Depois de 100 milhões de euros gastos, marina na Madeira vai ser desmontada e renaturalizada

Foram, literalmente, 100 milhões de euros atirados ao mar. A Marina do Lugar de Baixo, na Ponta do Sol, Madeira, inaugurada em 2004 só funcionou alguns meses. Vai ser desmontada e o espaço renaturalizado.

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Espaço vai ser renaturalizado RG Rui Gaudencio

Começaram por ser 29,7 milhões de euros, que derraparam durante a construção para mais de 36 milhões de euros. Quando Miguel Albuquerque chegou pela primeira vez ao Governo Regional da Madeira, em Março de 2015, a conta da Marina do Lugar de Baixo, entre projecto, construção, adaptações e sucessivas reparações, já andava próximo dos 110 milhões de euros.

O sucessor de Alberto João Jardim mandou parar o investimento público naquela infra-estrutura situada no concelho da Ponta do Sol, a menos de 25 quilómetros a Oeste do Funchal, anunciando o desmantelamento dos equipamentos para a reutilização em outros empreendimentos públicos. Agora, depois de quase uma década de abandono, o executivo madeirense quer renaturalizar o espaço, e devolvê-lo à população.

A oposição desconfia, mas Albuquerque garante que qualquer investimento que tenha que ser feito, não vai “onerar mais os contribuintes” madeirenses.

“Nós estamos a pensar renaturalizar o espaço, mas tem de ser feito de uma forma que não implique investimentos para governo [da Madeira], que neste momento não são sequer aceitáveis que o contribuinte continue a suportar”, explica o chefe do executivo regional, adiantando que a ideia passa por retirar os elementos “dissonantes e perigosos” e proteger a escarpa. “No fundo, é abrir aquele espaço à população”, diz, ressalvando que o local não será uma zona balnear, por não ter condições de segurança.

A renaturalização da marina, garante Albuquerque, não avança este ano. Pedro Fino, secretário regional de Equipamentos e Infra-estruturas, adianta ao PÚBLICO que o projecto está em avaliação. “Neste momento estamos a realizar os estudos necessários tendo em vista a concretização desse mesmo objectivo [devolução do espaço à população], por isso ainda é prematuro avançar com qualquer solução sem o resultado e análise desses mesmos estudos”, enquadra o gabinete do secretário regional.

Inaugurada à beira das eleições regionais de 2004, a Marina do Lugar de Baixo foi projectada para acolher 297 embarcações entre os oito e os 25 metros mas ficou inoperacional pouco tempo depois. Sucessivos episódios de mau tempo danificaram a muralha de protecção do empreendimento que, apesar dos investimentos posteriores no reforço e consolidação feitos pelos governos de Jardim, nunca conseguiu contrariar as especificidades das correntes marítimas daquela zona. Às fragilidades da infra-estrutura juntaram-se problemas com a localização da zona balnear anexa ao espaço, que acabou por ficar interditada devido ao risco de queda de pedras da encosta sobranceira.

Apesar de pareceres técnicos apontaram noutro sentido e da população local desaconselhar a construção na zona, Jardim insistiu sempre na recuperação da obra. Primeiro, canalizando verbas do orçamento regional, e depois aproveitando a Lei de Meios, aprovada em 2010, após negociação entre os governos da República e da região autónoma, para responder às necessidades de reconstrução da ilha, após o temporal de 20 de Fevereiro desse ano.

Bastante contestada, a obra, que apenas esteve operacional durante alguns meses, foi sempre apontada pela oposição como um exemplo das políticas despesistas de Jardim, que nesse mesmo ano, na Calheta, a 10 quilómetros do Lugar de Baixo, facilmente percorridos em menos de 15 minutos de automóvel, investiu outros 28 milhões de euros num porto de recreio.

Já sem Jardim no governo, a marina foi tema de uma comissão de inquérito no parlamento regional, que pretendia apurar responsabilidades políticas pela infra-estrutura. João Cunha e Silva, antigo vice-presidente dos governos de Jardim, que tinha responsabilidades nas Sociedades de Desenvolvimento – empresas públicas criadas para contornar o envidamento zero a que as regiões autónomas estavam obrigadas pela Lei de Estabilidade Orçamental, e que construíram entre outros equipamentos, aquela marina –, admitiu a existência de um estudo da Universidade de Aveiro a desaconselhar a obra naquele local. A decisão, disse no parlamento, foi política. Mas a comissão parlamentar terminou sem apontar responsabilidades pela obra de 100 milhões de euros.

Albuquerque prefere olhar para a frente. “Não nos podemos auto-flagelar”, defende, justificando a decisão política do antecessor com estudos técnicos que estavam errados. “Foi uma decisão política, com base numa decisão técnica”, sublinhou, lembrando que está a decorrer um processo judicial em que a região pede uma indemnização à empresa responsável por esses estudos.

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