A generalidade das religiões, com um maior enfoque naquelas que são hegemónicas nas sociedades ocidentais, repudiam vivamente práticas que não se coadunem com uma visão patriarcal e heterossexual da família, dos costumes e dos tratos sociais.
A Igreja Católica tudo faz para perseguir a comunidade LGBTI+, seja no passado, através de violência e liquidação dos seus membros; seja no presente, com o recurso a discursos profundamente homofóbicos e a sucessivos processos de exclusão (formais ou informais) de crentes, que querem viver em plenitude aquela que é a sua orientação sexual. Apesar das tentativas de marketing feitas pelo actual Papa - que ora é a favor do acolhimento pela Igreja de pessoas LGBTI+, ora defende que Deus não pode abençoar formas de amor que não sejam feitas entre um homem e uma mulher -, a discriminação e o medo persistem.
Estes actos de discriminação, de variados tipos e níveis, têm impactos extremamente negativos para o desenvolvimento de qualquer pessoa LGBTI+. Quer pelo facto de poderem ser crentes e viverem numa contradição constante, que atrozmente os persegue, quer pelo impacto que terá no seu próprio núcleo familiar, instigado a oprimir o indivíduo por motivações religiosas.
Este tipo de atitudes homofóbicas são fundamentadas pelos discursos inflamados proferidos por líderes religiosos, que tentam fazer valer e reproduzir as actuais normas ultraconservadoras. Estes actos não se cingem à Igreja Católica, mas fazem parte da generalidade das demais religiões.
A título de exemplo, as Testemunhas de Jeová são talvez a religião que mais discrimina, de uma forma abominável, a comunidade LGBTI+ em Portugal. Se um jovem que seja Testemunha de Jeová, que, por norma, vive com a sua família igualmente crente, ousar dizer que não é heterossexual de forma convicta, este sofre represálias que não são aceitáveis numa sociedade democrática. Inicialmente são marcadas reuniões constantes de modo a compreender se a pessoa foge do padrão heteronormativo - não havendo qualquer comportamento que fuja “à norma vigente”, a pessoa LGBTI+ é controlada constantemente, para “não pecar”. Caso o indivíduo queira viver uma vida digna e de cabeça erguida perante sua orientação sexual, é enviada uma directriz, por parte dos Anciões, a todos os membros da comunidade onde se insere, que anuncia que essa pessoa deixará de ser membro da religião, tornando-se assim um “desassociado”. A partir desse momento, segundo as normas desta religião, toda a comunidade estará expressamente proibida de comunicar com a pessoa que se assumiu LGBTI+, incluindo a família mais próxima.
Assim, para além de em inúmeros casos serem expulsas de casa - quando ousam sair do armário e procurar um pingo de felicidade - perdem o vínculo com todos os seus amigos crentes (que, no caso desta religião, são a esmagadora maioria das suas relações sociais) e são atiradas para a rua sem um único apoio ou amparo. Este processo cria danos irreversíveis, que podem conduzir a depressões graves, situações de precariedade extrema, uma exclusão social inadmissível e em casos extremos ao suicídio. Em suma, o Testemunha de Jeová LGBTI tem três opções: esconder-se a vida toda, ser constantemente vigiada ou perder todos os seus contactos, e em alguns casos o próprio texto.
Portugal poderá fazer história ao ilegalizar as terapias de conversão, sendo esse um passo importante para que possamos caminhar para uma sociedade progressista. Mas não basta. Respeitando sempre o princípio da liberdade religiosa, é pertinente que o país tenha um debate acerca de políticas públicas que protegem a comunidade LGBTI+, vítima das demais religiões, de modo a que se possa ter a consciência do real impacto destas opressões. São precisas casas de acolhimento, psicólogos, educação escolar, acções da CPCJ, alterações legislativas e tantas outras políticas públicas. O país precisa de responder aos milhares de bissexuais, lésbicas, gays, pessoas “trans” e tantos outros membros da comunidade queer, que vivem com um medo profundo, devido às amarras que as demais religiões lhes impõem.
Em jeito de conclusão, cito, tal como no título do presente artigo, a artista e activista brasileira Linn da Quebrada: “Não queimem as bruxas, mas que amem as bichas, amem, Ámen!”