Centros educativos fecharam vagas por não terem profissionais de reinserção social

A comissão independente que fiscaliza os centros educativos apontou como muito grave a espera de 22 jovens por uma vaga, depois de decretada a medida de internamento pelo tribunal.

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Centro Educativo Navarro Paiva em Lisboa é um dos seis no continente. Não há centros educativos nas ilhas Paulo Pimenta (arquivo)
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"Foi uma situação de crise pela qual o sistema passou". É assim que a directora da Justiça Juvenil da Direcção-Geral da Reinserção Social e Serviços Prisionais, Margarida Macedo, reage ao relatório de 2024 da Comissão de Acompanhamento e Fiscalização dos Centros Educativos, que apontara o facto de 22 jovens terem tido de esperar por uma vaga num centro educativo. Apesar de não entender que a Direcção-Geral da Reinserção Social e Serviços Prisionais tenha sido particularmente visada ou alvo de críticas naquele relatório, aquela responsável dispõe-se a esclarecer a sua posição, numa reacção ao que, no sábado, foi divulgado pelo PÚBLICO sobre o fecho de unidades residenciais em centro educativo.

Em resultado desse encerramento, explicava o relatório daquela comissão independente entregue no Parlamento, os referidos 22 jovens ficaram à espera de uma vaga num dos seis centros existentes no país, para cumprir a medida de internamento que lhes fora decretada pelos tribunais, tendo essa lista máxima de espera sido atingida em Julho de 2024.

Isto aconteceu porque em 2023 foram encerradas três unidade residenciais: uma no Navarro Paiva (Lisboa) com 12 vagas, outra na Bela Vista (Lisboa) com igual número, outra no Padre António Oliveira (Caxias, Lisboa) com seis, num total de 30. A lotação total passou então de 164 para 134, o mínimo permitido pela lei tutelar educativa, segundo a qual uma medida tutelar educativa é aplicada a quem comete um facto qualificado como crime quando tem entre 12 e 16 anos, sendo a medida de internamento a de último recurso.

Em Agosto, após concurso para o recrutamento, técnicos profissionais de reinserção social, sem os quais as unidades não podiam funcionar, diz Margarida Macedo, 24 das 30 vagas foram repostas, como aliás salienta o relatório. Antes disso, o tempo de espera máximo foi de quatro meses.

O documento lembra que o plano educativo da medida e os métodos pedagógicos a ela inerentes são fulcrais para “a interiorização de valores conformes ao direito" para os jovens serem "juridicamente responsáveis” no futuro. Retirar-lhes essa oportunidade no tempo certo "constitui uma flagrante violação do direito fundamental" destes jovens.

“Não vejo uma crítica, mas a constatação de uma situação de crise pelo qual o sistema passou e que a da Comissão de Acompanhamento e Fiscalização dos Centros Educativos, detectou, e bem. E reportou”, diz Margarida Macedo. Tanto mais, diz a psicóloga, que a abertura de concursos para recrutamento de novos profissionais não depende da DGRSP, sob tutela do Ministério da Justiça. A abertura de um concurso "envolve muitos trâmites até que venha a autorização", diz. "Para além de ter de ir ao Ministério da Justiça, tudo tem de ir ao Ministério das Finanças", lembra.

Mais tempo entre acto cometido e medida

Questionada sobre se o facto de os jovens com medidas de internamento, as mais gravosas previstas na lei, não estarem a cumprir as medidas, constituiu um perigo para a comunidade ou para eles próprios, Margarida Macedo explica que, com o fecho de vagas, o que aconteceu foi que "o tempo que mediou entre o cometimento do facto [delituoso] e a execução da medida de internamento aumentou".

“Desde o cometimento desse comportamento ofensivo até à entrada em centro educativo acontecem várias coisas: a sinalização aos tribunais, a fase de investigação e de avaliação, as audiências de julgamento e só depois o pedido de internamento”, expõe a directora da Justiça Juvenil, ressalvando que os casos muito graves, para os quais os tribunais pediram medidas cautelares de guarda (o equivalente a uma prisão preventiva a partir dos 16 anos) “foram imediatamente internados”.

E o facto de estes casos muito graves não poderem ficar na comunidade à espera originou a sobrelotação dos centros educativos num determinado período de tempo, de resto também apontada no relatório desta comissão independente. “Perante esses casos gravíssimos, naturalmente, abriram-se sempre as portas”, clarifica.

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