Como combater os incêndios florestais? Com brigadas de animais selvagens
Precisamos de soluções novas. Uma solução pouco discutida é a abordagem ecocêntrica e que considera as soluções de base natural, na forma de brigadas de animais selvagens: veados, corços, cabras montesas, muflões, javalis, cavalos selvagens ou vacas selvagens.
Incêndios, um clássico antigo, um tema cada vez mais recente e uma realidade certa para o futuro. Porque arde Portugal é a pergunta do Verão.
O fogo é um processo natural de ecossistemas mediterrâneos: a casca do sobreiro e a resistência de várias plantas são prova dessa evolução. Incêndios a cada 50 ou 70 anos seriam normais, o que não é normal são a frequência e intensidade dos “novos” incêndios. Essa frequência anormal é o resultado do ser humano - em Portugal, perto de 95% a 97% das ignições são causadas pelas pessoas, quer por acções intencionais ou negligentes. Com as alterações climáticas a tornar a Península Ibérica mais quente e seca, a probabilidade de ignições se tornarem em incêndios severos é cada vez maior.
Mas o que transforma uma ignição num incêndio grave?
No passado, a agricultura de subsistência usava cada pedaço do território. Florestas e matos eram raros. No século XIV, a paisagem era praticamente desprovida de árvores, prova disso é o facto de em Portugal o esquilo ter estado extinto desde o século XV até meio do século XX, um caso único na Europa. O êxodo rural e o abandono agrícola que começaram a meio do século XX e que continuam até aos dias de hoje estão a transformar pouco a pouco antigas áreas agrícolas “sem combustível”, pouco inflamáveis, em matos e florestas densas, “com combustível” bastante inflamável.
Para além da falta de ordenamento claro do território nacional e de espécies invasoras incendiárias, como o eucalipto ou a acácia, dominarem a nossa floresta, controlar a quantidade de biomassa na paisagem é chave - ervas, arbustos, árvores, os chamados “matos”, que são o combustível para muitos dos incêndios.
Para resolver o problema da biomassa na paisagem há várias abordagens. A abordagem tradicional coloca o ser humano no centro da discussão, com sapadores florestais (uma medida cara, com uso intensivo de pessoas e recursos), com pastores (dependente de subsídios e de pessoas dispostas à vida dura do campo), com práticas agrícolas subsidiadas para criar descontinuidade na paisagem (cara e com fracos resultados para a vida selvagem), com queimadas controladas (uma acção que não recupera habitats, não cria florestas, nem armazena carbono). Todas podem ser soluções pontuais mas não podem ser usadas para gerir uma área tão extensa como Portugal continental. Pensar que se pode gerir perto de 92 mil quilómetros quadrados, a área total do país, pela mão do ser humano, não só é caro como é uma estratégia destinada ao fracasso.
Precisamos de soluções novas. Uma solução pouco discutida é a abordagem ecocêntrica e que considera as soluções de base natural, na forma de brigadas de animais selvagens: veados, corços, cabras montesas, muflões, javalis, cavalos selvagens ou vacas selvagens. Uma espécie é chave: o castor, que armazena água na paisagem, restaura zonas húmidas e cria verdadeiros corta fogos na paisagem. O impacto nos EUA é impressionante.
Estes animais são jardineiros da paisagem, que através do pastoreio natural (natural grazing) alteram a estrutura da vegetação e a quantidade de combustível na paisagem. Criam um mosaico entre zonas abertas, com clareiras, zonas com arbustos e zonas florestadas. Cada uma das espécies isoladas são jardineiros incompletos: é preciso diversidade de animais e em bons números para gerir a paisagem. Paisagens vivas armazenam e retêm carbono, mitigam e adaptam a paisagem às alterações climáticas, combatem a perda de biodiversidade e trabalham “à borla”, não é preciso pagar a animais selvagens.
Em tempos antigos, os herbívoros selvagens faziam a gestão da quantidade e estrutura dos matos. No passado, animais domésticos e a agricultura limpavam a paisagem. Hoje, a função está ausente e precisamos de fazer uma escolha. A solução mais económica, resiliente e com melhores resultados para o ser humano e a biodiversidade é clara. Brigadas de animais selvagens.