Portugal inventou a imigração, a navegação e o fado

Os indianos, nepaleses, paquistaneses, bangladeshianos, africanos e brasileiros, da mesma forma, devem ser integrados e respeitados pela comunidade portuguesa e lusófona.

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A operação policial desta semana na Rua do Benformoso, na região central de Lisboa, orquestrada pelo Governo, levou dezenas de jovens policiais portugueses, sem saber, a depor contra a própria história. Jovens que, ao colocar dezenas de imigrantes contra parede, estavam a colocar contra a parede a história de seu povo.

A história de um povo que tem em sua gênese a emigração. Um povo que, para fugir da fome e da pobreza e para encontrar diásporas onde pudesse com suas famílias viver com mais dignidade, buscou, por meio da navegação, um fado para cantar de olhos e pulsos abertos.

O belíssimo livro A invenção de Goa, da historiadora Ângela Barreto Xavier, que trata da chegada dos portugueses em Goa, da conversão cultural e religiosa e outras questões, deveria estar em frases garrafais espalhadas pelos quatro cantos de Portugal, no lugar dos outdoors de propaganda política.

Portugal é o país europeu que, proporcionalmente, tem o maior número de emigrantes, e o oitavo em todo o mundo. Nos últimos 20 anos, mais de 1,5 milhão de cidadãos portugueses emigraram.

Existem hoje mais de 2 milhões de portugueses espalhados pelos vários continentes do planeta, sem contabilizarmos seus descendentes, que, somados, certamente seriam 10 vezes a população de Portugal.

Vale sempre lembrar que os portugueses na França, que para lá emigraram na década de 60 para viver nos subúrbios de Paris em acampamentos como Bidonville, são hoje chamados pelos franceses de franceses e, pelos portugueses que cá ficaram, de “Avec".

Vale lembrar que os portugueses que regressaram para Portugal da África, em 1974, eram integrados à sociedade africana, vivendo em comunidade com os africanos e, em território luso, até hoje, são chamados pejorativamente de “retornados".

Os indianos, nepaleses, paquistaneses, bangladeshianos, africanos e brasileiros, da mesma forma, devem ser integrados e respeitados na nossa sociedade, recebidos e integrados pela comunidade portuguesa e lusófona que vive em Portugal. São eles que trazem, pelo Glovo, a nossa pizza, o frango com caril, a bifana ou a feijoada.

Vale lembrar que parte deles trabalha para nós como motorista de aplicativos. Vale lembrar que os filhos deles andam na escola com nossos filhos e, certamente, não deve ser muito agradável imaginar que o pai de um coleguinha de nossos filhos tenha colocado o pai de um outro imigrante encostado à parede na rua por horas e, no dia seguinte, comparece à festa de Natal dos miúdos da escola de mãos dadas.

Reforçamos nossa cultura ao respeitar e assimilar a cultura do outro.

Sou Pierre Aderne, nascido em Toulouse, França, filho de pai português emigrante e mãe brasileira.

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