A Astrologia como linguagem filosófica (e útil à sociedade)
“Horóscopos” como frequentemente surgem nas revistas ou jornais, com previsões para cada um dos chamados 12 signos, não são Astrologia, no seu sentido mais sério.
A Astrologia, como disciplina milenar que pretende estabelecer correlações entre eventos celestes e terrestres, tem sido desde sempre alvo de inúmeras polémicas. Neste artigo, chamamos a atenção para alguns dos equívocos mais frequentemente associados e para o sentido de utilidade que os seus adeptos advogam, independentemente da sua catalogação por critérios científicos.
Equívoco 1
“Horóscopos” como frequentemente surgem nas revistas ou jornais, com previsões para cada um dos chamados 12 signos, não são Astrologia, no seu sentido mais sério. Correspondem a uma versão popular e simplista com fins comerciais e de entretenimento. A própria palavra “horóscopo” já remete para uma contradição porque significa “ver a hora” e conhecer, por exemplo, o Ascendente, bem como todas as posições individualizadas dos vários astros. Dizer que esses “horóscopos” são Astrologia é equivalente a dizer que um borrão de tinta num papel é um quadro de Leonardo Da Vinci.
Equívoco 2
Outro equívoco habitual é dizer que os astrólogos desconhecem o movimento de precessão dos equinócios e que, portanto, Constelações e Signos já não correspondem. Na verdade, os astrólogos mais sábios desde a antiguidade até hoje — passando por Ptolomeu, William Lilly (1602-1681) e Dane Rudhyar (1895-1985) — não só conhecem a diferença como até usam os dois Zodíacos em simultâneo. Para assuntos mais individuais, privilegiam o Zodíaco Natural associado ao fluxo de energia das estações do ano. Para assuntos mais coletivos, dão um pouco mais peso às diversas estrelas e Constelações propriamente ditas, tanto as Zodiacais como outras.
Equívoco 3
É comum dizer-se que não há estudos estatísticos que comprovem a Astrologia, pelo menos parcialmente, o que também é falso. Embora o caráter filosófico, hermenêutico e simbólico desta disciplina não se adeque ao método científico vigente — como bem explica o académico Geoffrey Cornelius —, existem alguns estudos estatísticos com resultados significativos. Entre estes, destacam-se os trabalhos de Michel Gauquelin (1928-1991), que estabeleceu correlações entre profissões e posições planetárias à nascença, ou Didier Castille, que encontrou correlação entre casamentos e pessoas de signos solares próximos.
Equívoco 4
Parte-se também do princípio, como resultado do Equívoco 1, que só as pessoas ignorantes e incultas é que se podem interessar por Astrologia. Desde sempre, só grandes sábios e matemáticos, por razões óbvias, se podiam dedicar a esta área. O caso mais paradigmático é o do poeta Fernando Pessoa (1888-1935) que era também um astrólogo de alto nível técnico, construindo os seus heterónimos com base nesta disciplina. Para além do mais, embora seja um facto ainda pouco conhecido, a sua maior obra poética — Mensagem — é um tratado intencional e sofisticado de Astrologia.
Equívoco 5
Afirma-se também que a Astrologia, que se pretende um instrumento preditivo, apenas faz previsões ou afirmações vagas, raramente certeiras. É importante dizer que cada vez menos os praticantes de Astrologia a procuram pelo seu lado preditivo. Na verdade, desde o séc. XX é utilizada sobretudo como linguagem de autoconhecimento. Quanto a previsões certeiras, não podemos dizer, por comparação com a Economia, uma ciência social, que seja menos eficaz. Um caso interessante é o de André Barbault (1921-2019) que antecipou, entre outros eventos mundiais, o colapso do comunismo e a crise de 2020-2021, tendo como uma das possíveis causas uma pandemia.
Utilidade 1
Quanto à sua finalidade principal, poderemos considerar que a Astrologia, que exige anos de estudo e investigação, posiciona-se como uma disciplina social com uma função legítima e útil. Essa função, independentemente da sua validação por meios quantitativos estatísticos, entra nos domínios da metafísica e da filosofia, e preenche uma necessidade humana fundamental: o sentido de propósito e ligação ao todo, ou seja, de espiritualidade.
Utilidade 2
Perante outras áreas da cultura com o mesmo fim, entre elas a própria religião, a Astrologia tem a vantagem de fornecer uma informação individualizada que codifica nos seus símbolos coisas tão importantes como os talentos, áreas de vida, resistências e forças pessoais. Por exemplo, o Ascendente ou ângulo Nascente (o Leste) é um indicador simbólico da missão de vida e característica destacada da personalidade.
Utilidade 3
Para além de ajudar a revelar um “mapa” de talentos específicos e de potencialidades, a Astrologia Humanística também permite identificar os ciclos de aprendizagem que a pessoa está a viver. Estes poderão ser de maior facilidade ou de maior desafio, mas o seu aproveitamento, tal como o dos próprios recursos, não está escrito nas estrelas e depende da ação individual.
Utilidade 4
Ao nível coletivo, verdade seja dita, também podemos dizer que a linguagem da Astrologia ajuda a entender os ciclos que a sociedade está a viver e para onde se dirige, em termos de propostas de evolução, como aconteceu no tema aquariano da pandemia.
Resumindo, para além dos equívocos mencionados, a Astrologia sobrevive e reinventa-se, integrando cada vez mais outras áreas do saber — desde a História até à Psicologia — estando em permanente evolução. Pelas razões referidas, e por ajudar a responder à grande questão existencial, ainda que seja incompreendida por muitos, merece ser respeitada por todos.
Lisboa, 1 de janeiro de 2023
O autor escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990