Jovens preferem progressão na carreira a melhores salários — mas o dinheiro continua a ser o que os faz emigrar

Querem um emprego estável, que aceite teletrabalho e que não prejudique a saúde mental. Ter um bom salário também é importante, mas neste estudo da Católica surge em 6º. lugar na lista de prioridades.

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Jovens preferem progressão de carreira a melhores salários — mas o dinheiro continua a ser o que os faz emigrar Fox/Pexels
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O que preocupa os jovens? Trabalho, habitação e a possibilidade de terem de sair do país para garantir o próprio futuro.

Apesar de estarem há menos tempo no mercado de trabalho, valorizam muito um trabalho estável — e é isto que os move realmente quando se candidatam a um emprego. E, apesar de trabalharem 40 horas por semana, isso não se traduz em poder económico: são muito poucos os jovens até aos 24 anos que conseguem sair de casa dos familiares.

Estas são as principais conclusões do estudo Os Jovens e o Mundo do Trabalho, desenvolvido pela Universidade Católica Portuguesa e que será apresentado no âmbito da conferência “O Futuro do Trabalho: 50 anos depois de Abril”, que decorre na terça-feira, dia 8 de Outubro.

No total, responderam ao inquérito 964 jovens que residem em Portugal e que trabalham, estudam ou não têm ocupação (os chamados “nem-nem”). Destes, 49% eram mulheres.

Em relação ao trabalho, as gerações mais novas querem progressão na carreira, a possibilidade de conciliar vida pessoal com profissional e um trabalho que lhes garanta bem-estar físico e mental — estes são os principais requisitos. Para trás ficam coisas como autonomia, segurança, possibilidade de desempenharem tarefas criativas e, se possível, teletrabalho. Isto é: são importantes, mas não o mais importante.

Ter um salário melhor também tem algum peso num emprego, mas não é a primeira coisa que procuram.

“No geral, o que os jovens procuram num trabalho são coisas que as gerações anteriores já queriam. Mas, hoje em dia, valorizam a possibilidade de progredirem na carreira, mesmo que o salário seja baixo”, destaca em entrevista ao P3 João António, um dos autores do relatório e especialista em sondagens de opinião.

Para 77% dos participantes, o trabalho foi a principal fonte de rendimento do último ano. De entre as faixas etárias ouvidas, a que mais depende da família é a dos 18 aos 24 anos: desses, 53% trabalham, mas 44% dependem de familiares. Metade do total de trabalhadores ouvidos trabalha 40 horas por mês — mas 15% trabalham 50 horas ou mais. E nem todos têm o mesmo salário.

O rendimento líquido mensal de 44% situa-se entre os mil e os 1500 euros. Segue-se o grupo dos que recebem entre 501 e mil euros (30% dos participantes) e os que ganham entre 1501 e 2500 euros (18%). Há até jovens que ganham mais de 3500 euros mensais — contudo, são muito raros. De acordo com um dos gráficos, são apenas 1%. Os que recebem até 500 euros são outra das excepções neste estudo, uma vez que representam 3%.

Sem surpresa, os jovens dos 30 aos 35 anos são os que têm mais independência financeira para sair de casa dos pais e viverem com companheiros (64%) ou até mesmo sozinhos (10%). Entre os inquiridos dos 20 aos 25 anos, 43% vivem com o companheiro e 8% sozinhos. Na faixa dos 18 aos 24, a esmagadora maioria vive com os pais (83%) e só 9% vivem com um companheiro ou, em 3% dos casos, sozinhos.

Ainda assim, e independentemente de viverem com ou sem os pais, dizem sentir-se mais “satisfeitos” com a habitação do que com o trabalho, os rendimentos, o tempo livre e a vida em geral.

Recusam "trabalhos mal pagos"

A realidade portuguesa, sublinha o autor do relatório, mostra uma maior taxa de desemprego entre os jovens. Grande parte dos participantes (43%) acredita que tal acontece porque os mais novos “não querem aceitar trabalhos mal pagos”. Outros partem do pressuposto que as empresas evitam empregar quem acabou de entrar no mercado de trabalho e 11% dizem mesmo que os jovens estão nesta situação porque “não querem trabalhar”.

Num inquérito que a universidade fez em 2015 e que fazia as mesmas perguntas, os inquiridos respondiam que o desemprego jovem estava alto porque Portugal não tinha empregos para os jovens.

“Há quase dez anos, não havia emprego para os jovens. Hoje em dia há, mas é mal pago e, por isso, as pessoas estão disponíveis para emigrar”, aponta João António.

Uma das tabelas do estudo mostra que ter um bom salário ocupa o 6.º lugar na lista de prioridades de quem tenta trabalhar ou encontrar trabalho em Portugal, mas, sem surpresa, é o factor que mais pesa na decisão de emigrar.

A propósito deste tema, 43% dos participantes já trabalharam no estrangeiro e 55% admitem estar dispostos a fazê-lo, principalmente para “ter mais dinheiro disponível”. A vontade de ter um emprego mais estável e interessante, ter acesso a melhores serviços sociais e de saúde e descobrir coisas novas são outros dos motivos apontados pelos jovens.

A realidade dos jovens “nem-nem”

O estudo inclui ainda a realidade dos jovens NEET (“nem-nem”, em português), ou seja, a faixa etária entre os 17 e os 29 anos que não estuda nem trabalha e que, sublinham os autores, foi avaliada com base numa amostra de “apenas 59” pessoas. “Cerca de metade destes trabalhou nos últimos 12 meses e três em cada quatro estão à procura de trabalho”, lê-se no estudo.

O relatório adianta que a percentagem de jovens nesta situação é menor do que as conclusões do relatório do Eurostat sobre o tema: Portugal tem 6% de jovens “nem-nem” e não 8,9%, como apontava o relatório em Junho de 2024, que o P3 noticiou.

Sem rendimentos, a maioria (71%) vive com os pais ou avós e, para os que nunca trabalharam ou não recebem subsídio de desemprego (19%), a principal fonte de rendimento é a família.

Os anúncios de emprego na Internet e redes sociais são a forma que utilizam para encontrar trabalho; seguem-se as candidaturas espontâneas e, só depois, a inscrição no centro de emprego.

Nos últimos 50 anos houve mudanças significativas no país. Neste trabalho, o PÚBLICO analisa como as novas gerações estão a moldar a sua visão e atitude em relação ao mundo do trabalho, tendo por base os dados do inquérito “Os jovens e o mundo do trabalho”, desenvolvido pelo Centro de Estudos e Sondagens de Opinião (CESOP) da Universidade Católica Portuguesa, com o apoio da Fundação Inatel.

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