Na Bola de Ouro falou-se de classe: Rodri mostrou muita, o Real Madrid nem por isso

Médio do Manchester City ergueu o troféu, numa cerimónia boicotada pelo Real Madrid, insatisfeito com o desfecho da votação.

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Rodri, jogador do Manchester City ADAM VAUGHAN / EPA
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“O Real Madrid manda nisto tudo”. “A Liga dos Campeões define a Bola de Ouro”. “Um jogador defensivo dificilmente ganha o prémio”. Estas são três premissas banais sobre a Bola de Ouro, galardão que premeia o melhor jogador do mundo. Nesta segunda-feira, todas foram abatidas.

Rodri, médio espanhol do Manchester City, recebeu o prémio atribuído pela France Football, numa votação de jornalistas dos 100 primeiros países do ranking FIFA. Rodri não é do Real Madrid. Rodri não foi importante na Champions. Rodri é um jogador defensivo. E Rodri foi considerado, apesar de tudo isto, o melhor jogador do mundo na temporada 2023/24.

Antes de irmos aos critérios que justificarão esta distinção há algo claro que sai desta gala: é que, no Théâtre du Châtelet, em Paris, se falou de classe.

Classe, porque é isso que define Rodri, jogador elegante, calmo, eficaz, discreto e globalmente correcto. E classe, porque a falta dela define também a postura de Vinícius e do Real Madrid.

Nesta segunda-feira, tendo sabido por meios não oficiais que o prémio não seria do amplamente favorito Vini, o clube espanhol decidiu cancelar a viagem a Paris, provavelmente com o orgulho e o sorriso pérfido de quem monopolizou uma tarde que seria de festa pelos que lá foram ganhar, mas passou a ser de conversa sobre os que não quiseram lá ir perder.

A comitiva de 50 pessoas ficou em Madrid, entre as quais Vini, o favorito ao triunfo na Bola de Ouro, Bellingham, outro possível candidato, Carvajal, uma escolha mais “fora da caixa”, e outros possíveis premiados em galardões secundários, como Lunin, Arda Guler e Carlo Ancelotti.

Real faltou

Estas pessoas guardaram os smokings e vestiram os pijamas para assistirem à gala no sofá. Numa demonstração de tudo o que não deve ser o futebol, mostraram que os exemplos passados de jogadores como Cristiano Ronaldo, o precursor, e Lionel Messi, um fiel imitador, banalizaram este tipo de atitudes.

Até ao ano passado, tornou-se aceitável um jogador faltar deliberadamente a uma gala na qual sabia que não iria vencer o prémio, atitude que mais não era do que o pináculo da vaidade e da falta de desportivismo, pela incapacidade de assistir à glória alheia.

Em 2024, subiu-se um patamar. Já não foi um jogador de ego ferido a decidir ficar no sofá, mas um clube, por inteiro, a aplicar a receita ditatorial de impedir jogadores, staff e dirigentes de irem à gala.

Segundo a imprensa espanhola, o clube crê que a Bola de Ouro perdeu o seu valor. “Trocado por miúdos”, o que o Real Madrid parece pensar é que prémios atribuídos aos seus jogadores são justos e prémios aos demais não são. E que o maior clube do mundo só comparece nas galas se os seus atletas forem amplamente glorificados. E o clube decidiu ainda cancelar a emissão especial da Real Madrid TV sobre a Bola de Ouro.

Rodri contra Vinícius

Apesar da ira do Real, Rodri está longe de ser um vencedor inexplicável, já que há bons argumentos para defender o prémio a Vinícius, mas também os há para suportar o triunfo do espanhol.

Esta distinção significa, entre outras coisas, que os votantes deram mais peso ao Europeu de selecções do que à Liga dos Campeões – Rodri foi campeão europeu pela Espanha, Vini pelo Real Madrid. Individualmente, Rodri foi o melhor jogador do Europeu e Vinicíus foi decisivo na Champions, até com um golo na final.

A nível interno ambos venceram os campeonatos em Inglaterra e Espanha, ainda que Rodri possa adicionar provas menores como o Mundial de Clubes e a Supertaça europeia.

Perante o equilíbrio global, a tendência de voto pode ter sido desequilibrada por factores habitualmente desconsiderados. Por um lado, Rodri é indispensável na sua equipa – patente nas derrotas do City quando o espanhol não jogou –, mesmo que sem o fogo-de-artifício de quem dribla, marca e aplica magia. Por outro, Vinícius é o rosto da espectacularidade, do golo e da criatividade, factores tradicionalmente mais valorizados nestes prémios.

Outro prisma interessante é o peso do critério do fair-play, que a France Football definiu como o terceiro, depois dos desempenhos individual e colectivo.

É impossível dizer que peso terá tido, mas é fácil adivinhar que quem o teve em conta para efeitos de decisão terá pendido para Rodri, em detrimento de um avançado cujo perfil brigão e provocador não constitui um exemplo de desportivismo.

No fundo, Vinícius poderá ter sido vítima de si próprio, ainda que deva ser tido em conta que o espectro de racismo no qual o brasileiro teve de caminhar frequentemente, em vários estádios, não é uma preocupação para homens brancos como Rodri.

Bonmatí, outra vez

No sector feminino, a France Football premiou Aitana Bonmatí, que repete o prémio de 2023. A jogadora do Barcelona mantém o domínio espanhol nos últimos anos, já que antes dela tinha sido Alexia Putellas a vencer duas vezes o galardão.

Bonmatí confirmou o favoritismo, já que o título de campeã da Europa, com golos em todas as partidas a eliminar, não deixava grande margem para dúvidas.

Aos 26 anos, Bonmatí já tem um palmarés bem recheado a nível individual, algo alavancado por constantes títulos colectivos pelo Barcelona.

Caroline Hansen, também do Barcelona, era outra boa candidata, pelos golos na Champions e na Liga espanhola, mas a ausência nos Jogos Olímpicos poderá ter pesado.

Nos restantes prémios, houve distinções para Carlo Ancelotti, o melhor treinador, Lamine Yamal, o melhor sub-21, Emiliano Martínez, o melhor guarda-redes, o Real Madrid, a melhor equipa masculina, e o Barcelona, a melhor equipa feminina.

Nota ainda para o prémio atribuído a Jenni Hermoso, o troféu Sócrates, que distingue um futebolista que se tenha destacado pelo seu empenho na sociedade e na promoção de um mundo mais equitativo e inclusivo.

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