Ao longo dos séculos, tem havido todos os anos milhares de peregrinos a viajarem para o local chamado de Betânia do Além-Jordão, na Jordânia, na margem oriental do rio Jordão, ponto que os cristãos acreditam ser o exacto local onde Jesus foi baptizado.
Este número poderá aumentar para um milhão de visitantes por ano caso avance o projecto de construir uma "cidade turística" adjacente a este sítio Património Mundial da UNESCO. Trata-se da proposta de um projecto – faseado em seis anos, estimado em 300 milhões de dólares (cerca de 282 milhões de euros).
Entre os que se reuniram na margem do rio na semana passada, para assistirem à apresentação da proposta, encontravam-se o rei Abdullah da Jordânia e o patriarca maronita do Líbano Bechara Boutros Al-Rai, além de arquitectos, curadores de museus e investidores.
Os responsáveis pelo projecto esperam que com lojas de souvenirs e trilhos pedestres, hotéis boutique e jardins botânicos, o local – que se encontra fora dos limites formais da área do baptismo – venha a atrair cinco vezes mais visitantes do que os actuais 200 mil por ano. E defendem que ajudará a preservar a decrescente presença cristã da região.
Contudo, o projecto ainda necessita de financiamento, e está a ser apresentado aos líderes cristãos de todas as denominações do Médio Oriente e não só, na esperança de que ajude a atrair as contribuições de doadores, investidores e igrejas.
O rei Abdullah tem sido elogiado pelos líderes cristãos por fomentar a harmonia religiosa na população maioritariamente muçulmana da Jordânia, oferecendo terras a igrejas e centros de peregrinação.
"Isto ajuda os cristãos do Médio Oriente a preservar a sua presença e o seu credo", disse Al-Rai, que é o principal clérigo cristão do Líbano, à Reuters após uma cerimónia que contou com a presença do monarca e onde foi revelado o plano director do projecto. Betânia do Além-Jordão, a cerca de 50 km a oeste de Amã, é um local mencionado no Evangelho segundo São João como o lugar onde João Baptista baptizou Jesus.
Extensas escavações desde meados dos anos de 1990 têm desenterrado ruínas de igrejas, piscinas baptismais e grutas que mostram que era já um local de peregrinação cristã no século IV.
Nos últimos anos, a construção não regulamentada de enormes edifícios e igrejas por igrejas concorrentes alterou a paisagem outrora imaculada.
Os responsáveis pelo projecto dizem que o seu objectivo é preservar o local e a sua história antiga. "Estamos a falar de pedras rústicas e seixos em desenhos arquitectónicos que preservam a natureza primitiva do local e asseguram que a santidade e espiritualidade que existiam há 2000 anos não serão pisoteadas por nenhum desenvolvimento" urbano, disse Kamel Mahadin, o arquitecto de 67 anos por trás dos projectos e que apresentou o plano director.
"Não estamos a falar de uma paisagem futurista high tech", comentou. Mahadin tinha antes guiado clérigos e possíveis financiadores pelas planícies montanhosas circundantes, deixando alguns deles fascinados.
"A extraordinária ressonância desta paisagem, e o significado do evento na história da Humanidade, abalam-nos até ao fundo da alma", disse John Booth, presidente da National Gallery britânica, que assistiu à apresentação.
Samir Murad, um antigo ministro e empresário que preside à fundação independente sem fins lucrativos criada por lei para supervisionar o projecto, disse que não seriam usados fundos estatais nem vendidos terrenos a investidores estrangeiros.
As suas promessas destinam-se a dissipar os receios de especulação e sobrecomercialização, embora alguns se mantenham cépticos.
O investigador evangélico baptista jordano Philiph Madanat diz que devem ser implementadas directrizes rigorosas para garantir a transparência e evitar o abuso de fundos, dado que seria o primeiro sítio cristão gerador de dinheiro do reino.
"Esta é uma tentativa de usurpar o espírito religioso." É inédito ter um sítio sagrado cristão deste tipo utilizado para tal fim na Jordânia", acrescentou Madanat.
O sobredesenvolvimento futuro alteraria um habitat selvagem que tem sido em grande parte deixado intacto desde tempos bíblicos.
Camelos e ovelhas pastam numa paisagem salpicada de tamargueiras e diospireiros em cenas que se mantêm inalteradas desde há 2000 anos, e alguns clérigos dizem que é assim que deve permanecer, insistindo na santidade do local.
Mas para outros líderes da igreja local e da Jordânia em geral, os peregrinos de todo o mundo trariam receitas muito necessárias num país onde o turismo representa actualmente cerca de 20% da economia.
O Banco Mundial defende que o ressurgimento do turismo pós-covid ajudaria a impulsionar a recuperação económica da Jordânia da crise dos últimos anos.
"Conduzirá à prosperidade quando os turistas, que virão comprar souvenirs e adquirir serviços, ajudarem assim a comunidade local e o país em geral", disse o padre Ibrahim Dabbour, secretário-geral da Assembleia dos líderes cristãos da Jordânia que representa todas as denominações.