Crianças e jovens em acolhimento: da provisão à participação
Sabemos que a participação das crianças em questões que lhes dizem respeito impacta positivamente o seu desenvolvimento.
De acordo com a Convenção sobre os Direitos da Criança (ONU, 1989), ratificada por Portugal em 21 de Setembro de 1990, as crianças devem ver assegurado o direito à participação, nomeadamente, a “exprimir livremente a sua opinião sobre as questões que lhe respeitem”, devendo esta opinião ser tomada em consideração (artigo 12).
Nesta linha, Laura Lundy propôs um modelo de participação das crianças que tem sido utilizado por diferentes organizações com vista à promoção efetiva deste direito em diferentes contextos de desenvolvimento.
O modelo baseia-se em quatro conceitos-chave: Espaço (as crianças devem ter contextos seguros para expressar as suas perspetivas), Voz (devem ser promovidas ou facilitadas diferentes formas de ter voz e de expressar as suas perspetivas), Audiência (estas perspetivas das crianças devem ser ouvidas por quem tem responsabilidade) e Influência (estas perspetivas devem ser consideradas, sempre que apropriado). Apesar destas orientações teóricas e das recomendações nacionais e internacionais neste domínio, nem sempre estão asseguradas as condições para a participação das crianças e jovens.
Não obstante, sabemos que a participação das crianças em questões que lhes dizem respeito impacta positivamente o seu desenvolvimento, sendo que tal se afigura particularmente crítico quando se trata de crianças e jovens em risco e perigo. A Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, na sua revisão de 2015, passou a contemplar o direito das crianças e jovens em acolhimento a serem ouvidos e a participarem ativamente nos diferentes aspetos da sua vida, incluindo o seu projeto de promoção e proteção.
De acordo com o relatório CASA (2022), em 2021, as crianças e jovens em acolhimento consideram que nem sempre as regras são pensadas e discutidas com eles/as, o que nos faz refletir sobre como assegurar mais oportunidades de participação nestes contextos.
Com efeito, um estudo recente que realizámos com profissionais a desempenhar funções em acolhimento residencial em Portugal (Magalhães et al., 2022) revela que recursos humanos qualificados em acolhimento residencial (e.g., empáticos), e que se sentem apoiados pela direção das casas de acolhimento, são percebidos enquanto facilitador da participação neste contexto.
Além disso, embora os profissionais reconheçam que as dificuldades emocionais e comportamentais dos jovens acolhidos podem constituir-se enquanto desafio à promoção da participação, também reconhecem que os benefícios da participação são em larga medida para o ajustamento dos jovens: potenciam o seu empoderamento, bem-estar, competências de vida, autonomia e cidadania.
Por todos estes motivos, e também porque a intervenção em acolhimento residencial é de maior qualidade quando envolve a participação das crianças e jovens, importa assegurar que respeitar os direitos destas crianças inclui, mas não se limita a garantir, os direitos de provisão e proteção. Considerar as crianças e jovens enquanto agentes ativos no seu processo de desenvolvimento, e neste caso, também de promoção e proteção, é fundamental.
A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990