A construção da dessalinizadora do Algarve suporta-se num projecto “baseado numa mentira”, contestam os proprietários do terreno onde está previsto instalar o equipamento. A sociedade Seacliff – Compra e Venda de Imóveis, por se sentir lesada – mas, também, invocando o interesse público – deu entrada no Tribunal Administrativo de Loulé com uma acção administrativa para impugnação da Declaração de Impacte Ambiental (DIA), emitida pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA), no passado dia 3 de Abril. Os impactes previstos, referem os queixosos, estão “mal estudados” ou “não foram estudados”.
O que está em causa, justifica Albida Ferreiro, é a “defesa da praia [da Falésia] – este é um projecto em que são maiores os prejuízos do que os benefícios”, critica, apontando cenários que colocam em causa uma das zonas emblemáticos do turismo da região –, situada entre Vilamoura e Albufeira. Em concreto, a proprietária do terreno aponta como principal alvo dos eventuais impactes negativos desta obra o recém-criado Parque Marinho da Pedra do Valado. “Este é um projecto lesivo baseado numa mentira”, acusa.
A mentira, explica, baseia-se no facto de a infra-estrutura se apresentar como “um projecto que visa garantir a resiliência do abastecimento público do Algarve”, quando na verdade só garante os consumos numa pequena faixa restrita do litoral. O equipamento prevê uma capacidade inicial de conversão de água do mar em potável na ordem dos 16 hectómetros cúbicos. “Basta ter em conta o que se passa em Espanha, que conta com 765 instalações de dessalinização e continua a ter problemas gravíssimos com o abastecimento de água às populações”, sublinha.
A acção, interposta pela sociedade Seacliff, deu entrada no tribunal de Loulé, no passado dia 2 de Julho, contra a empresa Águas do Algarve, que ofereceu 634 mil euros por uma propriedade de 12 hectares. A quinta, que inclui um prédio urbano, foi adquirida em 2005, por 1,7 milhões.
Albida Ferreiro, em declarações ao PÚBLICO, afirmou: “O que importa destacar é que o investimento público não vai solucionar a falta de água na região, está mal projectado.” Do conjunto de efeitos negativos, destaca ainda as eventuais descargas na ribeira de Quarteira. Na eventualidade de acontecer uma “possível ruptura” das condutas que recolhem água do mar para ser dessalinizada, os seus efeitos seriam “catastróficos” no ecossistema aquático e marinho. De resto, essas preocupações são subscritas pela Plataforma Água Sustentável (PAS), que na fase de consulta pública do projecto declarou que a região fica sujeita a “perigos imensos”.
Do conjunto das condicionantes, mencionadas na Declaração de Impacte Ambiental a propósito da construção da dessalinizadora, refere-se ainda o perigo do acréscimo de salinidade que a salmoura vai provocar. Por isso, a DIA defende a necessidade de acautelar a “dispersão do efluente salino”, que poderá ter efeitos no ecossistema.
Por outro lado, a passagem das condutas vai obrigar também ao rompimento das arribas da praia da Falésia. As obras de engenharia pesada, admite-se no documento da DIA, terão um “impacte negativo, provável, permanente, irreversível”. A obra, cujo calendário para a conclusão dos trabalhos está previsto para final de 2026, tinha um valor inicial estimado de 60 milhões, mas saltou para 90 milhões de euros de preço base para o lançamento da empreitada.