E-cigarros deverão gerar 59 milhões de euros de receita em 2024. Reciclar é preciso

Vapes descartáveis têm pouco tempo de vida, mas um grande impacto ambiental. “Mesmo que reutilizado, em algum momento esse equipamento terá um fim. E o fim de vida não é no lixo comum.”

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A reciclagem dos cigarros electrónicos deve ser feita pelos consumidores nos pontos de recolha Manuel Roberto
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Mudaram-se os tempos, e as opções para quem fuma acompanharam o ritmo de mudança. Aos cigarros tradicionais, juntaram-se o tabaco aquecido (como os produzidos pela marca iQOS) e os cigarros electrónicos (conhecidos por vapes ou cigarros electrónicos).

Apesar de serem muitas vezes tidos como opções mais saudáveis em relação aos cigarros tradicionais que funcionam por combustão, são alternativas igualmente desaconselháveis por médicos e especialistas, e os cuidados a ter também são necessários — mesmo em relação à sustentabilidade, sobretudo dos vapes descartáveis.

vapes descartáveis que podem ter uma duração muito reduzida cerca de uma semana. Pedro Nazareth, CEO do Electrão, diz que todos os "produtos de grande rotação e de tempo médio de vida reduzido, por regra, representam um impacto ambiental acrescido, porque são pouco duradouros".

Como estes cigarros têm pouca durabilidade, "têm uma actividade de produção de energia intrínseca maior do que outros que são mais duradouros". Tal como os vapes reutilizáveis ou outras opções electrónicas, também devem ser descartados num dos pontos do Electrão.

Pedro Nazareth afirma que, "numa estimativa grosseira, os vapes recolhidos serão menos de 2% do total de equipamentos recolhidos num ponto Electrão".

O CEO do Electrão explica que não existem dados sobre a percentagem de vapes recolhidos "porque, do ponto de vista de quantidade, comparativamente com outras famílias de eléctricos (aspiradores, máquinas de café, computadores, televisores, etc.), os vapes são residuais". Desta forma, os vapes são incluídos na categoria "outros", onde também se inserem equipamentos de pequena dimensão.

Texto editado por Sónia Sapage

De acordo com um estudo sobre cigarros electrónicos realizado em 12 países europeus, publicado em 2023 e que inclui dados sobre Portugal, "a prevalência do uso de cigarros electrónicos é de 0,9%". Além disso, no que diz respeito ao consumo, a mediana do número de inalações diárias por parte dos participantes portugueses é de 99, mas nenhum dos inquiridos relatou usar um dispositivo descartável, sendo os cigarros electrónicos recarregáveis a principal escolha.

Segundo a plataforma de dados Statista, em Portugal, prevê-se que a receita gerada no mercado de cigarros electrónicos atinja os 63,4 milhões de dólares (aproximadamente 59 milhões de euros) em 2024. Mais ainda, "espera-se que o mercado experimente uma taxa de crescimento anual de 0,77%".

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Cigarros electrónicos e tabaco aquecido contribuem para o aumento de fumadores MATILDE FIESCHI

Vapes reutilizáveis são melhor opção?

Mas são os vapes descartáveis melhor opção? Pedro Nazareth explica que, por regra, a reutilização é sempre a melhor opção. Fazer pressão junto das marcas e dos fabricantes para que produtos reutilizáveis sejam uma opção de consumo é "sempre uma forma de minorar o impacto ambiental". Assim, "prevenimos a geração de resíduos e prevenimos novo consumo".

“Mesmo que reutilizado, em algum momento esse equipamento terá um fim. E o fim de vida não é no lixo comum. Não pode ser misturado com o lixo comum, porque tem características muito específicas e inviabiliza a própria reciclagem dos materiais que estão nos equipamentos, seja de vaporização, seja de tabaco aquecido”, realça Pedro Nazareth, CEO do Electrão.

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Equipamentos electrónicos alternativos ao tabaco tradicional devem ser depositados nos pontos de recolhada espalhados pelo país Electrão / D.R.

O que contêm os vapes

Pedro Nazareth, CEO do Electrão, explica como funcionam os vapes. “Nos vapes, que são vaporizadores em que a tecnologia é diferente, porque aí não se aquece o tabaco, vaporiza-se um líquido que tem nicotina. Portanto, não tem tabaco propriamente dito, não tem filtro. O que temos é um género de um líquido com nicotina, que é vaporizado e inalado.” “Ao fim e ao cabo, temos vaporizadores, vapes, e temos cigarro electrónico para tabaco aquecido. Os dois são dispositivos eléctricos e electrónicos.”

Em resposta enviada por email ao PÚBLICO, especialistas da Deco ProTeste explicam que os “cigarros electrónicos não contêm tabaco, facto que os distingue dos cigarros convencionais ou dos cigarros de tabaco aquecido (comercialmente conhecidos como iQOS)”.

No que diz respeito aos componentes que contêm, “o líquido que dá origem ao aerossol dos cigarros electrónicos não tem só água. Há solventes, como a glicerina vegetal e o propilenoglicol, aromas e, na maioria dos casos, nicotina”, que pode ter graves consequências para a saúde, afirmam as especialistas.

A importância da reutilização

Actualmente, existem dez mil pontos de recolha do Electrão espalhados pelo país, onde se podem depositar estes cigarros. Os locais podem ser consultados no site ondereciclar.pt. O local mais conhecido, diz Pedro Nazareth, é o Ponto Electrão. As especialistas da Deco adicionam também que os contentores do projecto Depositrão são outra opção para reciclar.

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Cigarros electrónicos e tabaco aquecido têm baterias de lítio no seu interior MATILDE FIESCHI

Pedro Nazareth diz que “o Electrão, enquanto entidade de maior responsabilidade em Portugal, que faz a gestão dos equipamentos eléctricos usados, tem a responsabilidade de fazer o máximo possível para recolher este tipo de equipamento e para os reciclar”.

Fazer a reutilização de equipamentos eléctricos, independentemente da sua natureza, é uma etapa fundamental. O CEO do Electrão recorda que, “em larga medida, soluções reutilizáveis de aparelhos eléctricos são sempre preferíveis quaisquer que eles sejam. A reutilização é sempre uma alternativa. Porquê? Porque permite prolongar o tempo de vida dos equipamentos”.

Com este passo, é possível evitar o descarte dos materiais e a sua potencial perda. Além disso, evita-se “estarmos repetidamente a fabricar o mesmo produto”.

Ainda que se faça a reutilização destes produtos, é importante relembrar que estes também têm “um prazo”. Por isso mesmo, não devem ser descartados para o lixo comum, para não se comprometer a sua reciclagem.

Uma solução de reciclagem a ser trabalhada

Rui Berkemeier, engenheiro do ambiente e membro da associação ambientalista Zero, acredita que o facto de as pessoas não entregarem os resíduos e os deitarem, pelo contrário, para o lixo pode constituir um entrave à reciclagem.

“O que temos estado a defender já há alguns anos, quer para as embalagens, quer para o equipamento eléctrico e electrónico, é haver um incentivo ou um depósito quando se compra. Ou um incentivo quando se devolve, para haver um estímulo económico para o consumidor”, afirma Rui Berkemeier.

Pedro Nazareth, da associação de gestão de resíduos, explica que a intenção é sensibilizar as pessoas para fazerem a reciclagem. A solução que actualmente existe em Portugal “é a que dá mais garantias, mais segurança e potencia a reciclabilidade dos materiais que constituem os cigarros electrónicas e os vapes”, refere.

A responsabilidade recai também sobre os comercializadores destes produtos. Pedro Nazareth acredita que “os fabricantes de cigarros acabam por estar sensibilizados para o problema que representam, e já estão com outras iniciativas no terreno para tentar aumentar a recolha destes equipamentos”.

O CEO do Electrão diz também que o ideal seria recolher os vapes individualmente e que o Electrão está a "desenvolver ensaios de recolha, com algumas das empresas que colocam estes produtos no mercado, para colocar contentores específicos para o descarte destes vapes em fim de vida". A ideia é apelar à consciência ambiental das pessoas para depositar os vapes nesse ponto de reciclagem. "Se fizermos um melhor trabalho de recolher seleccionadamente os vapes, vamos estar a potenciar a sua taxa de reciclagem."

As baterias de lítio

No seu interior, os cigarros electrónicos e o tabaco aquecido têm uma fonte de energia eléctrica que permite o seu funcionamento. Mais precisamente, estes cigarros contêm baterias de iões de lítio. Também os vapes descartáveis contêm estas baterias.

Pontos de recolha de vapes do Electrão Electrão
Pontos de recolha estão disponíveis em alguns locais de venda dos dispositivos Electrão
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Pontos de recolha de vapes do Electrão Electrão

“Talvez seja o elemento de maior destaque, além dos tradicionais materiais metálicos ou materiais plásticos, que constituem estes equipamentos. O elemento de maior singularidade é uma pilha de pequena dimensão de iões de lítio”, diz Pedro Nazareth.

O CEO do Electrão explica que, durante o processo de reciclagem, esta pilha “tem de ser desmantelada, tem de ser individualizada, porque o seu circuito de reciclagem está muito bem estabelecido”. Aliás, recorda o perigo de ignição de incêndio que existe, se estas baterias de iões de lítio forem postas no lixo comum. "Além do problema ambiental que criamos, criamos o risco acrescido de ignições."

Contudo, a tecnologia apenas consegue assegurar esse processo de desmantelamento se a reciclagem do equipamento for feita. “Se nós não separarmos e misturarmos com o lixo comum, o nosso trabalho torna-se impossível, praticamente."

Por outro lado, “se o equipamento for individualizado pelo consumidor e colocado no sítio certo, vamos estar a potenciar a reciclagem dos materiais e a separação das pilhas de iões de lítio, uma vez caindo na nossa rede. Se não cair na nossa rede, é mais difícil fazermos esse trabalho. Portanto, a reciclabilidade acaba por ser potencial, não é efectiva”.

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Entre 2017 e 2022, o consumo de tabaco aumentou entre os portugueses Manuel Roberto

O ideal é mesmo não fumar

“Os e-cigarros não produzem combustão, fenómeno que origina os componentes mais prejudiciais do tabaco tradicional, mas ambos comungam de outras substâncias potencialmente perigosas”, esclarecem as especialistas da DECO.

Desta forma, mesmo sendo diferentes dos cigarros tradicionais, não são uma boa alternativa. "Mesmo que a concentração e a temperatura de aquecimento sejam inferiores nos cigarros electrónicos, os danos na saúde não estão excluídos".

Apesar de não produzirem combustões, estes cigarros “emitem aerossóis com substâncias tóxicas associadas ao desenvolvimento de cancro, doenças pulmonares e aumentam o risco de doenças cardiovasculares, entre outros”, confirmam as especialistas.

A 16 de Janeiro de 2024, entraram novas regras em vigor e o tabaco aquecido passou a ser equiparado ao tabaco convencional, em termos de odores, sabores e aromatizantes. Esta alternativa deixou de poder ter aromas e substâncias que modifiquem o odor ou o sabor dos cigarros, onde se incluem os cigarros electrónicos.

Estas regras apenas se aplicam a cigarros electrónicos com nicotina, uma vez que os cigarros electrónicos sem nicotina não são enquadrados na lei do tabaco.

Segundo o Inquérito Nacional ao Consumo de Substâncias Activas na População Geral (INPG)​, divulgado em Junho do ano passado, o consumo de tabaco continua a aumentar entre os portugueses. De acordo com o relatório, que envolveu uma amostra de 12 mil pessoas, representativa da população, a prevalência do consumo de tabaco aumentou de 48,8% para 51%.