Saber largar
Talvez largar seja acarinhar os nossos falhanços, acolher no nosso coração essas pessoas que se cruzam no nosso caminho, perceber que, mesmo quando a dor nos parece insuperável, crescemos com todas essas experiências.
Tenho pensado muito nas mulheres da minha vida. Nas escolhas que fiz, nas relações falhadas, nas pessoas que posso ter magoado, naquelas que me terão magoado. O que terá falhado? Onde terei errado? Porque é que sentimos por vezes que alguém tem (quase) “tudo” e ainda assim não nos é suficiente? É possível que a pessoa certa entre na nossa vida na altura errada? Se fosse hoje funcionaria? Ainda fugiriam comigo se lhes pedisse? Aposto que a minha psicóloga já está a tirar notas para a nossa próxima sessão.
Penso nisto porque muitas dessas mulheres estiveram esta semana em Lisboa e em Gaia para assistir às apresentações do meu mais recente livro, Chefs Sem Reservas: Segundo Prato. Ao vê-las ali, felizes pelo meu sucesso, percebo que talvez não tenha realmente falhado. Percebo que talvez largar não seja bem largar. Que largar o que sentimos por alguém não significa largar essa pessoa. Que de muitos dos meus falhanços sentimentais nasceram algumas das amizades mais bonitas da minha vida.
Talvez largar não signifique sequer largar o que sentimos por alguém. Não signifique que deixemos de a amar ou de a desejar. Que a esqueçamos, apaguemos o seu número de telemóvel, a bloqueemos nas redes sociais, que cortemos qualquer contacto. Talvez largar seja acarinhar os nossos falhanços, acolher no nosso coração essas pessoas que se cruzam no nosso caminho, perceber que, mesmo quando a dor nos parece insuperável, crescemos com todas essas experiências.
Talvez largar seja aceitar. Aceitar que o amor é um jogo de tentativa e erro, e falhamos muito mais do que acertamos. Cuidemos então dos nossos falhanços. Deles podem nascer coisas bem bonitas.