Seremos nós o futuro?
As instituições têm feito um esforço crescente para ouvir as vozes das organizações juvenis, nomeadamente o Parlamento Europeu através da sua Unidade de Proximidade com os Jovens. Por todas as limitações que esta unidade tem, e são várias, o primeiro passo está lá, e porque não continuar a apostar nela?
Nos passados dias 8 e 9 de Outubro desloquei-me ao Parlamento Europeu, em Estrasburgo, para participar no Evento Europeu da Juventude (EYE, do inglês European Youth Event). Realizado pela primeira vez em formato híbrido devido às restrições da covid-19, 10 mil jovens europeus participaram em diversas actividades – com mais de 4500 a marcarem presença em Estrasburgo nos dias 8 e 9. Com o mote “O Futuro é Nosso”, foi o regresso em grande aos tempos pré-pandémicos, mas nem isso chegaria para salvar o evento. Ignorando todos os problemas organizacionais, indubitavelmente infantis para uma instituição como o Parlamento Europeu, o que mais me chocou foi o quão desconectada da realidade, vazia e acrítica a juventude europeia se encontra - ou, pelo menos, a juventude presente no EYE, o que é em si um sintoma do problema.
Anunciado com entusiasmo como parte integral da Conferência sobre o Futuro da Europa, actualmente a decorrer, o EYE foi promovido como o evento em que os jovens poderiam dar a sua contribuição, onde seriam ouvidos e as suas ideias teriam peso. Infelizmente, aquilo que acabei por testemunhar foi exactamente o oposto: vi ideias pobres a serem aclamadas em detrimento de ideias com cabeça, tronco e membros; vi, em toda a sua plenitude, a tremenda falta de competências por parte da juventude no que toca à criação de ideias com medidas concretas de acção; vi falta de abertura e vontade por parte das instituições em incluir os jovens nos processos criativos; vi secções inteiras da juventude europeia a não terem lugar para se expressar; houve até lugar para ataques a minorias por parte de grupos de extrema-direita presentes no evento.
Aquilo que deveria ser o esplendor da juventude europeia acabou por ser a prova máxima da sua inaptidão para assumir as rédeas da vida política, e isto é não só preocupante para o futuro, como demonstra como temos falhado às gerações mais novas naquela que deveria ser a sua componente formativa mais forte, o sentido de dever e participação cívica.
Temos de exigir mais das nossas instituições. Este processo formativo tem de ser completamente repensado para que eventos como este possam assumir todo o seu potencial. Contudo, a juventude também não está isenta de culpa, temos de fazer mais e melhor com as oportunidades que nos são dadas, temos de abrir o caminho a uma melhor formação dos nossos pares, e, nos dias que correm, a nossa irreverência e inconformismo têm de ser os nossos maiores aliados. Não podemos cair nos mesmos erros que as gerações que nos antecederam - e, enquanto não mudarmos, continuaremos nesse sentido.
Mas talvez existam motivos para ter esperança: as instituições têm feito um esforço crescente para ouvir as vozes das organizações juvenis, nomeadamente o Parlamento Europeu através da sua Unidade de Proximidade com os Jovens. Por todas as limitações que esta unidade tem, e são várias, o primeiro passo está lá, e porque não continuar a apostar nela? Orçamento certamente não falta (poderá é estar mal alocado), e vontade da parte do staff também não. Permita-se, então, que as pessoas façam o seu trabalho sem restrições.
Já da parte dos jovens, e talvez aquilo que de melhor levo do EYE, foi perceber que no meio de todo aquele vazio estavam alguns jovens que de facto podem, e querem, fazer mais e melhor. A esses digo: não se deixem esmorecer pelo facto de o futuro parecer sombrio, enquanto lutarmos por aquilo que merecemos, temos uma hipótese. Mas esta luta só faz sentido se recrutarmos aqueles que caminharão para o futuro connosco; não podemos deixar de fazer tudo ao nosso alcance para não deixar ninguém para trás, e isso começa nas nossas comunidades, talvez promovendo a reformulação dos Conselhos Municipais da Juventude? Fica a sugestão. Por tudo isto, e muito mais, o desafio põe-se: seremos nós o futuro? Ou caminhamos para ser parte do mesmo passado?