Dia Mundial da Abelha: o mel pode ser um aliado contra envelhecimento, diz investigadora portuguesa

Descendente de apicultores, Soraia Santos estudou as capacidades antioxidantes e antienvelhecimento do mel. Em Roma, a FAO discutiu contribuição das abelhas para os sistemas agro-alimentares.

Foto
A investigação comprovou propriedades antioxidantes do mel Miguel Manso
Ouça este artigo
00:00
05:47

Soraia herdou o interesse pelas abelhas do avô apicultor “por hobbie”, conta a investigadora portuguesa, o pai também o foi acompanhando. Anos mais tarde, eram as primeiras pessoas em Portugal a ter colmeias térmicas, conta a jovem de 24 anos, e começaram uma empresa. Sempre viveu rodeada de abelhas, tinha colmeias na garagem e, por isso, o zumbido à sua volta e os pés a colarem no chão era coisa do dia-a-dia.

Agora, as colmeias têm sítio próprio e saíram da garagem, “desenvolveram uma empresa a sério, com armazéns, vendas e uma melaria certificada”, conta Soraia Santos. Sempre incentivada pelos familiares a ir “para perto das abelhas”, despertou em si uma curiosidade a que procura responder pela carreira académica na qual “gostava muito de desenvolver tudo o que tem a ver com a apicultura e, nomeadamente, o mel”.

A sua investigação centra-se na influência que a origem geográfica tem nas propriedades do mel. Investigadora que terminou o mestrado em Engenharia Alimentar em Vila Real, testou méis monoflorais (com predominância do néctar de uma determinada flor) para comprovar as propriedades antioxidantes deste produto das abelhas.

Ana Barros, responsável pelo Laboratório de Fitoquímicos da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), onde foi desenvolvido o estudo Influência da origem geográfica na qualidade, composição fitoquímica e actividade biológica do mel, explicou ao Azul algumas das aplicações que podem ter os compostos bioactivos, como, por exemplo, “um efeito oxidante para combate a radicais livres e dessa forma prevenir doenças do foro cardiovascular, doenças cancerígenas, doenças degenerativas, como de antioxidante para prevenir o envelhecimento da pele”. Por exemplo, o mel de castanheiro, que é do Nordeste transmontano, foi aquele que “revelou ter uma melhor propriedade antioxidante”.

“Já no tempo do Egipto que [o mel] é usado como um produto cosmético com propriedades, por exemplo, anti-inflamatórias”, comenta Soraia, e o estudo veio numa tentativa de comprovar esta utilidade. Agora, vão apostar na aplicação destas descobertas. Para dar continuidade ao estudo, vão procurar trabalhar com uma empresa de cosmética e dispositivos médicos, e testar estes produtos para serem integrados em cremes para possibilitar “não só a escrita de artigos científicos, mas uma aplicabilidade”, indica Ana Barros.

“Nós precisamos das abelhas e as abelhas precisam de nós”

Este sábado celebra-se o Dia Mundial da Abelha, assim o é porque neste dia, em 1734, nasceu Anton Janša, conhecido como o pioneiro da apicultura moderna. Diversas organizações apelam para a importância das abelhas e apelam para a necessidade de cuidarmos e prevenirmos o declínio desta espécie polinizadora da qual o mundo tanto depende. A investigadora Soraia Santos alerta para o decréscimo no número de colmeias, por motivos ambientais, climáticos e até por causa da praga das vespas-asiáticas, e acredita que “estes estudos podem incentivar não só os apicultores a não desistir, mas tambémos agentes económicos a investirem nesta área”.

A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO, na sigla em inglês) organizou esta sexta-feira um evento internacional que celebra a contribuição das abelhas para sistemas agro-alimentares mais sustentáveis.

O tema desta edição foi dedicado ao “envolvimento na produção agrícola amiga dos polinizadores” e todas as apresentações ressalvaram a importância destes animais para a cadeia alimentar e para a segurança agrícola e da nutrição.

Moderada por Ronnie Brathwaite, oficial agrícola sénior da divisão de produção e protecção das plantas da FAO, a sessão técnica contou com a participação de Fani Hatjina, directora do Instituto de Ciência Animal da Grécia, com Michele Zerbini, gestor sénior de compras da companhia alimentar italiana Barilla, e com Erika Thompson, a apicultura viral no Instagram que conta com mais de um milhão de seguidores.

Erika Thompson vê uma necessidade de mudar a mentalidade das pessoas em relação às abelhas. “Elas não são as vilãs, sãs as heroínas da história”, afirma a apicultura. “Se trabalharmos todos juntos, podemos fazer com que todos os dias sejam um óptimo dia para salvar as abelhas”, comenta, enumerando uma série de coisas que podemos fazer no dia-a-dia para contribuir para o bem-estar das polinizadoras.

1. “Plantar-lhes comida”

A apicultora apela para que as pessoas plantem alimentos para as abelhas, “plantas, flores – de preferência nativas”, sugere.

2. “Construam-lhes habitats e casa”

Como exemplo temos um ninho que pode ser construído nos jardins de qualquer pessoa, feito com tubos de madeira, onde as abelhas se podem refugiar e construir a sua casa.

3. “Dar-lhes água”

Se puser, por exemplo, um prato com água no parapeito da janela com pedras para que as abelhas possam aterrar, vai estar a fornecer-lhe um bebedouro.

4. “Evitar o uso de pesticidas”

“Obviamente”, comenta Erika, pede que as pessoas evitem usar pesticidas nos seus quintais porque estes diminuem a imunidade das abelhas e interferem com o seu sistema de navegação e comunicação.

5. “Sejam consumidores conscientes”

Pede-se que as pessoas tentem comprar produtos orgânicos ou não-tratados agressivamente com pesticidas, que aprendam de onde vêm os alimentos e, principalmente, que responsabilizem as empresas pela forma como tratam o ambiente.

E a apicultora deixa uma mensagem final: “Da próxima vez que se sentarem à mesa para jantar, agradeçam às abelhas, aos apicultores e aos agricultores.”

O gestor Michele Zerbeni apresentou e explicou o caminho do grupo Barilla para valores e práticas mais sustentáveis, apostando em políticas amigas das abelhas, como o uso reduzido de pesticidas, a colaboração entre agricultores e apicultores, a aplicação de uma metodologia de avaliação de riscos, como a certificação de pesticidas. Realçando o conceito de “uma só saúde”, Fani Hatjina ressalvou a importância da protecção do ambiente, que é determinante para a saúde das abelhas, que são cruciais para o sector alimentar, cuja seguranças e valores alimentar asseguram o bem-estar humano. Como disse Erika Thompson, “nós precisamos das abelhas e as abelhas precisam de nós”.

Texto editado por Claudia Carvalho Silva