A pobreza e a multiculturalidade são fatores de preocupação
A pobreza e a diversidade cultural juntas são devastadoras para os próprios e para as comunidades em que se inserem, como são as comunidades escolares.
No Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza, 17 de outubro, dados da Pordata dizem-nos que em Portugal os pobres estão mais pobres e que esta situação se adensou nas famílias com crianças e jovens dependentes. A juntar a esta situação, temos os migrantes que aumentaram significativamente, nos últimos anos. Dados da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência refere que de 2018/2019 para 2023/2024 o número de alunos estrangeiros passou de 53 mil para 140 mil.
Estes dois fatores em simultâneo entregam às escolas preocupantes situações com que têm de lidar todos os dias. Se, por um lado, o acesso à escola das crianças e jovens migrantes é já um desafio, pela língua, que muitos não conhecem, pelas disparidades do currículo de origem em relação ao nosso, pela falta de sentido de pertença, pela dificuldade de inclusão das famílias destes alunos; por outro lado, a falta de recursos económicos destas famílias migrantes e das muitas outras, portuguesas, que já estão nas escolas faz com que a disponibilidade para que se cumpra o objetivo primeiro da escola não exista, e que é, como sabemos, a aprendizagem.
A verdade é não há professor que ensine quem não quer aprender, como diz António Nóvoa, mas aqui nem se trata de não querer, é que não é o mais importante para quem se está a tentar integrar, com poucos ou nenhuns recursos económicos, em processo de inclusão, em comunidades escolares e educativas com também muitas dificuldades financeiras.
Esta mistura devastadora, de pobreza e não inclusão, que em algumas situações se prolonga no tempo, de escola em escola, origina insucesso e uma visão de pouca utilidade da escola. Já diz o ditado que “casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão”, e sabemos que assim é.
Este ambiente instável que a pobreza instiga é transportado para a escola através dos alunos que expressam graves carências não só económicas, mas também sociais, com necessidades básicas por suprir e que em casa o ambiente não é propício ao estudo. Estes alunos têm pouco espaço para pensar nos outros, concretamente nos seus colegas migrantes que acabaram de chegar, também eles fragilizados economicamente e com uma presença ausente de laços emocionais e relacionais e de qualquer denominador comum que promova a proximidade.
Este é o dia-a-dia de muitas escolas em Portugal. E estando a olhar para esta paisagem do ponto de vista dos alunos, certamente que fica muito por dizer. Falta olhar de muitas outras perspetivas de que a escola é feita, ou seja, do ponto de vista dos professores, dos assistentes operacionais, das famílias, das direções das escolas.
Dos professores, que habitualmente e de uma maneira geral existe vontade e preocupação em integrar, acolher e incluir todos, é uma constatação. Mas as dificuldades são imensas e por vezes inultrapassáveis, fazendo com que à falta de recursos e pouca integração — devido, logo em primeira mão, à dificuldade de comunicação, por desconhecimento da língua —, não seja possível ensinar o mínimo, quanto mais ser exigente nos detalhes e promover, a tal palavrinha que causa arrepios, a excelência.
A pobreza e a multiculturalidade são, cada um por si, fatores de preocupação. A interculturalidade só acontecerá quando existir disponibilidade emocional e financeira para isso. A pobreza e a diversidade cultural juntas são devastadoras para os próprios e para as comunidades em que se inserem, como são as comunidades escolares. Apesar deste panorama que parece colocar as escolas de mãos atadas, o pouco que lá se vai fazendo é imenso neste mar de dificuldades, incertezas e desilusão. Onde é que isto vai parar?