No próximo dia 10 de março, eu como muitos outros, por virtude das circunstâncias e da idade, serei chamado a votar pela primeira vez. Não me poderia estrear num cenário tão caótico como este. Os clichês e desleixo estão sempre ao serviço da pouca substância. Apesar disso, não podemos negar que estamos “num momento decisivo” da nossa história.
No país dos brandos costumes, onde as eleições são antecipadas por manifestações da extrema-direita, a ameaças ao boicote das eleições por parte da polícia (os sindicalistas falaram, recentemente, na "forte possibilidade" de um cenário desses), a democracia treme e não é pouco. O mote foi dado pela extrema-direita europeia e, perante a reação desconcertada e permissiva dos moderados, chegou ao cantinho da Europa que descobriu com grande surpresa que, tendo sido um dos últimos países a descolonizar e tendo tido uma das mais longas ditaduras da Europa, talvez tenha se tenha entranhado em si algum racismo. A isto acrescenta-se o niilismo protagonizado na expressão “só neste país” que é sempre seguida da descrição de um acontecimento também corriqueiro em muitas outras latitudes.
O meu primeiro voto será, assim, num ambiente eufemisticamente dantesco, onde o fato vale mais que o facto, a forma como se entrega um soundbyte é mais importante do que o conteúdo ou até veracidade.
Não há terra mais fértil para a extrema-direita do que esta. Os microdebates têm o modelo de um programa de futebol sobre foras de jogo, só que com menos tempo. E os debates sobre os debates que se lhes seguem não fogem à tradição da modalidade procurando-se, mais ou menos “a olho”, declarar um vencedor e um vencido, quem manda o melhor soundbyte. Esta farsa ainda dá em tragédia.
A política é uma nobre arte com uma pobre fama. Num momento em que a democracia parece imersa num pântano, é necessário que se tente dignificar a política para lá de um confronto de frases feitas, para lá de transformar debates em duelos, para lá de legitimar a violência. O impacto deste paradigma foi uma polarização que, apesar de assimétrica, se espalha aos vários níveis da sociedade. O meu primeiro voto é já um voto desiludido.
O pessimismo só tem razão quando não há otimismo na vontade. No entanto, os “primeiros votos desiludidos” vão-se sucedendo e as vontades não nos chegam. Toda a plenitude é imperfeita, mas é preciso lutar por ela.