos cortes preventivos de árvores e a E-Redes teve de intervir, por força do impacto que existiu na rede eléctrica da área.
Os estragos dos ventos fortes e chuva que persistiram durante toda a noite serão visíveis desde a zona da Constituição até à Boavista, passando pela Rua Guerra Junqueiro, Sá da Bandeira e muitas outras. Na Senhora da Hora, em Matosinhos, também foram registadas múltiplas ocorrências. Por causa da queda de uma árvore, a circulação rodoviária da Avenida AEP, que liga os concelhos de Matosinhos e Porto, chegou a estar cortada, mas já foi aberta ao trânsito.
Fonte dos Bombeiros Sapadores do Porto adiantou ao PÚBLICO que nesta cidade os estragos "estão por todo o lado". "Foram muitas chamadas durante a noite, mas agora de manhã, à medida que as pessoas despertam, estamos a receber mais ainda", disse a mesma fonte, sinalizando que a maioria das quedas de árvores e danos em estruturas, nomeadamente algumas habitações, ocorreu na cidade do Porto que tem vários acessos condicionados.
Também o mau tempo fez cair uma grua sobre um prédio residencial em Vila Nova de Gaia, indicou à Lusa fonte da Câmara Municipal. A grua também terá atingido outros dois edifícios e uma casa devoluta. Apesar de não haver registo de feridos, uma família ficou desalojada. A ocorrência foi registada cerca das 5h na Rua Pinto de Aguiar, em Mafamude, que faz a ligação entre a zona da Rasa e Santo Ovídeo.
Em Vila Real, o vice-presidente da autarquia deu conta de um "número significativo" de ocorrências durante a manhã desta quarta-feira, com nove viaturas e quatro coberturas de casas danificadas.
"Tivemos um número significativo de ocorrências num curtíssimo espaço de tempo. As principais foram quedas de árvores sobre viaturas", afirmou Alexandre Favaios, num ponto de situação feito pelas 12h. Foram atingidos oito automóveis e um autocarro.
Aulas suspensas e estradas cortadas
A Escola Secundária Alexandre Herculano, no centro da cidade, está encerrada durante toda a manhã devido à queda de três árvores no interior do recinto escolar, disse à Lusa fonte da autarquia. Os trabalhos de remoção e limpeza deverão ficar concluídos durante a manhã, pelo que no período da tarde já deverá haver aulas.
Em Paredes, os estragos causados pelo mau tempo obrigaram a suspender durante esta quarta-feira as actividades lectivas na Escola Básica e Secundária de Rebordosa. "Estão a ser feitos esforços para que as aulas sejam retomadas normalmente, tão cedo quanto possível", avançou à Lusa fonte da autarquia, acrescentado que a medida foi tomada a título preventivo pela existência de danos no telhado do edifício.
Mais a norte, o agrupamento de Escolas Doutor Bento da Cruz, em Montalegre, também fechou as escolas. A Protecção Civil de Montalegre, no Norte do distrito de Vila Real, emitiu um comunicado em que informa que "não estão reunidas as condições de segurança para assegurar a realização do transporte escolar".
Em Braga, no concelho de Vila Verde, a Escola Básica 2/3 e o Centro Escolar de Moure, assim como a Escola Básica de Prado, estão fechadas devido à falta de energia eléctrica causada pela passagem da tempestade.
A circulação na auto-estrada 24 (A24) foi cortada nos dois sentidos entre os nós de Vila Pouca de Aguiar e de Fortunho às 9h45, devido ao vento forte, e retomada há poucos minutos, pelas 15h30. Um camião tombou esta manhã pelas 7h num viaduto da mesma auto-estrada, perto de Vila Pouca de Aguiar, com o motorista a sair ileso.
Foi também normalizada a circulação ferroviária na Linha do Minho, entre Vila Nova de Cerveira e Valença, distrito de Viana do Castelo, pelas 14h30, após ser reposta a tensão eléctrica. Em causa esteve a queda de árvores para a ferrovia, tendo sido necessário desligar as catenárias para a limpeza segura da linha.
No distrito de Viseu, o vento forte da última madrugada destruiu macieiras e toneladas de maçã nos concelhos de Armamar e Moimenta da Beira, disseram à agência Lusa produtores da região. Em Valpaços, Vila Real, a colheita afectada foi a da castanha, com o vento a derrubar castanheiros e provocar a queda de ouriços.
Todos os distritos da costa portuguesa (Aveiro, Beja, Braga, Coimbra, Faro, Leiria, Lisboa, Porto, Setúbal e Viana do Castelo) mantêm-se sob aviso laranja devido à agitação marítima até às 23h59 desta quarta-feira, com ondas de Oeste que podem atingir os 12 metros de altura. A partir da meia-noite e até às 6h de quinta o aviso passa a amarelo, estando previstas ondas de Noroeste com quatro a cinco metros.
O IPMA informou em comunicado que a tempestade Kirk deverá deslocar-se para nordeste e passar a noroeste da Península Ibérica, após passar a norte do arquipélago dos Açores. O ponto em que esteve mais próxima do continente foi às 7h desta quarta-feira.
Recomendações da Protecção Civil
A Protecção Civil já havia recomendado à população, em particular à das zonas historicamente mais vulneráveis e nas áreas afectadas pelos incêndios rurais, que tomasse medidas preventivas face ao mau tempo, dizendo que o impacto destes efeitos meteorológicos poderia ser minimizado, sobretudo através da adopção de comportamentos adequados.
Em particular nas zonas historicamente mais vulneráveis, e nas áreas afectadas pelos incêndios rurais, que ficaram sem coberto vegetal e com cinza acumulada à superfície, que funciona como uma matéria impermeável, mais expostas e vulneráveis à precipitação, a ANEPC recomendou medidas preventivas, como garantir a desobstrução dos sistemas de escoamento das águas.
Recomendou ainda que se garantisse uma adequada fixação de estruturas soltas, nomeadamente, andaimes, placards e outras estruturas suspensas, e que tivesse especial cuidado na circulação e permanência junto de áreas arborizadas, estando atento para a possibilidade de queda de ramos e árvores, em virtude de vento mais forte. A Protecção Civil também recomendou que se evitasse o estacionamento de veículos e motas juntos a árvores de grande porte.
A adopção de uma condução defensiva, reduzindo a velocidade e com especial cuidado a lençóis de água nas vias, e não atravessar zonas inundadas, de modo a precaver o arrastamento de pessoas ou viaturas para buracos no pavimento ou caixas de esgoto abertas, são outras das recomendações.
Outros efeitos expectáveis do mau tempo são o arrastamento para as vias rodoviárias de objectos soltos, ou desprendimento de estruturas móveis ou deficientemente fixadas, que podem causar acidentes com veículos em circulação ou transeuntes na via pública.
As autoridades apelaram ainda à população que sejam evitados passeios junto ao mar ou em zonas expostas à agitação marítima, de que são exemplo os molhes de protecção dos portos, arribas ou praias. Aconselham também a que não seja praticada a actividade da pesca lúdica, em especial junto às falésias e zonas de arriba “frequentemente atingidas pela rebentação das ondas, tendo sempre presente que nestas condições o mar pode facilmente alcançar zonas aparentemente seguras”. Com Lusa