Deixemo-nos fascinar pelas plantas
Foi há 3500 milhões de anos que se deu a maravilhosa “invenção” da fotossíntese, mas só há 450 milhões surgiram as plantas que, ao conquistarem os continentes, não pararam de evoluir. O Homem depende das plantas para alimento, abrigo, energia, fibras, vestuário e mesmo como fonte de inspiração artística e adorno dos jardins e espaços naturais. Também o oxigénio que respiramos resulta dos seus processos biológicos. São, ainda, responsáveis por controlar os níveis de CO2 e, consequentemente, por regular o clima a nível local e global.
O ruído e a qualidade do ar são absorvidos e amortecidos pelas plantas, particularmente as árvores que, nas cidades, permitem melhorar a qualidade de vida, o conforto térmico e a nossa saúde. No entanto, muitas pessoas nem dão pela sua existência. Nem tão pouco sabem dizer que árvores se encontram nas suas ruas, junto à paragem dos autocarros, ou do seu local de trabalho. Funcionam como “mobílias” vistosas das nossas urbes. De acordo com Marder, “são ecrãs para as nossas selfies”, numa forte alusão irónica à moda social da autofotografia.
Não é de admirar que os jovens mostrem um desinteresse global pela botânica. No ensino básico, o número de aulas dedicado às plantas é um décimo do dedicado aos animais. No ensino superior, o fascínio pelas plantas depende muito do carisma dos professores e da motivação que transmitem nas aulas. Nos media, quando se fala em perda de diversidade, os exemplos mediáticos são animais e são raras as plantas que merecem destaque. O sobreiro é excepção, ao ser instituído como árvore nacional. Mas pouco lhe vale, quando surgem “projectos de interesse nacional” mesmo que isso justifique o derrube de montados.
São inúmeros os exemplos que têm procurado ajudar a reverter esta indiferença pelas plantas. A primeira foi lançada, em 2012, pela European Plant Science Organization (EPSO), com a criação do 18 de Maio como dia do Fascínio das Plantas, promovido em Portugal pela Sociedade Portuguesa de Fisiologia Vegetal.
Mas outras iniciativas, mais recentes, são emblemáticas, como a criação da Flora-On, uma plataforma digital de apoio à identificação e caracterização da flora portuguesa, a constituição da Sociedade Portuguesa de Botânica, os seus desafios para a selecção da planta do ano, ou mesmo a selecção da árvore do ano, concurso internacional onde Portugal tem marcado presença pelos belíssimos exemplares que possui.
A ligação etnográfica das plantas, a exploração de campo e as abordagens tradicionais versus a utilização de ferramentas digitais ligadas à ciência cidadã, a arte e a botânica ligando a fotografia às práticas laboratoriais com plantas e à pintura são outras formas de motivar e levar os jovens e as pessoas, em geral, a despertar para as plantas, através do conhecimento científico e sensibilidade artística.
Os parques citadinos, os jardins, botânicos ou outros, podem ser espaços verdes de sensibilização para as plantas, para a variedade de formas, cores, tamanhos e aromas das flores enquanto adaptações desenvolvidas para tornar eficiente a polinização. Cada morfologia reflecte uma estratégia vencedora, aquela que teve mais sucesso para o transporte de pólen. Por exemplo, a relação planta/polinizador, ao tornar possível a existência de uma enorme diversidade de plantas, permite contar uma série de histórias que poderiam entusiasmar e fascinar os jovens e permitir o seu respeito enquanto visitantes dos jardins.
Em Portugal, a fruição destes espaços verdes está na moda, já que a vivência urbana assim o justifica. Mas entre jogos de bola, festas de anos, práticas desportivas, em grupo ou a título individual, verifica-se uma falta de respeito pelo espaço: pernadas de árvores que se partem por falta de cuidado, lixo espalhado, ou porque voa ou porque está mal acondicionado nos sacos de lixo que se deixam em monte, moitas de arbustos com flores pisadas, cortadas ou arrancadas.
Por outro lado, as plantas em geral e a vegetação arbórea, em particular, estão sujeitas ao cultivo, limpeza, podas, corte de plantas que são consideradas "boas" e erradicação de plantas que são consideradas "más ou daninhas". Isso origina perda de diversidade floral causada pela utilização de um número limitado de cultivares e a deformação e doenças em certas árvores, em resultado de excesso de rega, inadequação de espaço e podas sucessivas em anos contíguos.
Neste dia internacional dedicado às plantas importa pensar em novos desafios para nos deixarmos fascinar e entender a natureza. Mais espaços verdes, cuidados e diversificados, actividades lúdicas e artísticas apelativas poderão ajudar a saber olhar e ensinar a ver, para poder respeitar.
No ano passado foi instituído o Dia Nacional dos Jardins (25 de Maio) como homenagem ao arquitecto Gonçalo Ribeiro Telles. Esperemos que estes dias não sejam apenas emblemáticos e possam servir o propósito de aumentar a literacia sobre as plantas e, consequentemente, o respeito por todos os espaços “verdes”