Um apelo à democracia: mais cultura socioemocional, por favor!

Não há contemplação do momento presente, porque o que conta é a sequência de acontecimentos. Não há quase memórias porque tudo é efémero.

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O desejo para os pais é demasiado abstrato e ideia perdida e, para os filhos, desejos são ordens DR/Keren Fedida via Unsplash
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A proposta é a seguinte: vamos educar as nossas crianças e os nossos jovens? Vamos. Segue-se uma lista de exemplos das situações que tenho presenciado com cada vez mais frequência nos mais variados contextos enquanto mãe nas escolas ou casas de amigos ou como psicóloga nos acompanhamentos psicoterapêuticos.

Criança 5 anos “Mãe, mentiste-me! Disseste que não ia chover e está a chover!”

Criança 8 anos “Não é justo! Ele (irmão) tem um chocolate e eu não”

Criança 11 anos “Pai, ou trazes já a água que eu quero beber, ou eu não visto o pijama”

Agressividade, intolerância, chantagem e ameaça. Os filhos exagerados… Exagerados na exigência, na falta de limites, no “quero, posso e mando”. Filhos polarizados que se desfazem em lágrimas ou que se inundam de fúria. Tristeza e raiva no comando das emoções. Pensamentos “derrotados” ou pensamentos “deita-abaixo” que definem comportamentos de isolamento, de dependência excessiva ou liderança ditatorial: “Quer os minorcas”, os que fazem sempre o que os amigos querem e se anulam, “Quer os gigantes”, onde só há amizade se o amigo fizer o que Eu quero e como quero! O preto ou o branco. O sim ou o não. O passado ou o futuro. A idade do presente não satisfaz. Preferiam ter menos ou mais anos. Não há contemplação do momento presente, porque o que conta é a sequência de acontecimentos. Não há quase memórias porque tudo é efémero, tudo passa e a gratidão não existe. Só há livros de reclamação, nenhum de elogio… Desresponsabilização excessiva…

Criança 9 anos “Não gosto de ir à natação. Não quero ir mais. Não vou”

Adolescente 14 anos “Se me pedirem para pôr a roupa a lavar, ponho só a minha. Não tenho de fazer as coisas dos outros. E não faço!”

Adolescente 16 anos “Enjoei a sopa e a comida que fazem lá em casa. Só como vinda de fora”

Birras muito perigosas estas… Fora da esfera dos 2/3 anos… Sem quaisquer princípios de respeito… Os adultos dão-se à humilhação, ausência de dignidade. Atrapalham-se. Atordoam-se.

A juntar à tristeza e raiva, culpa e vergonha dos adultos no comando das emoções. A insegurança retira ao bom senso toda a sua importância. Para qualquer ação com os filhos, é preciso ligar ao pediatra, mandar mensagem ao psicólogo (os que têm pediatra e psicólogo) ou então seguir o que dizem as redes sociais: fazer como fez alguém do mundo digital fez parecer que fez! Dúvidas à frente de certezas em aspetos básicos da vida das relações humanas.

Pai de filhos com 10 e 12 anos “Eu já não sei o que hei-de fazer mais. Dei-lhes tudo. Não percebo o que eles querem mais…”

Mãe de filhos com 4 e 6 anos “Durmo com eles todas as noites e mesmo assim muitas vezes durante o dia dizem que eu sou má. Que nunca faço o que eles querem”

Mãe de filho com 13 anos “Quero poupá-lo ao máximo do sofrimento. Estou sempre a perguntar: estás bem? Alguma coisa não correu bem?”

Resultado: centração e egocentrismo excessivos…. Pequenos ditadores. Pouco desconforto, pouca dor, ausência de sacrifício… Muito, muito Medo! Procura de certezas, perfeição, excelência. Ter que parecer que se está sempre bem, sempre em ação, ocupados, preenchidos, plenos. Não se pode admitir fazer nada, estar aborrecido, inquieto, sonhador, contemplativo. Temos pressa, tem de ser rápido e atenção, muito cuidado, pode ser perigoso! Medo e ansiedade juntam-se à tristeza, raiva, culpa e vergonha no governo das emoções.

Uma democracia emocional nada democrática… e com ela votamos diariamente numa educação de excessos, contrastes, quebras e guerras. Sem respeito, compromisso ou desejo. O desejo para os pais é demasiado abstrato e ideia perdida e, para os filhos, desejos são ordens. Fica o apelo sincero e urgente para este governo das emoções porque desejamos continuar a sonhar acordados neste mundo-planeta Terra.


A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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