No México, votou-se na igualdade

A eleição de Claudia Sheinbaum no México é uma derrota política do machismo e um significativo passo na construção de uma sociedade mexicana mais justa, livre e democrática.

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Megafone P3: No México votou-se na igualdade Luis Cortes / REUTERS
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No dia de 2 de Junho, a vitória eleitoral de Claudia Sheinbaum nas eleições presidenciais do México ecoou pelos cantos do mundo. “É a primeira mulher Presidente do México”, afirmavam e repetiam, como se se tratasse de uma espécie de mantra sagrado.

Depois, chegaram às redacções e às redes sociais o primeiro discurso da recém-eleita Presidente do México e outras tantas imagens e filmagens de multidões, meras famílias ou grupos de amigos e conhecidos a festejarem o resultado destas eleições, cujas lágrimas faziam brilhar ainda mais o sorriso que se impunha nas suas faces. E assim, mesmo com 8667 km a separarem a Cidade do México de Lisboa, consegui sentir a felicidade e o simbolismo que aquele acontecimento significava para aquelas pessoas. Era, de facto, um sentimento contagiante e tão profundamente humano que poderia, como o fez, atravessar oceanos e continentes.

Não obstante, entendi que as pessoas que me rodeavam, como tantas outras à volta do mundo, certamente pela distância geográfica e pela velocidade e banalização da informação, não reconheceram a verdadeira relevância, deveras transformadora, deste acontecimento na longa caminhada da luta pela igualdade de género, que culmina no anseio de um mundo mais justo.

Talvez o leitor esteja a questionar-se (ou conheça alguém que certamente o faria): mas porque é dado tanto destaque ao facto de ela ser “mulher” e porque acredita este jovem que uma eleição num país da América Latina se pode constituir marco histórico?

A resposta a essa questão encontra-se numa simples e única palavra, que abarca em si muitos sonhos: representatividade.

Vamos então por partes. Em primeiro, o México é um dos países com a taxa de feminicídio mais alto do mundo, ou seja, este é um dos países onde mais mulheres morrem, simplesmente pelo facto de serem mulheres. Nesse sentido, segundo o jornal El Economista, foram registados 184 feminicídios, durante o primeiro trimestre de 2024, o que em média revelam ser dois feminicídios por dia. Para que cheguemos a estes dados temos de refletir sobre o porquê de serem assassinadas tantas mulheres, apenas pelo facto de serem mulheres.

A meu ver, tal deve-se ao profundo sentimento machista enraizado na sociedade mexicana, o que leva a que se olhe para a mulher como um ser inferior e com menos direitos, que se deve subjugar aos interesses e vontades dos homens.

Assim essa condição de subalterna, leva a que os perpetradores deste crime, na sua esmagadora totalidade, homens, vejam na mulher um ser onde podem descarregar o seu ódio e violência porque, no final das contas, segundo a premissa machista, os homens detêm a autoridade e “as mulheres têm de obedecer a essas mesmas ordens”. E é aqui que entra a figura da Presidente, porque foi entregue a Claudia Sheinbaum um cargo de autoridade, alcançando uma figura usualmente olhada com desdém, inferioridade e fraqueza, o mais alto e significativo patamar da política mexicana.

Em segundo e último lugar, esta eleição é também deveras importante no campo da representatividade porque quando se elege uma mulher como Presidente, estamos a afirmar também que uma mulher também é suficientemente inteligente e capaz para poder sê-lo. Com efeito, o que Claudia Sheinbaum fez foi dizer a todas as meninas e jovens mulheres mexicanas que a viram pela televisão, nos jornais ou pelos telemóveis que “sim, tu podes ser Presidente de um país”. E a verdade é que apenas podemos ser e ter a coragem de querer ser o que vemos alguém semelhante a nós sê-lo, pelo que se uma jovem mulher nunca viu uma pessoa semelhante a si a ocupar um certo lugar, como de Presidente, inconscientemente vai acreditar que não consegue genuinamente chegar lá. Tal mudança é profundamente inspiradora!

Em suma, esta eleição é uma profunda derrota política do machismo e por mais que se reconheça que este acontecimento não vai fazer com que a desigualdade de género e a violência associada a ela desapareçam, é um passo inegavelmente significativo na construção de uma sociedade mais justa, livre e democrática para todos os mexicanos.

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