Há vários anos que polícias aguardam por bodycams
Concurso para aquisição de Plataforma Unificada de Segurança dos Sistemas de Videovigilância já foi impugnado duas vezes. Polícias já deviam ter, por esta altura, cinco mil câmaras ao seu serviço.
Há vários anos que as forças de segurança, nomeadamente a PSP e a GNR, aguardam por poder dispor de câmaras portáteis de uso individual (bodycams), que poderiam, por exemplo, ajudar a esclarecer o que é que aconteceu, no domingo, na Cova da Moura, na Amadora, e que levou um agente da PSP a disparar contra Odair Moniz, que acabou por falecer mo Hospital São Francisco Xavier.
No entanto, desde 2017, que tanto a GNR como a PSP, têm 257 bodycams a ganhar pó. Os aparelhos foram uma oferta da empresa Antero Lopes, no âmbito de uma campanha promocional.
Há várias razões para que estas câmaras não estejam ainda a ser utilizadas. Primeiro, porque era preciso legislação específica para que os polícias as pudessem usar. Falava-se que, em 2018, o Governo iria legislar nesse sentido. Facto é que o Governo demorou a fazer a regulamentação sobre o uso destas minicâmaras de vídeo nas fardas dos agentes e, depois, foi a Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) que colocou uma série de entraves que obrigaram a alterações na referida regulamentação, que só veio a ser publicada no início de 2023.
Depois, começou uma guerra entre um fornecedor e o Ministério da Administração Interna (MAI) que se arrasta ainda hoje nos tribunais. O MAI entendeu que, antes de adquirir as ditas câmaras, devia lançar primeiro um concurso público para a aquisição de uma Plataforma Unificada de Segurança dos Sistemas de Videovigilância, isto é, o concurso para a plataforma das bodycams das polícias que permita armazenar as imagens.
A Antero Lopes, representante da marca Axon em Portugal, que ofereceu as bodycams às polícias em 2017, já impugnou o concurso duas vezes. Na última, o tribunal até deu razão ao MAI. A sentença é de 22 de Julho e determinou que não havia “ilegalidades nas especificações técnicas constantes das peças do procedimento”, ao contrário do que tinha alegado a empresa.
A impugnação não tinha efeito suspensivo, mas o MAI decidiu parar com o processo concursal, uma vez que uma eventual decisão do tribunal podia afectar os resultados. Como a empresa Antero Lopes não desistiu, e já apresentou recurso da decisão, o processo vai continuar parado. E, uma vez que ainda não há plataforma, o MAI também não pode avançar com a aquisição das bodycams que estão há muito prometidas às polícias.
A lei que define o recurso a câmaras portáteis de uso individual pelos agentes policiais foi publicada a 2 de Janeiro de 2023 e, no dia 27 de Abril do mesmo ano, o então secretário-geral do MAI, Marcelo Mendonça de Carvalho, prometeu que os agentes da PSP e os militares da GNR iriam receber as primeiras 2500 câmaras em Novembro e outras 2500 em 2024. Por esta altura, as forças de segurança já deveriam estar equipadas com 5000 bodycams. Segundo o mesmo responsável, estava previsto que o Governo adquirisse 10 mil câmaras destas até 2026.
A Policia Marítima (PM), que está sob a tutela do Ministério da Defesa, é a única força de segurança que já pode usar as bodycams. A autorização foi publicada em Diário da República no dia 16 de Outubro. Esta polícia tem 112 equipamentos que tiveram de ser reconfigurados para cumprirem as recomendações do parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) que alertava para o facto de terem de ser cumpridas determinadas restrições legislativas.
A legislação para a utilização das bodycams em Portugal é bastante restrita e tem várias regras – por exemplo, antes de activar a câmara, o agente deve, sempre que possível, avisar as pessoas presentes de que a gravação está a ser iniciada. As bodycams são activadas manualmente e devem ser utilizadas apenas durante o tempo necessário para documentar uma ocorrência específica. A lei determina que as forças de segurança só podem utilizar câmaras portáteis de uso individual “para efeitos de captação e gravação de imagens e som, no decurso das intervenções policiais, sempre que exista interacção directa dos elementos policiais com terceiros e quando estejam em curso práticas que possam consubstanciar a ocorrência de um ilícito criminal ou em situações de perigo ou emergência”.