Siza Vieira várias vezes mostrou a preocupação com as condições de trabalho na sua área. O arquitecto conhece bem as constelações de ateliês, para onde acorrem os portugueses com diploma na mão. Se emigração é uma escolha, esforçada e incerta, até mesmo na Suíça as perspectivas de futuro têm mudado.
Em cada novidade, parece que soam os alarmes: foi o fim do estirador, logo o desenho em computador e, finalmente, vieram os projectos em 3D. Mesmo assim, surpresa, a arquitectura resiste, sempre com novas formas de trabalhar.
Para alívio de alguns colegas, o mundo da arquitectura continua a expandir-se muito além da construção de edifícios. De Norte a Sul da Europa, juntam-se arquitectos, sociólogos, programadores, colegas de muitos cursos e profissões, e nascem novos projectos: vão desde a arquitectura temporária, dos eventos, das instalações artísticas, ao estudo das cidades, para as preparar para o clima do futuro.
A mudança, contudo, não parece ser sempre reconhecida. A confirmar-se, o esquecimento não se traduz só em oportunidades perdidas; pode levar mesmo a arquitectura a um túnel sem fim à vista.
Em Portugal, não falta talento: o país ombreia com a Itália no rácio de arquitectos e com França no número total de arquitectos, com quase 30 mil inscritos na Ordem. Há ainda uma maior proporção de arquitectos jovens, com capacidade de adaptação, mas também dependentes do volume e do valor de encomendas, para conseguirem melhores condições de trabalho.
Somando prémios e publicações, a arquitectura portuguesa assume um lugar notável para a dimensão do país. Seria de supor, por isso, que o número de diplomados em arquitectura fosse uma oportunidade. Porém, a situação actual é difícil: Portugal tem dos mais baixos salários de arquitectura da União Europeia, num país onde o custo de vida aumenta. A arquitectura em Portugal poderia ser competitiva, mas acontece o contrário: torna-se difícil atrair talento, e muitos jovens arquitectos acabam por preferir outros países, deixando Portugal numa posição mais periférica.
Falta lembrar a responsabilidade da Ordem dos Arquitectos, que deve "zelar pela função social, dignidade e prestígio da profissão de arquitecto", pelo menos assim consta no Estatuto. Mas que iniciativas se têm feito notar, nem que seja, para uma convergência com o resto da Europa, na tão proclamada dignificação da profissão?
A Ordem tem um compromisso com todos os profissionais da arquitectura, sem excepção: os que assinam projectos, os que estudam, os que procuram emprego, os contentes e os descontentes. Para a Ordem, não pode haver arquitectos desconvocados.
Bem pelo contrário: para a Ordem, todos os arquitectos fazem falta, basta sair à rua e ver. As casas estão mal isoladas, morre-se de calor e de frio, em cidades e subúrbios dispersos, descaracterizados e resignados.
Faltam casas para comprar ou alugar, quem discorda? Faltam creches e lares de idosos confortáveis, ruas com passeios acessíveis e rampas sem sobressaltos. Falta ainda exportar mais arquitectura, para fazer parte das transformações urbanas pelo mundo fora.
A Ordem irá a votos no próximo dia 21 de Setembro, e os arquitectos poderão escolher quem os representa. Um maior envolvimento nesse processo será um passo fundamental para reforçar a função social da arquitectura, mais atenta e aberta ao mundo.
Do mesmo modo que se espera que as formas das casas e das cidades que habitamos resultem da soma das nossas vontades, também a Ordem poderá evoluir, enquanto receber os arquitectos mais jovens.