Rede de teatros europeus diz que avanço de extrema-direita ameaça liberdade de criação

Presidente da European Theatre Convention, Cláudia Belchior, aponta casos em países como Itália, Polónia, Eslováquia, Áustria e Alemanha, que vão de despedimentos a repertório eliminado.

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Eleição de Cláudia Belchior decorreu durante a Conferência Internacional da European Theatre Convention em Timisoara, na Roménia Adrian Piclisan/Cortesia CCB
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A líder da maior rede de teatros com financiamento público da Europa, a portuguesa Cláudia Belchior, denunciou à Lusa despedimentos de artistas devido à chegada ao poder da extrema-direita, que descreveu como uma ameaça à liberdade de criação. Belchior falou à Lusa em Hong Kong, onde está a participar na Hong Kong Performing Arts Expo, uma conferência de profissionais das artes de palco que termina esta sexta-feira.

A presidente da European Theatre Convention (ETC), que reúne 63 teatros de 31 países, incluindo quatro de Portugal, disse que o problema foi sentido em Itália, Polónia, Eslováquia, Áustria e “está a começar a crescer na Alemanha”.

A 1 de Setembro, a Turíngia, no leste do país, tornou-se o primeiro estado federal onde o Alternativa para a Alemanha (Alternative für Deutschland – AfD), partido de extrema-direita, é a principal força parlamentar. Pouco depois, a 30 de Setembro, a Áustria tornou-se o primeiro país europeu em que um partido de extrema-direita – o Partido da Liberdade (Freiheitliche Partei Österreichs, FPÖ), fundado por antigos nazis – foi o mais votado numa eleição nacional desde a Segunda Guerra Mundial, vitória que ainda assim não garante a entrada do partido no próximo Governo.

As autoridades nacionais e regionais das “direitas radicais têm tido uma atitude muito gravosa” nos teatros, galerias de arte e museus públicos europeus, disse Cláudia Belchior. “Temos um número significativo de associados que estão a ser despedidos, simplesmente porque não têm a linguagem nacionalista que neste momento lhes interessa”, lamentou a também assessora artística da Fundação Centro Cultural de Belém.

“Há teatros em que, pura e simplesmente, o repertório foi eliminado para passar a haver um repertório com uma linguagem nacionalista, única, e isso é muito perigoso para as nossas democracias”, alertou. A dirigente sublinhou que, em vez de simplesmente encerrar instituições culturais, a extrema-direita tem preferido “retirar pessoas, quase à pinça, do seu local de trabalho para serem substituídas por outras que têm uma agenda de propaganda cultural”.

Estas acções acontecem porque estes movimentos “percebem que a cultura é super-importante”, afirma Belchior, que defendeu que o fenómeno coloca em risco a liberdade de expressão e de criação artística na Europa. A responsável adiantou ainda que a ETC, fundada em 1988, já transmitiu as suas preocupações à Comissão Europeia. “Isto já foi utilizado no passado, não é novidade, mas estamos a chegar a um ponto muito preocupante e andamos muito adormecidos, um bocadinho de olhos fechados."


Cláudia Belchior recordou que, no ano passado, o Governo de Itália, liderado pelo partido de extrema-direita de Giorgia Meloni, anunciou que os directores de museus e outras instituições culturais deveriam ser italianos. “Os nossos colegas italianos, infelizmente muitos deles não falaram, tinham medo. Existe uma cultura de medo: ‘Se eu falar, eu vou para a rua’”, alertou a dirigente.