Estivemos, nos últimos meses, sujeitos uma dose considerável de campanhas eleitorais. Tivemos de todos os tipos e para todos os gostos, com muitas caras diferentes a desfilar, o máximo que podiam, por todas as montras que se lhes abriam. Dos mercados às redes sociais, dos beijinhos aos debates e entrevistas mais duras, em todos, o foco era semelhante: os problemas. Todos queriam resolver os problemas das pessoas.
Temos gerações de políticos, independentemente a idade, que têm dificuldade em fugir ao peso esmagador dos problemas e à sua perceção enviesada. A obsessão pela procura de problemas para resolver parece-me castradora e politicamente psicótica. Dominados pelo medo de não estar a enfrentar os problemas de agora, este pesadelo constante impede de sonhar o futuro. Gostava que os nossos políticos sonhassem mais, pois os problemas nunca vão cessar, especialmente quando não há espaço para pensar em mais nada.
O nosso desenvolvimento e felicidade precisam do sonho, da relativização e de aspirarmos a algo melhor, muito além da resolução direta de listas de problemas. Obviamente que precisamos de tratar do que nos aflige, mas para isso, muitas vezes, bastava invocar soluções técnicas. Se fosse esse o objetivo último do exercício da política, não precisávamos de votar, bastava implementar processos de recrutamento para contratar os melhores especialistas para cada área. Felizmente, em política, podemos aspirar a algo mais. É aí que o sonho entra novamente.
Se os nossos políticos forem apenas sonhadores, de pouco nos servem. A capacidade de estimular e cativar precisa de apoio, estabilidade, empatia, rigor, dados e informação, quem sabe até processos de decisão totalmente novos. É esse equilíbrio que precisamos: entre o sonho, a realidade e a competência, evitando o excessivo foco nos problemas do agora. Esses medos podem ser agregadores negativos e explorados para manipulação social. Ao sonhar e imaginar o futuro, podemos evitar os problemas do amanhã e criar as oportunidades melhores, reinventando as ferramentas que as sociedades democráticas podem usar em abordagens menos pessimistas.
Recordo alguns projetos em que tenho participado, onde criámos ferramentas, semelhantes a jogos, de apoio à imaginação e projeção do futuro. Ou seja, criação de cenários interativos onde podemos testar e experimentar soluções, decisões e investimentos para estimar os impactos, as relações e os efeitos em cadeia das possíveis ideias. E mesmo, com o apoio destas ferramentas, algumas bastante sofisticadas, nem sempre é fácil compreender a complexidade da realidade.
Quando o exercício da política e da participação cívica em geral perde a aspiração ao sonho, aproximamo-nos de máquinas que se limitam a seguir algoritmos de eficiência, podemos cair no engano e manipulação. E esse é que é o problema verdadeiramente complexo.