“O Mais Habitação não serve a população”: protestos regressam após recuo do Governo

Movimento Casa Para Viver voltou a protestar em Lisboa. “Estamos fartos de escolher, pagar a renda ou comer”, gritaram manifestantes maioritariamente jovens.

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Os manifestantes reuniram-se no Largo de Camões, em Lisboa Matilde Fieschi
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O movimento Casa Para Viver regressou nesta quinta-feira às ruas de Lisboa para reivindicar o acesso a habitação condigna e expressar descontentamento com as medidas do pacote Mais Habitação, que começou esta quinta-feira a ser discutido no Parlamento, e que deixa de lado as propostas do manifesto apresentado pelos colectivos organizadores do protesto de 1 de Abril.

Os manifestantes reuniram-se no Largo de Camões depois das 18 horas, momento de habitual agitação de final de tarde pela cidade de Lisboa. À chegada ouvia-se Barracas Ocupação de José Afonso e nos cartazes liam-se slogans como “a crise aumenta, o povo não aguenta” e “queremos habitação para todos”.

André Escoval, representante do movimento Porta a Porta, disse ao PÚBLICO que fizeram parte do manifesto levado esta quinta-feira à Assembleia da República “um conjunto de propostas muito concretas” que precisam de ser materializadas, “não por capricho, mas porque são uma necessidade objectiva da vida das pessoas”. No entanto, o Partido Socialista (PS) classificou as medidas como “incompatíveis e inconciliáveis” com as do Governo.

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O protesto começou pouco depois das 18 horas MATILDE FIESCHI

Entre elas constava o fim dos despejos e das penhoras de habitações, a criação de tectos máximos nas rendas (que não devem exceder 20% dos rendimentos das famílias), a renovação automática de todos os contratos de arrendamento e a diminuição de juros e lucros dos bancos.

O movimento propôs ainda o fim dos apartamentos turísticos e dos incentivos aos nómadas digitais, residentes não habituais e especuladores imobiliários, bem como a colectivização de casas vazias de empresas imobiliárias, fundos de investimento e grandes proprietários.

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Diversas associações juntaram-se no Largo de Camões pela luta ao direito habitacional MATILDE FIESCHI

João Carvalho, de 23 anos, manteve-se do início ao fim na primeira fila do protesto. “Estamos a ser empurrados para fora das zonas onde crescemos, dos bairros onde criamos vizinhanças, do sítio onde temos o nosso trabalho e os nossos hábitos culturais”, disse o jovem de Almada. “Tenho uma perspectiva de ficar em casa dos meus pais até aos 30, 40 ou 50”, expressa, encolhendo os ombros e sorrindo ironicamente, perante a perspectiva de ver “ficar na gaveta” legislativa, mais uma vez, o direito à habitação.

Já tinha marcado presença no protesto de 1 de Abril, mas voltou ao centro de Lisboa para se fazer ouvir: “O Governo escolheu ignorar e continuar a beneficiar quem já lucra e está a fazer das nossas cidades um autêntico parque de diversões”, afirmou João Carvalho.

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Foram vários os cartazes e faixas exibidos no protesto MATILDE FIESCHI

Os tambores atraíam cada vez mais pessoas ao Largo de Camões, que se demonstraram solidárias com a iniciativa. Ao microfone, vários lesados pelo contexto habitacional do país deram a conhecer a sua história.

Sair de casa dos pais é um desafio cada vez maior para jovens como João Sousa, que terminou agora o mestrado em Arquitectura. Veio sozinho, de cartaz na mão, porque se “há três anos era possível dividir casa com muita gente”, hoje nem isso parece ser concebível. “Em toda a Europa estão a surgir crises na habitação, mas aqui toma proporções muito más, especialmente nas oportunidades para os jovens”, lamenta.

"Casa é para morar, não é para especular"

Sob o mote “o Mais Habitação não Serve a População”, os manifestantes maioritariamente jovens repetiram slogans como “estamos fartos de escolher, pagar a renda ou comer” e “casa é para morar não é para especular”.

Para responder à actual crise habitacional, defende o movimento em comunicado, a “falsa solução do Governo” não chega: o apoio à renda revelou-se “débil e temporário” e nada mais é do que uma “manobra irrisória”.

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Diogo Faro defende que o recuo das medidas representa um “camião de areia para os olhos” das pessoas MATILDE FIESCHI

Diogo Faro, apresentador, humorista e activista, afirma que esta é uma luta que tem de ser travada “todos os dias”, já que o pacote Mais Habitação se revelou “completamente ineficaz” e as medidas que foram apresentadas “estão a ser revogadas”. Dá o exemplo das taxas para o Alojamento Local (AL) que baixaram já duas vezes, dos vistos gold “que afinal não vão acabar”, da medida para ajudar as famílias mais carenciadas que “tem afinal uma nova forma de cálculo em que as pessoas vão ter um apoio muito menor do que era suposto”, e de toda uma lista que equivale a um “camião de areia para os olhos” das pessoas.

O protesto de 1 de Abril já tinha levado dezenas de milhares de cidadãos à rua, sob um manifesto subscrito por mais de uma centena de associações em prol do direito a uma habitação condigna. Foram seis as cidades - Lisboa, Braga, Porto, Viseu, Aveiro e Coimbra - que abraçaram o Casa Para Viver, reivindicando a revisão das políticas da habitação.

Esta quinta-feira, várias associações estiveram presentes, como o movimento Porta a Porta, Chão das Lutas, a Habita!, Stop Despejos, o Movimento referendo pela Habitação e outros colectivos nacionais.

À manifestação juntou-se a deputada Mariana Mortágua, coordenadora do Bloco de Esquerda (BE) que declarou que, ao esvaziar as medidas que tinha para os vistos gold e permitir que o seu uso para fundos de investimento, “o Governo cedeu aos interesses imobiliários e financeiros”, deixando “uma sociedade à sua sorte”, sem acesso generalizado à habitação.

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A coordenadora do BE, Maria Mortágua, esteve presente na manifestação MATILDE FIESCHI
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