Do local ao global: a importância das cidades na conquista da neutralidade climática

Em 2023, e com a emergência climática cada vez mais na ordem do dia, a minha reflexão para o Dia da Terra centra-se no papel que as cidades devem assumir, de forma a tornarem-se agentes de mudança.

Há 53 anos aconteceu a primeira manifestação em prol da criação de leis destinadas à proteção do ambiente. Os Estados Unidos da América viram as suas ruas com milhares de pessoas – principalmente jovens estudantes –, juntas pela luta ambiental, e que através da pressão social, conseguiram que o país criasse a Agência de Proteção Ambiental. O momento, que até hoje ficou marcado para a história, com a celebração do Dia da Terra, não poderia ser mais importante para que, globalmente, paremos para refletir sobre a forma como cuidamos do planeta, e sobre os muitos desafios ambientais que enfrentamos.

Em pleno 2023, e com a emergência climática cada vez mais na ordem do dia, a minha reflexão para o Dia da Terra centra-se no papel que as cidades devem assumir, de forma a tornarem-se agentes de mudança, no que à proteção e preservação do ambiente diz respeito. De acordo com as Nações Unidas, metade da população mundial vive em cidades e prevê-se que, até 2030, estas venham a acolher mais de cinco mil milhões de habitantes.

O natural aumento da população reforça a ideia de que as cidades devem ter um papel central na neutralidade climática, principalmente no que toca à proteção dos ecossistemas urbanos e dos recursos naturais, para que futuramente consigam albergar, de forma sustentável, novos habitantes. Responsáveis por grande parte das emissões de gases de efeito estufa, as cidades devem, por isso, transformar-se num dos principais focos de ação e implementação de soluções sustentáveis e transformadoras.

Com metas para a neutralidade climática a serem discutidas a nível europeu e nacional, considera-se cada vez mais essencial começarmos a debater as questões ambientais de forma local. Quantos dos leitores já ouviram falar da COP (Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas), acompanhando pelas notícias as principais decisões dos líderes políticos, contudo, sem perceberem na realidade quais as verdadeiras implicações da iniciativa para a sociedade, as mudanças para o clima e de que forma cada cidadão vai, verdadeiramente, contribuir para a transformação do planeta.

Quanto mais distante estamos dos temas, mais distante estamos das soluções. Precisamente por isso, e face à importância que a neutralidade climática apresenta, é importante que esta seja uma discussão que devemos aproximar o mais possível dos cidadãos e das comunidades locais, envolvendo-as e tornando-as nos agentes de mudança. É necessário que os municípios e o poder local assumam estes desígnios como uma prioridade, fomentando projetos inovadores, nos quais todos possam contribuir no processo de transformação.

É crucial desenvolver modelos de governança capazes de integrar os setores público e privado, as escolas e universidades, possibilitando, assim, o investimento em I&D e educação ambiental, utilizando a ciência e a tecnologia como base para a tomada de decisões e para resolução dos principais desafios.

O poder local deve assumir, cada vez mais, um duplo papel de transformação social: a formação e consciencialização dentro das comunidades para a proteção do ambiente, e a atuação como catalisador da mudança local.

É fundamental que os cidadãos se revejam enquanto verdadeiros agentes de mudança, tendo a capacidade de identificar projetos em concreto para os quais contribuíram e acrescentaram valor.

As cidades devem, também, dispor de métricas para orientarem as suas políticas ambientais. Um exemplo disso, é o cálculo da pegada ecológica, uma ferramenta importante que pode ajudar as cidades a definirem os seus objetivos e a monitorizarem os resultados.

Guimarães, por exemplo, é uma das cidades que já dispõe de uma calculadora individual da pegada ecológica, que permite que cada cidadão saiba qual é a sua necessidade em termos de recursos naturais, com o objetivo que o mesmo tome medidas para possa adotar comportamentos que ajudem na redução da sua pegada individual, mas também para que o município possa orientar as suas políticas de investimento.

Esta visão “da parte para o todo” apresenta ainda uma vantagem: permite que projetos e iniciativas sejam testados, percebendo-se qual a sua viabilidade e repercussão, podendo ser assim replicados a uma escala nacional ou até mesmo europeia.

Quando se diz que a transformação do planeta começa em cada um de nós, não é cliché. Começa mesmo. A mudança pode estar na transformação local, em cada cidade, em cada freguesia, em cada comunidade, em cada cidadão e pode ser a alavanca para se alcançar resultados globais, que levem à neutralidade climática.

O primeiro passo é implementar ações sistémicas, localmente desenhadas e personalizadas, que preencham as necessidades individuais de cada região, e que toquem em parâmetros como a energia, as alterações climáticas, a gestão de resíduos, a água, o uso sustentável do solo, a biodiversidade, a mobilidade, a qualidade do ar e ruído e, sobretudo, a educação ambiental e o empoderamento dos cidadãos. E, acima de tudo, ações que impactem na saúde e bem-estar da população.

E que daqui a 53 anos se continue a refletir, neste Dia da Terra, sobre o que pode fazer de melhor pelo futuro sustentável do nosso planeta, mas que esse futuro seja mais promissor, com as ações que estão agora a ser desenhadas, colocando-nos mais perto da efetiva transição ecológica que ambicionamos.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico.

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