Quem quer investir na floresta? Imaginem o que podíamos todos ganhar
Gerimos o território florestal (mais de 95% privado) com leis e decretos, que obrigam ou condicionam os proprietários, mas raramente apresentamos soluções que os ajudem a valorizar os seus terrenos para, pelo menos, terem receitas que cubram os custos de gestão.
Sou um biólogo jovem à procura de novas formas de gerir e valorizar o território, dado que a forma como o fazíamos no passado e os modelos usados actualmente (claramente!) não estão a funcionar. Nasci, cresci, vivo e trabalho no norte de Portugal, onde ninguém sabe de quem são os terrenos rurais, em que a desvalorização do uso tradicional do território rural leva ao seu abandono e/ou à transformação da tradicional matriz heterogénea da paisagem em extensas monoculturas agrícolas e florestais.
Esta desvalorização leva a que ocorra um acumular de biomassa vegetal nos espaços florestais e que, eventualmente, incêndios provocados por mão humana consigam proliferar da forma como temos visto. Mas isto é um pouco mais complexo. O acumular de biomassa tanto ocorre em espaços abandonados como em áreas de produção florestal onde a gestão é minimalista (maior parte dos casos geridos por particulares). Para resolver o problema da acumulação da biomassa inventámos as “limpezas florestais”, o processo de remoção ou degradação de matos que não permite o seu acumular excessivo num espaço, que sempre ocorreu em Portugal, por acção humana ou natural.
As alterações humanas de um determinado território, por exemplo, para a instalação de monoculturas, alteram negativamente as redes ecológicas previamente existentes, expulsando ou extinguindo a maior parte das espécies que ocorriam no espaço, persistindo apenas as que são mais resilientes (muitas vezes com algum potencial infestante, no caso das plantas temos os tojos ou silvas, ou potencial invasor, como as acácias). Estas espécies resilientes evoluíram para possuir características ecológicas que lhes permitem dominar os espaços rapidamente, principalmente quando não ocorrem outras espécies que as poderiam controlar.
A redução generalizada de biodiversidade dos habitats leva a que haja menos organismos capazes de ajudar a controlar a expansão destas espécies — no seu crescimento, onde herbívoros (grandes mamíferos mas também pequenos invertebrados) comem uma grande quantidade da sua biomassa vegetal; na sua reprodução, onde organismos parasitas, parasitóides e galhadores limitam o número de sementes produzidas (hoje importamos espécies para, por exemplo, controlar plantas invasoras); na sua degradação e decomposição, onde seres vivos especializados na degradação da matéria permitem que não se acumule depois de morta.
Limpamos as florestas porque não só degradamos os mecanismos naturais de regulação da acumulação da biomassa florestal como também já não valorizamos as florestas pelos serviços que nos prestam. Não teremos então de recriar as redes ecológicas enquanto valorizamos tudo o que estes espaços nos dão?
Estamos a falhar há demasiado tempo. Falta-nos criatividade. Falamos de investir na prevenção, melhorar a gestão e ordenamento, reforçar a vigilância e reflorestar ou arborizar o território com árvores nativas. Mas isto não acontece tudo se nos focarmos essencialmente em investir na valorização das florestas?
Temos gerido o território florestal (que mais de 95% é privado) com leis e decretos, que obrigam ou condicionam os proprietários de alguma forma, mas raramente apresentamos soluções que os ajudem a valorizar os seus terrenos para, pelo menos, terem receitas que cubram os custos de gestão. Não havendo uma mais-valia na gestão activa do espaço florestal, não há também investimento (público ou privado) para esta ser feita.
Exigimos assim que as florestas sejam geridas como um bem comum, de todos, mas esquecemo-nos que são os proprietários que têm custos diários com a gestão dos seus espaços quando 20% da população portuguesa se encontra em risco de pobreza e o sector florestal enfrenta diversos desafios, não havendo mercado para uma grande parte dos produtos ou serviços florestais que poderiam potenciar o investimento.
A floresta é um activo gerido para dar o máximo valor aos seus proprietários. E este valor é o retorno financeiro resultante dos serviços de ecossistema passíveis de usufruir em determinado local. Serviço de ecossistema é tudo o que a natureza nos dá. Numa floresta temos a provisão de madeira e frutos, que facilmente associamos a um preço de venda, mas também temos turismo de natureza, regulação dos ciclos de carbono e nutrientes, da água e da temperatura, entre tantas outras coisas (grande parte providenciados pela biodiversidade existente em cada local).
Têm surgido projectos emergentes que valorizam a preservação e restauro ecológico de florestas nativas em todo o mundo, inclusive em Portugal, permitindo implementar novas formas de investir no território gerindo os problemas existentes. Estes projectos começam a ser pensados e implementados pelo Estado, através da nova política para a provisão e remuneração de serviços dos ecossistemas em espaços rurais em Portugal ou até por entidades privadas como a Forest Stewardship Council (FSC), através da Certificação dos Serviços de Ecossistema ou a Verde, que criou o Projecto Carbono Biodiverso, onde qualquer pessoa ou empresa pode financiar acções de restauro ecológico e a preservação e/ou gestão sustentável da floresta nativa.