Dendrofobia, uma patologia autárquica
Tem havido diversas manifestações públicas, na tentativa de travar este derrube de árvores em Coimbra, mas sem qualquer resultado.
Há cerca de meio século que combato a dendrofobia – do grego déndron (árvore) e phóbos (medo patológico, horror, aversão) – que grassa por uma grande parte das autarquias do nosso país.
Começo por Coimbra, cidade onde vivo há cerca de 75 anos e onde se podavam desmesuradamente as árvores das artérias urbanas, particularmente os plátanos que chegavam a ser objeto de completa derrota da ramagem, ficando apenas com o tronco. Viajando pelo país, certifiquei-me de que era prática comum não só no meio urbano como, também, ao longo de vias rodoviárias e ferroviárias. Geralmente as árvores, após a total derrota da ramagem, assemelham-se mais a postes de madeira do que a árvores. Como os plátanos ornamentais são uma espécie híbrida (Platanus x hispanica) resultante do cruzamento do Platanus orientalis, da região mediterrânica oriental ao Irão, com o Platanus occidentalis, do continente norte-americano, resiste a essas derrotas da ramagem, mas já vi ulmeiros e até choupos, transformados em postes lenhosos.
Felizmente, hoje em dia, em muitas autarquias há técnicos conhecedores ou contratam-se empresas com tecnologia e profissionais com a devida formação e, assim, já se efetuam podas e não transformações das árvores em monstruosidades dendrológicas.
Mas, para determinadas obras, as autarquias criam ou contratam empresas para as efetuarem, como, acontece, por exemplo, para construção de novas artérias urbanas, linhas de Metro ou espaços viários destinados a autocarros. Como nessas empresas de construção civil, não há profissionais conhecedores da relevância da biodiversidade e qualidade do ambiente, estão a acontecer não podas, nem derrotas, mas sim derrubes de milhares de árvores, muitas centenárias, parecendo que esses empresários sofrem de dendrofobia.
Por exemplo, o projeto megalómano da Metro Mondego da região Centro, iniciou-se há mais de 30 anos e está transformado não num Metro, mas num transporte público com autocarros que designam por MetroBus. No país conheço Metros de superfície na região do Porto e na de Almada, que até funcionam muito bem e cuja implantação durou menos de três décadas e os promotores e gestores não sofreram de dendrofobia aguda.
Em Coimbra, o derrube de muitas dezenas de árvores, a maioria centenárias, começou, há cerca de uma dúzia de anos. Os frondosos plátanos que formavam a majestosa alameda central da Avenida Emídio Navarro de Coimbra, apareceram miraculosamente todos doentes, o que foi confirmado por duas fitopatologistas do Instituto Superior de Agronomia. Todos, inclusive as fitopatologistas e o Ministério Público, consideraram muito estranho que apenas aquele renque de plátanos, situados na rota pretendida para os autocarros do dito MetroBus estivesse infetado e os do contíguo Parque Manuel Braga não apresentavam a referida patologia (estes ainda lá estão, bem vivos).
Nessa altura, derrubaram os plátanos todos dessa fileira, deixando apenas os últimos do renque por estarem já numa curva e sem a dita fitopatologia. No ano passado, lá viram que esses enormes e centenários plátanos os incomodavam, derrubaram-nos, também.
Mas a dendrofobia tem continuado por várias partes da cidade por onde estabeleceram que os autocarros do MetroBus terão via exclusiva. Já derrubaram árvores de parques, como, por exemplo do Parque do Hospital da Universidade de Coimbra. Sorte (julgo eu) que a dita via exclusiva desses autocarros não chega ao Hospital dos Covões, passe apenas ao lado do Parque de Santa Cruz e não pelo interior deste parque, ou até pelo Jardim Botânico da Universidade de Coimbra, onde já circula um autocarro, no qual nunca viajei, nem viajarei. Pois, se assim fosse, seria um fartar vilanagem. Também tenciono nunca viajar neste MetroBus. Como só utilizo meios de transporte públicos, faço votos que não acabem com as linhas de autocarros que existem na região de Coimbra, como, aliás, acontece nas regiões de Lisboa, Porto e Almada, onde há Metros, comboios e autocarros.
A dendrofobia é uma doença do foro psiquiátrico e, em Coimbra, há o Hospital Psiquiátrico do Sobral Cid. Faço ardentes votos para que não tratem esta gente nesse hospital, porque tem um belo e rico arboreto e, se ali internam pessoal da MetroBus, eles derrubam as belas e majestosas árvores que ali abundam.
Tem havido diversas manifestações públicas, na tentativa de travar este derrube de árvores, inqualificável e invulgarmente numeroso, mas sem qualquer resultado, a MetroBus de Coimbra é ditatorial. Não conheço nada semelhante em qualquer meio urbano, mesmo fora da Europa. Mas nada travou esta dendrofobia do Metro Mondego, posteriormente transformado em MetroBus, que constituiu o maior desastre cultural, ambiental e salutar em meio urbano, que conheço. Coimbra é uma cidade que tem vindo a perder qualidade de vida, ao contrário de outras cidades de Portugal Continental.
Outro exemplo vem do Porto. Tive conhecimento, através da imprensa (não vejo telejornais), que a CP vai derrubar milhares de árvores urbanas para alongamento de algumas vias férreas. Na CP também há dendrofóbicos. Em Coimbra, há alguns anos, derrubaram todos os plátanos que se encontravam ao longo da via férrea (devidamente afastados) entre Bencanta e a estação de Coimbra-B.
Infelizmente, a dendrofobia atinge também governantes. Até já houve um ministro que autorizou o derrube de centenas de sobreiros (creio que cerca de 700). Fantástico!
É fundamental que se acabe com esta dendrofobia para que o nosso meio urbano tenha alguma qualidade de vida, como conheço em vários países europeus e em alguns concelhos do país, como, por exemplo, no de Ponte de Lima e no de Almada, este com o melhor parque urbano de Portugal, o Parque da Paz.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico