Chega apresenta medida idêntica à aprovada nos Açores sobre acesso à creche
Partido de André Ventura insiste em dar prioridade aos filhos de pais com trabalho no acesso às creches. Nos Açores, aceleração dessa proposta já é moeda de troca para próximo orçamento.
O Chega entregou na Assembleia da República uma proposta para dar prioridade a filhos de pais com emprego no acesso à creche, uma iniciativa idêntica à que o partido apresentou nos Açores e que foi aprovada com o acordo do PSD.
De acordo com o projecto de resolução, disponível no site do parlamento, o partido de André Ventura propõe uma emenda à legislação para introduzir “critérios adicionais de admissão e priorização” no acesso às creches. O objectivo é dar “prioridade a crianças pertencentes a agregados familiares cujos progenitores ou encarregados de educação possuam ocupação laboral, impeditiva de cuidarem dos filhos”, segundo o documento. Com a proposta, o Chega diz querer “corrigir” a situação actual, que considera “injusta socialmente” e discriminatória das famílias que trabalham.
Ao PÚBLICO, a direcção nacional do partido já tinha mostrado concordância com a medida do Chega-Açores, admitindo fazer uma proposta “semelhante” a nível nacional. No parlamento açoriano, a resolução foi aprovada com os votos a favor do PSD-A, que lidera o executivo regional, do CDS-PP e PPM (que também fazem parte do governo) e a abstenção da IL.
O Governo da República distanciou-se da proposta açoriana que motivou dúvidas de constitucionalidade e colocou o país a discutir a contaminação dos moderados pela direita radical. Tal como acontece na República, nos Açores, o PSD também governa em minoria. Contudo, ao passo que Montenegro abriu a porta a negociações com o PS, Bolieiro tem, desde 2020, o apoio do Chega para governar a região.
Questionado pelo PÚBLICO, o Governo de Montenegro demarcou-se da iniciativa, assumindo a intenção de tornar o acesso à creche o mais abrangente possível e afastando-se de uma lógica assente na discriminação positiva dos filhos de pais com emprego, que pode ser excludente de filhos de pais sem vínculo laboral.
Na legislatura passada, em 2023, o Chega apresentou na Assembleia da República uma recomendação ao Governo no sentido de dar prioridade no acesso às vagas nas creches às crianças com ambos os pais trabalhadores e a IL apresentou mesmo um projecto de lei nesse sentido. As duas iniciativas acabaram chumbadas pelos votos contra do PS e Bloco e PAN, mas PSD, PCP, PAN e Livre abstiveram-se.
O ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social salientou então “que não está previsto, da parte do Governo, alterar os critérios que estão estabelecidos no acesso às creches”. “Aliás, alterámos o critério da abrangência territorial, de concelho para freguesia, para conseguir ter mais vagas e não vamos mudar mais critérios”, vincou o gabinete da ministra Maria do Rosário Palma Ramalho.
Nos Açores, o presidente do Governo Regional, que começou por fazer a defesa ideológica da medida – “os que vivem em pobreza têm subvenção de apoio público para a sua sobrevivência, têm filhos e podem tomar conta dos filhos”, disse Bolieiro -, tem vindo a recuar e nas últimas declarações públicas sobre o assunto até admitiu não aplicar o critério.
Antes, a secretária regional da Saúde e Segurança Social, durante a discussão na Assembleia dos Açores, explicou que o critério do vínculo laboral dos pais no acesso à creche iria ser avaliado num projecto-piloto destinado a abranger uma comunidade específica no ano lectivo 2025/26.
Só que a posição dúbia de Bolieiro não deixou satisfeito o Chega-A, que já veio exigir a implementação da medida em troca da aprovação do Orçamento para 2025. "[Se a medida não for aplicada] o próximo Orçamento cai e temos eleições novamente”, avisou o deputado e líder regional do Chega-A, citado pela Lusa. Nos Açores, o acesso às creches poderá ditar o curso da estabilidade. Veremos como será na República.