Uma Europa com mais investimento em I&D
A Europa decidiu há mais de duas décadas associar 3% do seu PIB para despesas em I&D até 2030. Esta falta de investimento é a razão fundamental para o atraso da Europa em relação aos EUA e à China.
Acabou de ser divulgado no dia 9 de setembro o relatório de Mario Draghi sobre o futuro da competitividade europeia e que segundo o autor é um desafio existencial, mas sobretudo assente nos valores fundamentais da Europa: a prosperidade, a equidade, a liberdade, a paz e a democracia. A única forma que a Europa tem para enfrentar este desafio é crescer e tornar-se mais produtiva, preservando os valores de equidade e inclusão social. Para isso, há que mudar e sem mudança não há nem crescimento nem evolução.
O relatório assenta em três eixos de ação:
- Inovação e produtividade, sobretudo nas tecnologias avançadas;
- Descarbonização da economia;
- Redução da dependência externa, em áreas como aquisição de matérias-primas e defesa.
Para além de fazer um diagnóstico muito crítico sobre a Europa, assente sobretudo numa comparação muito cirúrgica entre os EUA e a China, identifica um conjunto de recomendações muito específicas para dez setores económicos prioritários da economia:
- Energia;
- Materiais e matérias-primas críticas;
- Digital;
- Indústrias intensivas de energia;
- Tecnologias limpas;
- Setor automóvel;
- Defesa;
- Espaço;
- Setor farmacêutico;
- Transportes.
Mas, afinal, o que é necessário fazer? É necessário sobretudo mais investimento em ciência.
A Europa decidiu há mais de duas décadas associar 3% do seu produto interno bruto (PIB) para despesas em investigação e desenvolvimento (I&D) até 2030, e é precisamente esta falta de investimento a razão fundamental para o atraso da Europa em relação aos EUA e à China.
De acordo com vários estudos, há uma relação direta entre a produtividade e a despesa em I&D, e isso pode comprovar-se claramente com o desenvolvimento de alguns países. De acordo com os dados recentes da OCDE, em 2022 os países que mais investiram em I&D foram Israel e a Coreia do Sul, com 6,02% e 5,21%, respetivamente.
Em termos europeus, temos a Bélgica a liderar com um investimento de 3,41%, valor este muito acima da média da OCDE, com 2,73%, e da própria Europa, com 2,11%.
Mas mais importante do que o valor em si é o facto de a Bélgica numa década ter aumentado em mais de 50% o valor do seu investimento em R&D, muito pela grande aposta feita na área das ciências farmacêuticas e biotecnologia, com empresas líderes a nível mundial, com é o caso da Pfizer, GSK e Janssen, e na área das nanotecnologias, com o IMEC a liderar na área das nanotecnologias e nanoelectrónica. A título de exemplo o IMEC no âmbito do “ChipActs” recebeu 2,5 mil milhões de euros, de forma a se reduzir a dependência de semicondutores da Ásia.
O programa por excelência que cofinancia a ciência na Europa é o Horizonte Europa, com um orçamento de 93,5 mil milhões de euros para o período entre 2021-2027, sendo sugerido que o próximo programa-quadro, o FP10 para o período 2028-2035, passe a ter o dobro do orçamento – 200 mil milhões de euros.
O relatório elogia muito o programa ERC (European Research Council), sendo mesmo sugerido que se crie um programa similar aos dos investigadores, mas para as áreas das infraestruturas de excelência, o ERC-Instituições. Da mesma forma que o programa ERC capacita os investigadores, o ERC-I irá capacitar as instituições. Pretende-se desta forma reter e atrair talento para a Europa.
Na área da ciência, Portugal, para além de ter as suas prioridades como país, tem de estar cada vez mais alinhado com as estratégias europeias e promover mais programas no formato de sinergias, como é o caso do programa ERC-Portugal.
Temos bons exemplos, temos excelentes diagnósticos, só falta fazer!
A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico