As aplicações sabem como tornar a sua utilização um hábito. Por exemplo, o Snapchat e o Wordle encorajam os utilizadores a voltar todos os dias, dando-lhes o direito de se gabarem pelo número de dias consecutivos que os usaram.
Também podes sentir mais motivação para fazer uma caminhada para fechar os círculos de actividade do teu relógio. Da mesma forma, para te fazer ir às aulas diariamente, o Duolingo tem “painéis de líderes” que comparam a tua prestação com a de outros utilizadores.
Encorajar hábitos saudáveis, como o exercício físico ou os jogos de palavras, não é necessariamente uma coisa má. Mas até um bom hábito pode cruzar a fronteira e tornar-se um uso excessivo e compulsivo. Estas dicas ajudam-te a reconhecer uma obsessão – e deixamos-te vários passos para retomares o controlo.
Faz uma análise custo-benefício
É difícil ter sempre consciência das razões que nos levam a fazer as coisas que fazemos. Por isso é que temos de nos esforçar e fazer auto-avaliações das funcionalidades como os quadros de liderança, percebendo se nos estão a fazer mal.
“Com base no equilíbrio, será que o comportamento que [estas aplicações] me motivam a ter contribui ou me afasta do meu bem-estar?”, diz Adam Alter, autor de Irresistível: a Ascensão da Tecnologia Viciante.
A medalha que recebeste pelo exercício físico na aplicação Peloton pode motivar-te numa altura em que estás com mais preguiça, admite Alter. Mas se queres tanto essa recompensa que ignoras os sinais do teu corpo, que te pede parar parar, então talvez tenhas uma compulsão pouco saudável.
Se estás preocupado com alguém que pode estar obcecado com um hábito digital, podes tentar ter um momento calmo com essa pessoa para discutir a tua preocupação e como estás a notar os sinais, sugere a psiquiatra Anna Lembke, autora do livro Nação da Dopamina: Encontrar o Equilíbrio na Era da Indulgência. Por exemplo, dizer ao teu namorado que ele corre para o telemóvel de cada vez que tentas conversar com ele.
Instaura “dias de folga”
Alter diz que, durante três anos, foi obcecado com correr 160 quilómetros por mês – e para isso chegava mesmo a correr durante a madrugada ou enquanto estava lesionado. Foi forçado a rever este comportamento depois de adoecer.
Conta que se sentiu aliviado pela pausa forçada. Completar a tua actividade favorita sem um objectivo pode ser libertador, disse. Portanto, pode ajudar se encontrares dias de folga dos teus hábitos – sejam eles a corrida, ler as notícias ou fazer scroll no Instagram. Alter chama-lhes “dias de folga”.
Engana-te
Nir Eyal, autor do livro Indistraível – Como Controlar a Atenção e Dominar a sua Vida, diz que tanto ele como a esposa estavam colados ao telemóvel na hora de dormir e isso estava a afectar os hábitos de sono e a vida sexual dos dois.
Por isso, comprou um dispositivo que, quando ligado a uma tomada eléctrica, desliga o router da Internet às 22h. Eyal ou a mulher podiam levantar-se para voltar a ligar o Wi-Fi. Mas foi o suficiente para acabar com o scroll nocturno, disse.
Outro método que foi útil para uma pessoa que estava a tentar acabar com o hábito de abrir o TikTok foi instalar uma aplicação que obriga a esperar seis segundos antes de os vídeos começarem a reproduzir.
Estes truques não funcionam com pessoas que já tenham hábitos mais sérios e mais semelhantes a uma dependência. Lembke disse que, quando trata pessoas viciadas em jogos ou aplicações, recomenda uma abstenção de um mês. É tempo suficiente para recomeçar o ciclo de recompensas que uma dependência digital instala no nosso cérebro.
Uma pausa de um mês pode não ser possível nem necessária no teu caso. Lembke sugere uma pausa de um dia ou uma semana.
Quando voltares a essa actividade, traça um plano específico. Se o Twitter for o teu problema, podes chegar à conclusão de que podes usar o Facebook, mas não o Twitter. Ou podes decidir deixar de usar o teu telemóvel às 18h. Como preferires.
Mete o teu hábito na agenda
Pode ajudar se planeares actividades que sejam uma distracção, disse Eyal. O autor diz que, todos os domingos, passa dez minutos a planear o seu calendário semanal, com obrigações laborais, tempo para a família e actividades como ler um livro ou exercício físico. Tem até quatro horas reservadas todos os fins-de-semana para a “espontaneidade planeada” com a sua família, para ter a certeza de que esse período não tem interrupções.
E os temporizadores digitais?
O teu iPhone ou Android diz-te quanto tempo passas a usar algumas aplicações e deixa-te impor limites. O TikTok manda uma notificação para avisar quem passa mais de uma hora seguida por dia na aplicação.
Contudo, Lembke alerta: essas funcionalidades não são as melhores para limitar o tempo que passamos nestas aplicações.
O uso excessivo da tecnologia não é apenas da tua responsabilidade
Lembke afirma que as grandes empresas tecnológicas, escolas, instituições sociais e governos têm a responsabilidade de ajudar a redefinir as normas sobre o uso da tecnologia.
"Deixar essa tarefa para as próprias pessoas, ou um país, é uma loucura. É demasiado", diz.
Lembke lembra as escolas que começaram a pôr os telemóveis dos alunos em cacifos, para que não os possam utilizar durante o dia escolar, e elogia os países que limitam o tempo que os jovens podem passar a jogar videojogos ou a utilizar as aplicações dos meios de comunicação social. "A sociedade está sempre a tentar proteger as pessoas de si próprias", disse.
Uma pequena vitória
Pode ser demasiado tentador agarrares-te ao telefone na hora de dormir para dar uma espreitadela rápida ao e-mail e, duas horas depois, dares por ti a fazer scroll.
Alguns estudos indicam que as pessoas são mais felizes se deixarem o telemóvel a carregar durante a noite fora do quarto.
Geoffrey A. Fowler, colunista de tecnologia do The Washington Post, comprou uma caixa que carrega estes aparelhos durante a noite e deixa-a no escritório. Não é uma solução milagrosa, mas colocar impedimentos ao uso do telemóvel na hora de dormir funcionou para Geoffrey e pode funcionar contigo.
Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post