Cansaço: soluções nutricionais práticas para combater a fadiga mental

A cafeína muitas vezes é vista como a “má da fita” e o seu consumo demonizado, mas de facto é possivelmente a substância mais efectiva na redução da fadiga mental, desde que bem utilizada.

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O último café do dia deveria ocorrer 8h a 9h antes da hora de deitar Getty Images

Dormir pouco e/ou mal, acordar já cansado, sair à pressa de casa (com ou sem filhos), trânsito, stress, telefonemas/problemas logo pela manhã, acumulação de vários trabalhos/funções, 8-12 horas de trabalho diário (usando inclusive a hora de almoço para resolver assuntos pendentes), chegar a casa exausto, comer qualquer coisa, dormir, repetir. Para muitas pessoas esta é uma rotina habitual semanal seja por opção, seja sobretudo por necessidade/obrigação profissional. Não é difícil perceber que as mudanças no nosso ambiente profissional que ocorreram nos últimos anos e o facto de estarmos constantemente online deixam o nosso cérebro sobrestimulado durante grande parte do dia.

Como aguentar esta pressão e não “explodir”?

A quantidade de polifenóis da dieta, sobretudo presentes na fruta e legumes (frutos vermelhos, alho, cebola, café, chá verde, brócolos, couves, pimento, tomate, cravinho, açafrão e demais especiarias) ajuda na função cognitiva e neuroplasticidade. Se alguns deles parecem cada vez mais inacessíveis no seu custo, é importante referir que não há a necessidade de os mesmos serem biológicos, uma vez que existem muitos factores que condicionam o total de fitoquímicos com potencial antioxidante nestes alimentos e não é líquido que os provenientes de agricultura biológica possuam uma maior quantidade dos mesmos.

Há muitas vezes a noção de que suplementar um multivitamínico pode corrigir as carências nutricionais de uma má alimentação, mas um estudo recente trouxe uma descoberta interessante. Quando se deu um suplemento rico em vitaminas do grupo B, gingko biloba e outras substâncias, quem teve melhores resultados na melhoria da atenção e diminuição da fadiga mental foram justamente as pessoas que já tinham a melhor alimentação de base, dando ênfase à interação positiva entre os nutrientes já presentes na dieta e a suplementação.

A manutenção de uma glicemia estável ao longo do dia é fundamental para um bom desempenho intelectual, pois estados quer de hipoglicemia, quer grandes descidas (o que ocorre após refeições com excesso de hidratos de carbono/açúcar) têm influência negativa não só no apetite como também na concentração. Uma dica útil é juntar sempre uma fonte de proteína-gordura (iogurtes magros/proteicos, queijo magro, feijões soja tostados, ovo ou frutos gordos), a quantidades moderadas de fruta/cereais/pão nas refeições intermédias.

A cafeína muitas vezes é vista como a “má da fita” e o seu consumo demonizado, mas de facto é possivelmente a substância mais efectiva na redução da fadiga mental, desde que bem utilizada. A sua ingestão no último terço do dia pode de facto diminuir não só o número de horas de sono, mas também a qualidade do mesmo, e se possível o último café do dia (com cafeína, com descafeinado a conversa é outra), deveria ocorrer 8h a 9h antes da hora de deitar, ou seja, por volta das 15h – 16h para quem se deita à meia-noite.

Se também é dos que gostam do célebre quadrado de chocolate negro com o café, saiba que para além do benefício sensorial (que em momentos de stress pode até ser o mais importante), é também possível que interfira positivamente com a função cognitiva.

Muito se fala do papel que os ómega 3 poderiam ter neste processo; no entanto, a prova não é assim tão animadora em adultos como em idades mais precoces e existem factualmente outros suplementos que podem dar uma ajuda maior neste ponto. Um deles é o aminoácido não essencial tirosina (2g a 150mg/kg), que parece produzir efeitos positivos na performance cognitiva, dado ser o precursor da síntese de adrenalina e noradrelina e conseguir dessa forma mitigar o impacto de alguns stressantes fisiológicos, como a privação de sono, ruído e climas extremos – daí ser utilizado com frequência em cenários militares.

A fadiga mental pode estar parcialmente relacionada com uma diminuição da concentração de fosfocreatina a nível cerebral – daí a suplementação com creatina poder ter resultados positivos a este nível. Sendo a evidência ainda reduzida, parece ser promissora quer na melhoria da fadiga mental, quer na memória, para além dos seus efeitos positivos já bem consolidados no desempenho desportivo e massa muscular.

Muitas pessoas estão preocupadas com o facto de beberem muita ou pouca água na óptica do emagrecimento, mas o nosso estado de hidratação tem uma ligação bem maior com outras condições (cálculos renais, infecções urinárias, obstipação), entre as quais também as enxaquecas e a performance cognitiva. Um trabalho já de 2023 observou uma associação positiva entre um estado de hidratação abaixo do desejável e declínio da função cognitiva.

O treino consegue criar uma maior resistência a essa fadiga mental, que pode, todavia, ser contrariada por um comportamento sedentário no resto do dia (mais de 8 horas sentado). Para quem não tem alternativa a trabalhar sentado, fazer pausas mais frequentes e microcaminhadas ou subir/descer escadas, dá sempre uma ajuda neste processo.

A música tem um papel positivo neste tópico, e pode ser útil para quem conseguir trabalhar ao som da mesma ou ouvi-la no carro até casa (poderá em alguns dias mais tensos ser melhor do que ouvir mais um podcast técnico que obrigue a uma manutenção da concentração) e até alguns odores (cítricos, cheiro a relva acabada de cortar, mentol, mel e flores) podem surpreendentemente dar uma ajuda na diminuição da fadiga mental, pela ligação a alguns receptores olfactivos responsáveis pela diminuição da fadiga e da ligação do bulbo olfactivo ao complexo amígdala-hipocampo.

Também a utilização dos smartphones pode representar uma relação de dose-resposta. Se em moderação pode servir para “desanuviar” do trabalho, em excesso pode contribuir para o agravamento dessa fadiga mental e piorar a qualidade do sono, se feita muito em cima da hora de deitar.

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