COP27: Salvaguardar a vida na Terra
A conferência das Nações Unidas sobre alterações climáticas (COP27) prossegue em Sharm el-Sheikh, no Egito. As notícias vão chegando pela imprensa, normalmente associadas à participação dos principais líderes políticos, mas a expectativa nas suas deliberações é muito modesta; parece improvável que desta COP resulte um roteiro político credível com vista à eliminação dos combustíveis fósseis.
São esperadas mais de 40.000 pessoas, originárias de 196 países, e prevê-se a presença de cerca de cem chefes de Estado e de Governo, numa cimeira muito condicionada pela guerra na Ucrânia e pelos seus impactos no sector energético e na economia mundial em geral, mas que poderá ser igualmente influenciada pelo otimismo de um Brasil que ressurge comprometido com a agenda ambiental internacional, em especial com a defesa da floresta amazónica.
Em qualquer caso, antecipa-se uma cimeira mais discreta do que a de Glasgow (2021), onde ainda foi possível um vago acordo internacional para manter o aquecimento do planeta abaixo de 1,5 oC – sendo que as temperaturas já subiram pelo menos 1,1 oC desde o período pré-industrial e as emissões de carbono continuam a aumentar.
Havia esperança de que a pandemia tivesse contribuído para afastar definitivamente as economias mundiais da dependência de combustíveis fósseis, quando os bloqueios reduziam o consumo de energia e as lideranças mais progressistas propunham agendas alternativas, mas bastou a abertura de fronteiras para que regressassem em força. De tal modo que, segundo a Agência Internacional de Energia, o rendimento dos produtores de petróleo e gás duplicará em 2022.
Com crescente perplexidade assistimos ao fracasso de uma sociedade tecnologicamente avançada, que é capaz de reunir competências para responder aos desafios mais complexos, mas não se capacita para enfrentar o maior de todos os desafios: a salvaguarda do planeta e dos sistemas que suportam a vida tal como a conhecemos.
Os cenários climáticos traçados pela ciência são inequívocos, sendo que as evidências superam as piores previsões: as catástrofes estão a acontecer mais rapidamente e com maior intensidade. O aquecimento do planeta mantém-se alinhado com as projeções, mas os seus efeitos têm sido surpreendentemente extremos.
Apesar do compromisso conseguido nas recentes cimeiras do IPCC [Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas], em que os países acordaram em cumprir o limite de 1,5 oC, este limiar poderá ser ultrapassado numa década, provocando piores secas e ondas de calor, inundações e maior gravidade nos padrões de doença. Antes de Glasgow, anunciava-se que a COP26 seria a última oportunidade do mundo para limitar o aquecimento global a 1,5 oC ainda neste século. No entanto, no relatório anual do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, publicado no final de Outubro (Emissions Gap Report), confirma-se que houve pouquíssimo progresso desde a COP26 para reduzir a imensa lacuna de emissões para 2030, estando o planeta a avançar para um aumento de temperatura na ordem dos 2,8 oC.
Para que o mundo consiga cumprir o limite de 1,5 oC, as emissões globais terão de ser reduzidas em 5% a 7% ao ano. Ora as emissões estão a aumentar entre 1% e 2% ao ano, não havendo sinais de diminuição. Estabelecer orientações para a redução de carbono, assinalando reformas políticas radicais, deveria ser uma prioridade da COP27, mas é provável que o debate seja dominado pela problemática das compensações: os países mais pobres exigem que os países mais ricos, historicamente responsáveis pela maior fatia das emissões, paguem pelos prejuízos climáticos. A mobilização financeira necessária para os países emergentes e em desenvolvimento, para além da China, é muito elevada. E não se trata apenas dos 100 mil milhões de dólares por ano que os países de maior rendimento prometeram e até agora não cumpriram! Trata-se de um investimento muito maior, mas inteiramente comportável pelas grandes economias do mundo, e deve ter uma orientação clara: reduzir as emissões de carbono, eliminar progressivamente os combustíveis fósseis, e restaurar os ecossistemas terrestres e marinhos, apoiando ações que contribuam tanto para a redução das emissões de gases com efeito de estufa como para a adaptação ao aquecimento global, como a implementação de medidas que se baseiam na capacidade natural dos ecossistemas para reduzir o risco climático.
A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico