Quase 80% das 67 sentenças dos tribunais do trabalho não reconheceram vínculo a estafetas

Autoridade para as Condições de Trabalho deu conta de 67 decisões de primeira instância: 53 foram favoráveis às plataformas e apenas 14 reconheceram o vínculo dos estafetas.

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Dirigente da Autoridade para as Condicoes do Trabalho, Maria Fernanda Campos Rui Gaudêncio
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Das 67 sentenças relacionadas com o trabalho em plataformas digitais conhecidas até agora, cerca de 80% foram favoráveis às empresas e só 20% deram como provados os indícios da existência de contrato de trabalho. Os dados foram divulgados nesta terça-feira pela inspectora-geral do trabalho, Maria Fernanda Campos, durante uma audição na Comissão Parlamentar do Trabalho e da Segurança Social a propósito da norma que estabelece os indícios de existência de vínculo laboral no sector das plataformas, em vigor desde Maio de 2023.

Olhando para as decisões de primeira instância já conhecidas, adiantou a responsável, 53 sentenças deram razão às plataformas e acabaram por não reconhecer a existência de contrato de trabalho a 66 estafetas. Apenas 14 foram favoráveis aos trabalhadores, abrindo a porta à regularização de 29 pessoas.

Mas se nos tribunais do trabalho as decisões pendem mais para o lado das empresas, nos tribunais superiores não tem sido assim. Dos quatro casos já apreciados pelos Tribunais da Relação (dois de Évora e outros dois de Guimarães) três confirmaram a tese do Ministério Público e deram como provados os indícios de laboralidade. Só um foi favorável à empresa de entregas, mas neste caso estavam envolvidos 27 estafetas que viram a possibilidade de terem um contrato de trabalho com a Glovo.

Maria Fernanda Campos adiantou que entre Junho e Dezembro do ano passado, a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) centrou a sua actividade no sector das plataformas.

Nas acções de fiscalização desenvolvidas, os inspectores identificaram 2798 trabalhadores (271 eram trabalhadores com contrato sem termo, mais de 1000 eram verdadeiros trabalhadores independentes, 200 não estavam declarados e cerca de 1300 levantavam dúvidas quanto à natureza do seu vínculo).

Foram também sinalizadas 139 entidades: 16 plataformas, 50 intermediários e 70 angariadores, acrescentou a inspectora-geral.

Das centenas de participações enviadas pela ACT ao Ministério Público – a quem cabe desencadear a acção de reconhecimento de contrato –, 68 não tiveram seguimento porque foi entendido que os requisitos não estavam preenchidos.

A inspectora-geral foi questionada pelos deputados sobre as principais dificuldades na aplicação do artigo 12.º-A, com José Soeiro, do Bloco de Esquerda, a procurar saber as dificuldades de produção de prova que os inspectores enfrentaram e a forma como as plataformas se adaptaram à lei.

Quanto às dificuldades, Maria Fernanda Campos destacou a “surpresa” das plataformas quanto às acções da ACT e as barreiras linguísticas, uma vez que uma parte significativa dos estafetas identificados eram de países terceiros, evitando tecer comentários apreciativos sobre as plataformas.

A Lei 13/2023 obrigava a ACT a desenvolver, no primeiro ano de vigência, uma campanha extraordinária de fiscalização do sector das plataformas e a enviar um relatório à Assembleia da República.

Contudo, na audição pedida pelo Bloco de Esquerda e que foi aprovada pelos restantes grupos parlamentares, Maria Fernanda Campos não apresentou ainda o documento, argumentando que ainda não está concluído.

Ao longo do debate ficou clara a linha que divide o PSD dos partidos da esquerda. Ana Santos, deputada social-democrata, considerou que a aprovação do artigo 12.º- A destinada a avaliar os indícios de laboralidade no sector das plataformas foi “uma precipitação socialista que nada resolveu”.

A norma, acrescentou, é “complexa e confusa na sua aplicabilidade”, assumindo a necessidade de voltar a analisar o assunto, tal como o Governo já tinha dito.

Já Paula Bernardo, deputada do PS, concluiu que “os progressos da agenda social iriam ser postos em causa” pelo executivo liderado por Luís Montenegro. José Soeiro, do Bloco, também defendeu o avanço conseguido com a aprovação do artigo 12.º- A.

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