Demasiado lento, demasiado caro e demasiado incerto...
A frase do título refere-se à transição energética na Alemanha, cuja política Portugal segue cegamente, e resulta da constatação de que, quando se ignoram os custos totais do sistema elétrico, mais cedo ou mais tarde a conta chega. O Tribunal Federal de Contas da Alemanha, no seu último relatório especial sobre a implementação da transição energética no fornecimento de eletricidade, divulgado no início de março, duvida de que o fornecimento de eletricidade na Alemanha seja seguro.
O Ministério dos Assuntos Económicos (BMWK) não tem em conta os custos de investimento necessários para a expansão da eletricidade na sua apresentação dos custos da eletricidade produzida a partir de energias renováveis, anunciou ainda o Tribunal de Contas, dizendo que o Governo Federal deve indicar claramente os custos do sistema da transição energética. Além disso, deve determinar finalmente o que entende por fornecimento de eletricidade a preços acessíveis.
Tendo em conta o encerramento das últimas centrais nucleares e a iminente supressão do carvão, o Governo Federal aposta nas fontes de energia renováveis, estando a forçar a sua expansão, mas no relatório o Tribunal de Contas conclui que os objetivos não são cumpridos. Além disso, os custos estão a explodir. O relatório também alerta para os custos, porque só a expansão das redes elétricas ascenderá a um total de 460 mil milhões de euros até 2045, quase tanto como os 500 mil milhões que já custou o denominado Energiewende. Além disso, a expansão da rede não está a progredir como seria necessário. O presidente do Tribunal de Contas alemão, Kay Scheller, afirmou ao apresentar o relatório: "O objetivo de um abastecimento seguro de eletricidade não pode ser garantido a longo prazo."
Portugal e Espanha estão a seguir o mesmo caminho. Qual será o custo total do sistema? Há quem aponte que Portugal tem dois ou três "pequenos" fatores competitivos em relação ao sistema elétrico alemão. Um deles é a significativa capacidade de armazenamento de bombagem hidroelétrica, muito superior à alemã. Outro fator é a capacidade de produção solar fotovoltaica, mais uma vez muito superior à alemã. E por último, mas não menos importante, temos a rede elétrica!
No entanto, temos uma rede que, de acordo com a REN, precisa de ser expandida em 1500 km (e isto só para a rede de Muito Alta Tensão), temos hídrica em algumas alturas do ano, mas em outras escasseia, e necessidades crescentes de eletricidade à medida que a eletrificação progredir. De facto, podemos instalar mais potência de eólica e solar, mas não poderemos descurar necessária potência de backup para quando o sol não brilha e o vento não sopra.
Esta capacidade de reserva será um custo para o consumidor. E se acrescentarmos 10 GW de potência eólica e os restantes de produção de solar fotovoltaica, com preços durante o dia tendencialmente baixos, quem quererá investir, a menos que o preço que irá receber seja garantido? Quando existir recurso, a receita será nula, quando não existir recurso, também não haverá receita, a menos que haja um custo que recaia no consumidor.
E como irá esta instalação assegurar a descarbonização da produção de calor na indústria, transportes e agricultura? São muitas as variáveis, mas nestas condições, apesar de termos “pequenos fatores” competitivos, os custos totais de sistema não serão desprezáveis e não foram feitas as contas para os determinar. Podemos continuar a enterrar a cabeça na areia e esperar que a conta seja servida em vez de exigir que sejam feitos os estudos antes de serem tomadas decisões com grande impacto social.
Em Portugal estamos sempre reféns das (in)decisões arbitrárias. A ausência de capacidade de decisão em relação a projetos emblemáticos como o TGV e o novo aeroporto servem frequentemente de justificação para que nunca se possa sequer pensar em projetos ambiciosos. A nacional procrastinação usada como torpe justificação. É só mais uma das justificações dadas para não falarmos de nuclear em Portugal, porque tem sido amplamente vendida a crença de que vamos conseguir a meta de 100% renováveis.
Entretanto países como a Suécia, cuja penetração hídrica é similar a Portugal, e tem quase tanto, em vez de importar 20% da eletricidade dos países vizinhos, usa nuclear, e, a pensar no futuro eletrificado, está a considerar expandir o nuclear. Por cá, estamos reféns do nacional “achismo” porque todos acham que conhecem a solução e a sua opção é a melhor. A ausência de estudos sérios favorece os muitos que vão “achando” ao sabor da corrente vigente e passando as suas certezas opinativas e ideologias como verdades incontestáveis. A estes, o argumento de que a mediocridade das indecisões do passado deve subsistir em decisões futuras só serve de justificação para nunca se pensar numa estratégia para o futuro.
Na Alemanha a transição energética está a ser demasiado lenta, demasiado cara e demasiado incerta. Portugal trilha o mesmo caminho, apesar do laudatório à produção das renováveis nos últimos dias (que tende a esquecer que esta gerou um sobrecusto, como designado pela ERSE). Qual será o custo total? Sobre quem recairá este custo não restam dúvidas: será sempre o consumidor.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico