Carlos Moedas diz que cruzeiros é um tipo de “turismo que não interessa” a Lisboa
Autarca critica construção do Terminal de Cruzeiros, em Santa Apolónia. “É uma decisão que nunca teria tomado. Se pudesse reverter esta situação e não ter cruzeiros em Lisboa, revertia”, afirma.
- Leia a primeira parte da entrevista: “Para alguma extrema-esquerda, os sem-abrigo tornaram-se quase um negócio”
O seu antecessor, Fernando Medina, disse que não havia turistas a mais. Concorda com ele no dia de hoje?
Gosto muito de olhar para os números. Temos uma cidade de 546 mil habitantes. Essa cidade, todos os dias, recebe à volta de um milhão de pessoas. Um milhão de pessoas que vêm trabalhar para Lisboa. Pessoas que vêm da Grande Lisboa. E recebemos, em termos de turistas, 38 mil turistas por dia, em média. Contas redondas, 38 mil, 40 mil. Ou seja, 40 mil em relação a um milhão que entrou na cidade. Não podemos dizer, nem afirmar, que estamos numa situação de turismo a mais. Mas temos turismo a mais em certas zonas da cidade, porque elas vão todas para o mesmo sítio. Estão concentradas. Olho, por exemplo, para o terminal de cruzeiros. É uma decisão que nunca teria tomado. Se eu pudesse reverter esta situação e não ter cruzeiros em Lisboa, eu revertia. O problema é que há uma concessão de 20 anos. Não posso fazer isso. Não estou de acordo com os cruzeiros em Lisboa, neste momento. Nem pensar. Acho que é um turismo que não ajuda nada na cidade, nem interessa à cidade.
E soluções possíveis, daqui em diante, que possam ser executadas para diminuir essa concentração ali na zona da Baixa de Lisboa?
Este presidente da câmara que duplicou a taxa turística. Fizemo-lo para haver aqui alguma regulação no próprio número de turistas e na qualidade dos turistas que vêm para Lisboa. E isso é importante. Depois, estamos a construir hoje, culturalmente, equipamentos que não estejam todos na mesma zona da cidade. Vamos inaugurar, a 4 de Novembro, o novo Museu Julião Sarmento, que vai ter uma atractividade turística para as pessoas irem, não estarem só no centro da cidade. Precisamos de dividir o turismo entre as várias zonas da cidade. O turismo é 20 % da nossa economia e são 25 % do emprego da cidade. A extrema-direita não gosta das pessoas que vêm para Portugal, que são pobres e que vêm procurar uma vida melhor e que nós temos que ajudar. A extrema-esquerda não gosta dos turistas porque são ricos. Estamos sempre nessa luta dos extremos.
Outra das questões prementes na cidade de Lisboa tem a ver com a circulação automóvel. Não acha que há demasiados carros a circular no centro da cidade? E que a câmara podia fazer mais para o evitar?
Fizemos muito. O número de carros que vêm para o centro da cidade não é um problema de hoje, é um problema de muitos anos. Só que, todos os anos, vamos tendo mais carros. Quando começámos a trabalhar, por exemplo, com tudo o que são as aplicações hoje na internet, para que as pessoas não venham para o centro da cidade. Hoje, que vem de Algés e chega ali ao pé da Infante Santo, se for para Santa Apolónia ou se for para a Expo, o próprio navegador, seja ele a Google ou outro, vai indicar para subir a Infante Santo e fazer aquilo que chamamos a quinta circular.
Mas não a impede de ir para o centro…
Não impede ainda, mas vai impedir quando tivermos um sistema de câmaras em que posso aí identificar quem é que é residente na Baixa, quem é que trabalha na Baixa e de quem é, por alguma razão, a matrícula. Isso demora, não se faz de um dia para o outro.
Recentemente, tomou medidas restritivas relativamente aos tuk-tuk. Considera tomar medidas idênticas em relação aos TVDE, que tanto contribuem para o congestionamento?
Se tivesse esse poder, já as tinha tomado. O licenciamento dos TVDE não é feito pela câmara. Aliás, houve uma moção na câmara que fizemos em relação à limitação dos TVDE. Em relação às regras desses TVDE, em relação ao TVDE ter que comunicar em português, conhecer as regras de trânsito. Sou eu próprio, muitas vezes, a chamar a Polícia Municipal, quando vejo o desrespeito total das regras de trânsito por muitos TVDE. Portanto, eu peço ao Governo que assim possa...
Tem que haver uma limitação dos TVDE?
Tem que haver uma limitação dos TVDE. Como teve que haver uma limitação, recordo que, quando cheguei, havia mais de 18 mil trotinetas, hoje são 8 mil. Recordo que os tuk-tuks hoje são mil, mas se nós conseguimos ter estas autorizações para estacionamento...
Qual seria o número desejável de TVDE na cidade e de zonas em que eles poderiam...
Não sou um técnico que possa estar-lhe a dar o número. Os estudos, que mostram que os TVDE estão a provocar mais trânsito, eles não são só em Lisboa e são estudos que têm que ser analisados. Mas temos que reduzir, seguramente, o número de TVDE na cidade e acredito que os próprios TVDE estão de acordo com esta medida, assim como os tuk-tuk também estiveram de acordo com a nossa medida, assim como aqueles que são os donos das trotinetes em Lisboa também estiveram. Importante é que as pessoas percebam que o presidente da câmara não tem instrumentos. Pode estar todos os dias a falar com o Governo, a sensibilizar o Governo, mas há medidas aqui que têm que ser tomadas pelo Estado central e que não podem ser tomadas pelo presidente da câmara.