Cabo Verde: voos quase a metade do preço nas ilhas menos visitadas para turistas e residentes
É quase terapia de choque para o mercado cabo-verdiano: easyJet estreia-se com voos Portugal-Cabo Verde em Outubro, há nova companhia doméstica e há novos preços para voos entre algumas ilhas.
Levar mais turistas, e "outro tipo de turistas", a Cabo Verde e às ilhas fora das rotas turísticas, com aposta no turismo da natureza: são motes anunciados pelo Governo, que também criou nova companhia aérea só para voos domésticos.
Cabo Verde prepara-se para uma "nova era" em termos de transportes, garantiu tanto o primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, como o ministro do Turismo e Transportes; Carlos Santos, durante a 2ª Conferência Internacional de Turismo de Natureza, que juntou dezenas de especialistas e autoridades esta quinta-feira na Fajã, localidade do concelho de Ribeira Brava, na ilha de São Nicolau, uma das mais periféricas e menos visitadas do país.
"O Governo pretende diversificar o turismo e levá-lo a todos os pontos de Cabo Verde", disse à Fugas Carlos Santos, à margem da conferência. Se por um lado a anunciada estreia da easyJet no país será "um marco" — já em Outubro, voos Lisboa/Porto-Sal —, por outro, umas semanas antes da chegada da low cost, entrarão em vigor novas tarifas interilhas, pelo menos no que concerne as ilhas menos visitadas e que muitos, por vezes, criticam como "mais esquecidas": São Nicolau, Maio e Brava (esta sem aeroporto, mas via marítima com ilha do Fogo).
E como vai funcionar esta aposta redobrada no "aumento de fluxo" aéreo (e marítimo)? "Iremos ter os bilhetes já prontos a reserva com o desconto de 40 por cento aplicado", resume o ministro, sendo que basta fazer a compra para ter acesso ao novo. O sistema entra em vigor, "o mais tardar", a 7 de Outubro. A easyJet estreia-se no dia 29 do mesmo mês.
O "objectivo é estimular o turismo e facilitar o movimento de residentes", adianta o responsável. "São ilhas de mercado diminuto, com uma economia mais pequena, pouca população, muito fustigada pela insularidade", acrescenta. O Governo irá "compensar" a companhia pelos descontos aplicados.
A companhia de bandeira, TACV, presta o serviço doméstico temporariamente, mas o Governo criou uma nova companhia aérea destinada exclusivamente aos voos internos. A Linhas Aéreas de Cabo Verde nasce com "capitais públicos e gestão diferente" da TACV. O objectivo é prestar um serviço que antes foi adjudicado a privados. "Sabemos que vai haver aumento de procura, a companhia tem de preparar-se para mais aviões, mais frequências, tem de saber responder a esse aumento", diz.
As ligações marítimas, garante Carlos Santos, têm também de deixar de ser "o parente pobre" dos transportes. Actualmente, o serviço interilhas está concessionado à (100%) portuguesa Transinsular. O Governo assinou com a empresa "um contrato de serviço público, que permite que hoje todas as ilhas estejam ligadas", com rotas e frequências estabelecidas. Os turistas mais interessados num turismo lento podem optar pelas ligações marítimas (por exemplo, de São Nicolau a São Vicente são cerca de 4h, ao Sal quase o dobro). O ministro confirmou a aquisição de "mais dois navios, para não haver quebras de fluxo e haver previsibilidade, pontualidade, assiduidade". Uma das maiores queixas em ilhas como São Nicolau (actualmente com três voos semana) prende-se, de facto, com os voos: é que além das poucas frequências de voos, sucedem-se cancelamentos e atrasos, algo com que residentes vivem mal e que para turistas pouco serve.
"Queremos estabilizar transportes, 2025 será o ano charneira para essa estabilização", garante Carlos Santos. "Será um empurrão enorme para turismo e residentes". Na conferência, repetem-se as ideias chave, entre o slogan, a teoria e a desejada prática: um turismo da natureza, mais próximo dos habitantes, que distribua mais dividendos pela população, que sirva de motor de desenvolvimento. "Um turismo que se interligue com outras actividades e que comece a dar mais proveito à comunidade local", resume o ministro. Das promessas e projectos à realidade, o tempo o dirá.
"O turismo verde pode ter essa preferência pela navegação", portanto será um caso a rever. "A opção pelo navio pode tb ser uma boa contribuição para redução de CO2", sublinha, aproveitando para divulgar o pacto de sustentabilidade para o turismo feito na ilha do Sal com 35 empresas, organismos, serviços públicos, empresas, que se pretenda sirva de teste para alargar a outras ilhas. Para além das promessas e slogans, o pacto pretende estabelecer "boas práticas", seja no uso de energias limpas, redução de lixo, eliminação de plásticos, gestão de resíduos, etc" mas "também de responsabilidade social, com maior cuidado do trabalhador e da comunidade em que se está inserido", incluído com aposta em produtos km0 (ou seja, adquiridos no mercado e produção locais).
Na busca da "diversificação e abrir as ilhas mais periféricas a um turismo diferente do sol e mar", o ministro, como outros responsáveis do turismo, reafirma à Fugas que, ainda assim, "sol e mar, Sal e Boavista", não serão "esquecidos". Representam 82 por cento do total do turismo, indústria que contribui directamente com cerca de 25% para o PIB, sem contar com transversalidades. Por isso mesmo, há uma aposta redobrada em mercados como o espanhol, em crescimento, na França, Luxemburgo, Alemanha.
Em matéria de turismo da natureza, para além dos portugueses, "britânicos, alemães e franceses são mercados muito interessantes". Entre os dois turismos, o ministro garante que o Governo está a realizar por todo o país obras de "saneamento, recolha de lixo, classificação de hotéis, legislação de alojamento local com equilíbrio - sem os mesmos problemas que Portugal e Espanha estão a atravessar -, transportes, melhoramentos de cada destino, qualificação do produto". Para Carlos Santos, são dois vectores simultâneos, garante: "melhorar a vida dos residentes e acolher visitantes com qualidade".
Carlos Santos falava à Fugas à margem da 2ª Conferência Internacional de Turismo da Natureza, que trouxe dezenas de visitantes especializados à ilha de São Nicolau, espaço de montanhas, vales e praias em esplendor natural, esgotando a hotelaria: o número de quartos é ainda residual para o turismo que se quer (cerca de uma centena, oficialmente).
"Nós precisamos definitivamente de dar-nos um valor económico, turístico; uma narrativa, um roteiro, fazer algumas requalificações", defendeu o primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, na abertura da conferências, "um desafio". O governante destacou também a estreia da easyjet no arquipélago como uma novidade com um "impacto muito grande".
A lufada easyJet
A chegada da easyjet é vista com muita expectativa pelas ilhas, particularmente pelo Sal. As primeiras vendas, Lisboa/Porto-Sal, com voos a começarem no final de Outubro, "têm sido um sucesso", garante Carlos Santos. "Batemos à porta da easyJet, negociamos dois anos com eles. São seis voos por semana, quatro de Lisboa, dois do Porto, para o Sal", resume, sendo que a ilha âncora do turismo "pode ser um portal para os turistas que buscam ir para além do sol e mar partam para outras ilhas". "Vai chegar um turista com um perfil completamente diferente, fora dos grandes resorts, que vai estar mais nas vila e lugares, a mover-se pelas ilhas, mais apto a consumir alojamentos de pequena dimensão, que normalmente são propriedade de cabo-verdianos", defende Santos. "Uma lufada de ar fresco na diversificação", opina, até porque, depois do Sal, a companhia já "manifestou vontade de estudar outros aeroportos no país. Estamos à espera que assim seja, porque bom, bom seria levar directamente o turista para outras ilhas". No ar já paira um potencial destino novo para a low cost: a capital, na ilha de Santiago, Cidade da Praia.