O cinema contra o cinismo
Um ano com Allan Dwan, limpeza do olhar contra o cinismo, com uma das grandes primeiras obras do cinema português, Passagem ou a Meio Caminho,, com a ficção religada à vida por Ryûsuke Hamaguchi
No ano da morte de Jean-Luc Godard, vi no São Jorge, numa longa manhã de Outono, a versão original de Oito tiros fatais (Kahdeksan Surmanluotia, 1972) de Mikko Niskanen (1929-1990). Nessas cinco horas em que a duração é essencial, o que vi não foi a saga familiar que retrata as dificuldades de vida numa remota região europeia, nem o declínio da pequena agricultura, nem a abordagem do alcoolismo. Em tudo isso, e como sempre no trabalho dos grandes realistas, o que vi, passo a passo, foi a própria construção do mundo em que hoje vivemos e da violência total que lhe subjaz. No mesmo Doclisboa, um outro filme sublime fez raccord com esse: A morte de uma cidade, de João Rosas, que, partindo de quase nada, vai, como o anterior, crescendo dentro de nós, e no qual, neste caso sem explosão de violência e com infinito pudor, também vi, não a “cidade” mas o “mundo”, e o deserto de humanidade que dele continuamos a fazer.
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