Investigação científica de translação em Portugal: uma aposta necessária

Deparamo-nos com um problema de acesso a financiamento interno (e público), que torna mais difícil fazermos investigação fora das áreas de investimento tradicionais.

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A investigação científica utiliza recursos associados a custos elevados e implica investimentos mais ou menos avultados. Neste caso, a palavra certa é “investimento”. Globalmente, os ganhos da investigação científica, nomeadamente na área da saúde, têm um ganho inquestionável, e no final contribuem de forma fundamental para o aumento da quantidade e qualidade de vida dos doentes.

É, por isso, muito importante o investimento em investigação científica na saúde, sendo ainda mais importante para um país, médio no espaço europeu, em que os recursos disponíveis são escassos e a produção de riqueza é alavancada, ainda de forma substancial, em indústrias de baixo valor acrescentado. O investimento em investigação científica na saúde tem um efeito multiplicador na economia que urge aproveitar, enquanto reconhecemos que enfrentamos um grave problema de subfinanciamento da investigação científica em Portugal.

Temos grupos de investigação e investigadores de grande qualidade, capazes de tornar o país numa referência na investigação em várias áreas. No entanto, deparamo-nos com um problema de acesso a financiamento interno (e público), que torna mais difícil fazermos investigação fora das áreas de investimento tradicionais (nomeadamente as que decorrem da investigação clínica levada a cabo pela indústria farmacêutica, também ela essencial ao desenvolvimento do tecido de investigação nacional de qualquer país).

É, assim, imperativo aumentar o financiamento à investigação científica e é preciso reforçar as condições dadas a quem trabalha em investigação, o que pode ser feito de diversas formas, sendo uma delas através de prémios e iniciativas de empresas, organizações e instituições, como é disso exemplo o Prémio FAZ Ciência, da Fundação AstraZeneca.

Um prémio (e um financiamento) que, com a minha equipa, tivemos o privilégio de ganhar com o projeto de investigação “Uncovering the immune and stromal microenvironment of TP53-mutated acute myeloid leukemia”, que vai ser desenvolvido no i3S – Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto, em colaboração com o Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto.

Todos os anos, a leucemia mieloide aguda afeta 15 adultos em cada 100 mil pessoas. Esta é uma doença agressiva do sangue, que continua a ter uma sobrevivência global baixa, e que consiste numa transformação maligna dos glóbulos brancos, de rápida proliferação. O foco deste estudo será um subtipo desta doença com a mutação TP53, uma alteração genética que se associa a um tipo de leucemia mieloide aguda com risco adverso e elevado.

Neste estudo, iremos estudar o microambiente, ou seja, as células que rodeiam as células malignas e que as ajudam a expandirem-se e a sobreviverem aos tratamentos. O microambiente da leucemia mieloide aguda com a mutação TP53 (os doentes com esta mutação respondem muito mal aos tratamentos existentes) está muito pouco estudado. Para isso, vamos utilizar modelos animais, que têm uma doença que replica a doença humana, o que permite visualizar e estudar em detalhe as células do microambiente que estão em contacto com as células de leucemia com a referida mutação.

Assim, pretendemos compreender os mecanismos subjacentes a este tipo de leucemia, bem como a sua origem, as alterações e a causa de resistência ao tratamento, informação que nos vai permitir identificar novos alvos terapêuticos para este subtipo particular.

Concluo como comecei, é a investigação que permite que a ciência possa continuar a evoluir e a trazer novas descobertas com vasto potencial na área da saúde, contribuindo para melhorar a qualidade de vida dos doentes e a salvar vidas. Mais do que nunca, a aposta na investigação é fundamental para que se possam abrir novos caminhos para desvendar a complexidade de tantas doenças.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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