Os gatos não evitam os estranhos que não ajudam os donos, ao contrário dos cães

Esta acção não significa que os gatos são indiferentes ou não têm relação afectiva com os donos. Na verdade, estes animais podem não se aperceber que o desconhecido teve um comportamento negativo.

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Ao contrário dos cães, os gatos não evitam as pessoas que se portam mal com os donos Andrew S/Unsplash

Há um antigo estereótipo sobre a diferença entre cães e gatos. Os cães são carinhosos e extremamente leais, dizem, enquanto os gatos são distantes e indiferentes. A maioria das pessoas que gosta de gatos provavelmente discorda – eu tenho alguma dificuldade em acreditar, com a minha gata a ronronar no meu colo, que ela não se preocupa comigo.

No geral, a investigação sobre a cognição dos gatos sugere que os felinos estabelecem laços emocionais com os humanos com quem vivem. Estes animais parecem sentir ansiedade de separação, são mais receptivos à voz dos donos do que à de estranhos e procuram a tranquilidade dos tutores em situações assustadoras.

Mas um novo estudo, realizado por investigadores no Japão, complica o retrato da nossa relação com os gatos. Ao adaptar um método utilizado anteriormente para estudar cães, os investigadores concluíram que os felinos – ao contrário dos cães – não evitam pessoas desconhecidas que se recusam a ajudar os donos.

Na experiência, um gato ficou a observar o dono que tentava abrir uma caixa para tirar algo do interior. Dois estranhos sentaram-se de cada lado da pessoa, que se virou para um deles e pediu ajuda. Nos ensaios “de ajuda”, o desconhecido ajudou o dono a abrir a caixa. Nos ensaios “sem ajuda”, o desconhecido recusou. O outro estranho sentou-se passivamente, sem fazer nada.

Depois, os dois desconhecidos ofereceram uma guloseima ao gato, e os cientistas observaram a qual deles é que o animal se aproximava primeiro. Será que preferiu aceitar a comida do ajudante do que a do espectador passivo? Isto indicaria um desvio de positividade, evidenciando a interacção prestável que fez com que o gato fosse mais afectuoso com o desconhecido.

Ou será que evitou aceitar comida do não-ajudante? Este desvio de negatividade pode significar que o gato se sentiu desconfiado.

Quando este método foi utilizado para testar cães, estes animais mostraram um claro desvio de negatividade. Preferiram não aceitar comida de um estranho que recusou ajuda ao dono. Em contrapartida, os gatos deste novo estudo são completamente indiferentes. Não mostraram preferência por quem foi prestável e não evitaram a pessoa que não foi. Aparentemente, no que diz respeito aos gatos, comida é comida.

Sinais sociais

O que devemos retirar disto? Uma conclusão tentadora seria que os gatos são egoístas e importam-se menos com a forma como os donos são tratados. Embora isto se possa encaixar com as nossas ideias preconcebidas sobre os felinos, é um exemplo de desvio antropomórfico. Implica interpretar o comportamento dos gatos como se fossem pequenos humanos peludos, em vez de criaturas com maneiras de pensar distintas.

Para compreender realmente estes animais, temos de sair desta mentalidade centrada no ser humano e pensar neles como gatos. Quando o fazemos, o que parece mais provável não é que os gatos neste estudo são egoístas, mas que não foram capazes de captar as interacções sociais entre os humanos. Não estavam conscientes que alguns dos desconhecidos não estavam a ser prestáveis.

Embora os gatos sejam capazes de captar alguns sinais sociais humanos – podem seguir a orientação humana e são sensíveis às emoções das pessoas – estão provavelmente menos sintonizados com as nossas relações sociais do que os cães.

Os gatos foram domesticados mais recentemente e, durante o processo de domesticação, foram muito menos transformados do que os cães. Enquanto os cães são descendentes de animais de matilha social, os antepassados dos gatos eram maioritariamente caçadores solitários. A domesticação provavelmente aumentou as capacidades sociais existentes dos cães, mas pode não ter feito o mesmo com os gatos, que eram menos conscientes a nível social. Portanto, não devemos ser demasiado rápidos a concluir que os nossos gatos não se importam se as pessoas são más para nós. O mais provável é que simplesmente não consigam perceber.

Apesar de serem populares, ainda sabemos pouco sobre a forma como os gatos pensam. Investigações futuras poderão mostrar que a compreensão destes animais em relação aos seres humanos é ainda mais limitada do que actualmente pensamos. Em alternativa, pode acontecer que os gatos sejam mais capazes de reconhecer a dinâmica social humana em diferentes contextos.

Mas independentemente do que os estudos revelam, devemos evitar deixar que preconceitos ou antropomorfismo conduzam à nossa interpretação do comportamento dos gatos. Antes de julgarmos os nossos amigos felinos como indiferentes ou egoístas, deveríamos primeiro tentar olhar para o mundo através dos olhos deles.


Exclusivo P3/The Washington Post
Ali Boyle é especialista em filosofia da mente e ciência cognitiva. É professora assistente de Filosofia na London School of Economics and Potical Science.

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