Lídia Jorge: “Os planos das conquistas e das decepções atropelam-se uns aos outros”
O discurso, na íntegra, da escritora Lídia Jorge na conferência do 34.º aniversário do PÚBLICO, a 5 de Março de 2024, na Culturgest, em Lisboa, dedicada ao tema “Ser Mulher em Liberdade”.
1. O PÚBLICO completa hoje 34 anos. No dia em que pela primeira vez foi distribuído, 5 de Março de 1990, eu não consegui obter um exemplar. Andava por essa altura pelos lados da Rua D. João V e ao chegar de tarde ao Largo do Rato, a edição tinha esgotado. De regresso a casa fazia o percurso de autocarro. Quando entrava já ele vinha repleto de passageiros. A essa hora tardia, mulheres ainda jovens carregavam sacos de plástico de onde saíam pacotes de leite e folhas de couve, rescendiam a lixívia e produtos de limpeza. Por vezes conseguiam um lugar sentadas. Adormeciam à janela e acordavam quando as paragens que lhes convinham há muito tinham ficado para trás. Agora, 34 anos volvidos, quero imaginar que as suas filhas têm vidas diferentes — por certo que frequentaram escolas, institutos formadores, andaram na universidade. As suas filhas serão enfermeiras, contabilistas, taxistas, polícias, médicas, informáticas, talvez jornalistas, talvez empresárias, talvez deputadas da nação. Olho para trás, e entre a vida das mulheres que regressavam no autocarro da noite e tinham a minha idade, e a vida das suas filhas, existiram jornais como o PÚBLICO que foram relatando esse percurso.
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