Reportagem
O jornal escolar Comunica tem como principal objectivo “dar voz a todos”
O anfitrião da terceira edição do Encontro Nacional de Jornalistas teve mais de 400 publicações no seu primeiro ano de vida. Agora, tem quase 3000 e tem como lema que “tudo pode ser notícia”.
Microfones e auscultadores, computadores, câmaras, luzes e tecidos pendurados pela parede – o pequeno estúdio de multimédia da Escola Básica do Freixo, em Ponte de Lima, é o palco principal do jornal escolar Comunica. O anfitrião da mais recente edição do Encontro Nacional de Jornalistas já tem quase 3000 artigos publicados e, nos seus quatro anos de existência, já soma dois prémios.
Quando o jornal foi concretizado, em Outubro de 2019, António José Paiva, professor de Português e coordenador do jornal, não tinha uma linha editorial. Para este professor, fazia mais sentido fazer um jornal “mais diverso”, onde não existissem limitações em relação aos formatos e aos temas que poderiam abordar.
No entanto, o Comunica obteve, inesperadamente, um novo objectivo quando, poucos meses após a sua criação, as escolas fecharam sem uma data de previsão de retorno às aulas presenciais devido à pandemia de covid-19. “Sentimos que havia uma certa desorientação, os miúdos sentiam-se baralhados com tudo, e achámos que o jornal poderia funcionar como uma forma de juntar toda a gente, para transmitir alguma tranquilidade”, comenta o professor. “Seria um local em que as pessoas poderiam continuar unidas”.
E funcionou – o professor recebeu centenas de trabalhos durante o mês de Abril de 2020, desde reportagens escritas, em vídeo ou apenas com áudio, até trabalhos de música e bandas desenhadas.
O lema do jornal é que “tudo pode ser notícia”, e isto verifica-se ao abrir a página principal: vemos uma reportagem sobre os tapetes coloridos de Páscoa montados na escola, uma receita em vídeo de pão de linhaça e a meteorologia para a região do Minho.
Neste momento, o Comunica realiza um telejornal semanalmente, dividido em duas partes, no qual os participantes vão mudando de acordo com a edição. A primeira parte remete para notícias sobre a escola e os seus eventos, e a segunda, sobre o país e o mundo. Em vídeo, fazem também o 1 Minuto, onde os alunos contam histórias e falam sobre as suas experiências ou dão uma pequena notícia.
Começaram também a fazer podcasts, como o Freixo TeenTalks, onde comentam temas associados à adolescência e à literacia e segurança online, e uma rubrica onde gravam alunos a ler poemas e textos. Qualquer um dos alunos pode participar nestes podcasts ou enviar notícias escritas, sendo apenas necessário contactar o jornal através de e-mail.
José Paiva sublinha que o jornal tem, também, como objectivo “dar voz a toda a gente”, independentemente dos seus interesses ou da sua experiência.
“Temos miúdos com muita dificuldade em se expor por várias razões: não gostam da sua imagem, têm dificuldades em falar ou na escrita. Por isso, passar daquela porta para aqui, para um sítio cheio de holofotes e de luzes, onde são o centro da atenção, é uma barreira intransponível”, afirma Paiva. “Eu nunca passaria aquela porta, só sendo puxado.”
Por esta razão, o professor desenhou rubricas próprias para os alunos que queriam participar no jornal, mas não se sentiam à vontade à frente dos holofotes. “Se não gostares de dar a cara, dás a voz; se não gostas de dar a voz, escreves”, explica.
Íris Oliveira, de 11 anos, assinala que o Comunica foi um aspecto muito importante para melhorar não só academicamente como socialmente. “Mesmo nas apresentações já estou mais à vontade em falar e expresso-me muito bem.”
Já Tomás, de 14 anos, diz que, após achar o jornal uma “boa ideia” e começar a escrever e a editar regularmente, notou que a sua escrita melhorou. Está encarregado do design gráfico do jornal e com a sua experiência e com o apoio fornecido pelo coordenador, até já começou a dar pequenas aulas de design a alguns colegas.
António José Paiva destaca que o mais importante é dar voz a estes estudantes. “Eles estão aqui no meio de 600 alunos e são 'mais um'. Nós gostamos de pegar no 'mais um' e fazer dele uma pessoa especial. Aquela pessoa a que damos voz, não sabemos se ela é aluna de 5 ou se tem muitos amigos; para nós, é apenas aquela pessoa que se senta aqui e que nós ouvimos.”