Ah, o primeiro encontro! Conhecer alguém na vida real! Ver tudo o que as fotos escondem e que os teclados não contam. Devia ser uma sensação boa? Não é. Ter de colocar em acção a melhor versão de mim mesma, seja ela qual for, deixa-me nervosa por si só. Se calhar, na ausência dos emojis, a outra pessoa será ainda mais aborrecida do que eu. Mas há alguma fórmula infalível no dating? Tenho como garantir que vai correr bem?
Arranjamos a melhor roupa e o melhor humor para, depois de um dia de trabalho, ir à mais difícil entrevista de emprego: a de namoradinha do fulano. Chamemos-lhe Hugo, para simplificar. Há que mostrar interesse, mas ser descontraída. Rir, sem ser histérica. Comer o suficiente para não ficar bêbada, mas sem estoirar a conta… que vais dividir. Ser charmosa, se souberes como. Alguns amigos vão dizer-te qual é a maneira certa; outros vão só aconselhar-te a seres tu mesma — o que facilita muito a vida do teu psicólogo quando és rejeitada.
O problema é que nem que te esforces muito vais poder garantir que o Hugo gosta de ti. Nem se ele o disser com todas as letras: "Gosto de ti." Podem ter partilhado batatas fritas e algumas memórias de quando eram crianças e podes tê-lo achado genuinamente engraçado. Podes ter-te surpreendido porque era ainda mais giro do que nas fotos.
Quando chegas a casa, dizes a todas as amigas com quem partilhaste a localização que “foi bom!” (com emojis sinceros). Quando a mensagem de follow-up teima em não aparecer é que começas a pensar se de facto correu bem. Estiveste a aproveitar o momento e passou-te ao lado o jogo que se desenrola a cada encontro. Fiz perguntas demais? De menos? Estava vestida como um “bro”? Ou estava demasiado aperaltada? Não, não foi nada disso. Talvez o Hugo esteja só a dormir há 18 horas.
No silêncio, levo o dia. Almoço sem resposta e peço conselhos à sobremesa — desta vez a outro homem, para ver se assim acerto. Vejo uma série. Um filme. Faço uma massa, a limpeza da casa e a sobrancelha. Formulo mais hipóteses. Foi alguma brincadeira que me correu mal? Danço. No interlúdio, nenhuma notificação. “Publica que estás na rua com as tuas amigas”, diz o homem-especialista. E, porque já eram os planos de qualquer forma, arranjo-me e saio para jantar.
Entre cervejas, estou pronta para declarar a hora do óbito. Sem hipocrisia nenhuma, já estive do outro lado. Quantas vezes achaste a pizza óptima e a conversa horrível? Planeaste mentalmente a tua fuga? Não tiveste coragem de mandar mensagem no dia seguinte com uma daquelas desculpas que até o ChatGPT é capaz de te ensinar: “Acho melhor sermos só amigos”? O Hugo não é o inventor deste gelo. Mas, deste lado, apenas uma pergunta: porquê?
Há quem passe meses a perguntar-se isto. Ou pior: a perguntar-te. “Imagino que não queiras falar comigo, mas podes dar um feedback?”, dizem numa terça-feira aleatória. E com que coragem dirias: “É porque disseste que não percebes como tenho o meu emprego”? Ou “é porque fugiste do empregado quando ele trouxe a conta e deixaste-me a pagar tudo sozinha”? Se nos dissessem exactamente qual é o nosso defeito de fábrica, o ghosting doía menos?
No dia a seguir, e tendo eu passado por todas as fases do luto, ele abre a mensagem. Deixa-a vista e não diz nada, o que explica o suficiente. Foi só um encontro, afinal. Ninguém te vai levar a sério se virem que te está a custar a superar algo que durou menos do que um derby. Mas porque é que lhe peço o que, muitas vezes, eu própria não sou capaz de oferecer? Olhemos para as coisas como elas são. Num mundo com tantos outros Hugos, mais vale procurar o próximo. Aceita que dói menos.
As histórias desta crónica partem das experiências reais da autora, cujo verdadeiro nome fica reservado para as apps.