Têxteis não-vendidos e devolvidos acabam por ser destruídos na Europa

A Agência Europeia do Ambiente estima que são destruídas entre 264.000 e 594.000 toneladas de têxteis por ano. Cerca de um terço do que é comprado online e devolvido acaba por ser destruído.

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Cerca de 4 a 9% dos produtos têxteis colocados no mercado europeu são “destruídos sem serem utilizados" Lucas Hoang/Unsplash
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Devolver roupa pode ter um impacto maior do que imaginamos. Cerca de 4 a 9% dos produtos têxteis colocados no mercado europeu são “destruídos sem serem utilizados para o fim a que se destinam”, o que representa entre 264.000 e 594.000 toneladas de têxteis destruídos por ano, indicam os dados disponibilizados pela Agência Europeia do Ambiente (AEA) num novo relatório sobre a utilização de têxteis. O consumo excessivo e desperdício de roupa na Europa tem repercussões negativas para o ambiente e o clima.

O relatório da AEA, publicado na semana passada, espelha “o que se sabe actualmente sobre os volumes e a destruição de têxteis devolvidos e não vendidos na Europa”. O objectivo é compreender a percentagem de têxteis devolvidos e não vendidos que são destruídos na Europa e o que se pode fazer para enfrentar esse desafio.

Segundo o relatório, cerca de 22 a 43% de todo o vestuário devolvido comprado online acaba por ser destruído (em média, é um terço). De acordo com a entidade ambiental, estudos recentes indicam que cerca de 20% do vestuário e 30% do calçado, comprados digitalmente na União Europeia (UE), são devolvidos pelos clientes. Cerca de 70% destas devoluções acontecem porque os produtos não servem ou por uma questão de estilo.

Algumas das causas que têm como consequência um aumento da percentagem de têxteis devolvidos e que acabam por não ser vendidos são “o crescimento das compras online, as práticas flexíveis de devolução, a alteração das preferências dos consumidores e as estratégias comerciais da moda rápida na Europa”, descreve ainda a AEA.

Para tentar mitigar este problema, a agência acredita que é “necessário abordar o problema sistémico da sobreprodução e destruição na indústria têxtil, que pode ser resolvido através de modelos de negócio e políticas circulares”.

As emissões dos têxteis

De acordo com o briefing da AEA, “estima-se que a transformação e a destruição de têxteis devolvidos ou não-vendidos sejam responsáveis por até 5,6 milhões de toneladas de emissões de gases com efeito de estufa de dióxido de carbono equivalente, um valor ligeiramente inferior às emissões líquidas da Suécia em 2021”, afirma a entidade no comunicado.

Apesar do impacto negativo que a destruição de têxteis acarreta, a Agência Europeia do Ambiente estima que apenas cerca de 3% das emissões provenientes dos têxteis tenha origem na distribuição e venda a retalho, “o que significa que mesmo um processo de devolução longo e complicado é muito provavelmente benéfico para o ambiente, se levar a que o produto seja revendido e utilizado”.

“Os têxteis devolvidos e não-vendidos são um desafio e um tratamento dispendioso para a indústria”, além de impactarem com gravidade o ambiente. A maioria destes materiais é revendida ou vendida em pontos de venda. Contudo, “a destruição de vestuário devolvido e não-vendido e de outros produtos têxteis tem vindo a ocorrer na indústria da moda e dos têxteis há décadas, com efeitos negativos significativos para o ambiente e as alterações climáticas”, avisa a AEA no relatório.

Em Março de 2023, a Comissão Europeia propôs um novo regulamento relativo à concepção ecológica. Algumas das medidas passam pelos produtos serem acompanhados de um passaporte digital “que forneça aos consumidores todas as informações relevantes para os ajudar a tomar decisões informadas”. Os eurodeputados, por seu turno, manifestaram a intenção de “proibir os fabricantes de limitarem a durabilidade dos produtos e de os tornarem prematuramente obsoletos”, bem como “dar prioridade aos requisitos de concepção ecológica para alguns produtos”, além de outras propostas.

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Indústria têxtil é uma das mais populares nas compras online Nuno Ferreira Santos

Em Julho do ano passado, o Parlamento Europeu (PE) afirmou ter adoptado a sua “posição negocial” e encontrar-se disponível “para as conversações com os Governos da UE sobre a forma final da legislação”. De acordo com o PE, “a União Europeia pretende introduzir normas mínimas para tornar quase todos os produtos no seu mercado sustentáveis, duradouros e ecológicos”.

Economia mundial

Em concordância com os dados da Euratex, que a AEA cita no artigo, “o sector dos têxteis e do vestuário da UE emprega 1,3 milhões de pessoas em 192.000 empresas”. No ano de 2022, o sector do têxtil e de vestuário da UE regressou ao seu nível anterior à pandemia de covid-19, com um volume de negócios de 167 mil milhões de euros, que representa um aumento de 14% face a 2021, afirma a AEA no relatório.

Além disso, “em 2022, os agregados familiares na UE gastaram cerca de 282 mil milhões de euros em vestuário, uma média de 630 euros per capita, e 68 mil milhões de euros em calçado, o que, no total e a preços correntes, representa um aumento de 15% em relação em relação ao ano anterior”, de acordo com dados da Eurostat.

O vestuário, calçado e acessórios são os tipos de materiais físicos mais populares e vendidos online na Europa; já as pessoas com idades compreendidas entre 14 e 44 anos são o grupo que mais compras online efectua (perfazem 76%, segundo a AEA).

Possíveis estratégias de prevenção

No relatório, a agência ambiental apresenta algumas soluções que podem ser úteis para as empresas aplicarem para prevenir e controlar a grande quantidade de devoluções. A AEA sugere que as empresas possam tomar medidas mesmo antes de os artigos serem vendidos. “As tecnologias digitais de prova de roupa podem fornecer conselhos de tamanhos mais sofisticados. Por exemplo, se os clientes tirarem uma fotografia de si próprios com os seus smartphones para criar medidas personalizadas” e utilizar indicações e tabelas de tamanhos, podem contribuir para diminuir a devolução dos artigos.

Do outro lado da moeda, para controlar as devoluções, a organização sugere, entre outras estratégias, “limitar as devoluções através de iniciativas no ponto de devolução” e acredita que “limitar o período de devolução pode, por conseguinte, ter um impacto positivo na probabilidade de venda de uma eventual devolução”. Mesmo assim, a AEA ressalva que “permitir as devoluções é importante para garantir que os clientes compram apenas o que é necessário, o que serve e o que será usado”.

Texto editado por Claudia Carvalho Silva